Somente no primeiro trimestre do ano, a China atingiu recordes de compras, com um total acumulado de 2.063 toneladas. O Banco Central da China vinha acumulando reservas desde novembro de 2022, a ponto de se tornar o maior comprador de ouro do mundo.
O preço do ouro despencou na bolsa de valores! Pela primeira vez em 18 meses, o Banco Central da China não adquiriu ouro em maio, o que impactou negativamente no preço do metal precioso, que caiu 2,7%, atingindo aproximadamente US$ 2.311 por onça.
Desde novembro de 2022, a China vinha acumulando reservas, superando outros bancos centrais, como o da Índia, tornando-se o maior comprador de ouro do mundo.
China estocando ouro
Aquisições chinesas atingiram recordes durante o primeiro trimestre do ano, com total acumulado de 2.063 toneladas
“Minha impressão inicial é que a China, um importante impulsionador da alta do ouro no ano passado, não terminou de comprar ouro”, afirmou Ole Hansen, chefe de Estratégia de Commodities no Saxo Bank. Segundo Hansen, a pausa indica uma resistência em pagar preços recordes.
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De acordo com o Conselho Mundial do Ouro, as aquisições chinesas atingiram recordes durante o primeiro trimestre do ano. E, no final de maio, o total acumulado era de 72,80 milhões de onças troy (2.063 toneladas).
Para Nicholas Frappell, chefe global de Mercados Institucionais na ABC Refinery, a reação inicial dos preços “parece um pouco técnica”. “Seria surpreendente que o anúncio representasse mais do que uma pausa na tendência geral da demanda atual do setor oficial”, acrescentou.
Embora no quinto mês do ano não tenha havido mudanças no balanço de ouro da China, a demanda recente foi impulsionada pela necessidade do país de diversificar suas reservas e se proteger contra a desvalorização de sua moeda.
Por que a China aumentou a reserva em ouro e o que isso tem a ver com juros nos EUA?
Há duas razões principais: a crescente preocupação com os juros e a dívida dos EUA, que já atingiu US$ 34 trilhões, além do risco de sanções econômicas devido às incertezas geopolíticas. Essa é a análise de Gilberto Cardoso, CEO da Tarraco Commodities e membro do Fórum Brasil Export.
“A China está apreensiva com o nível da dívida americana. Então, ela adota uma estratégia dupla: aumenta suas reservas de ouro físico e vende títulos do Tesouro dos EUA. Ela busca um ativo físico que oferece proteção contra a inflação e, ao mesmo tempo, reduz sua exposição aos títulos da dívida americana. A dívida e os juros americanos entraram em uma espiral perigosa e a China quer se proteger. É uma questão de diversificação de riscos”, explica.
Além disso, Cardoso destaca que os chineses temem novas sanções econômicas que possam prejudicar seu crescimento. “A China enfrenta o risco de sanções econômicas. O dólar se tornou uma arma americana, um instrumento financeiro, e isso preocupa a China. Todos os países do BRICs estão tentando reduzir sua dependência do dólar”, acrescenta.
Há também uma razão mais simples para a diversificação. “A China é um dos países que mais investe em dólares. É natural que busque diversificar em outras moedas, incluindo sua própria, o Yuan. Investir em ouro é uma escolha natural para um país tão exposto ao dólar. Nunca é prudente colocar todos os ovos na mesma cesta. A diversificação é essencial ao investir”, afirma Paulo Roberto Feldmann, professor de pós-graduação em economia internacional na Faculdade de Administração, Economia e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP).
Segundo Feldmann, o ouro tende a se valorizar durante crises econômicas. “Por outro lado, o valor do ouro pode cair abruptamente. A longo prazo, não é um investimento tão seguro. Portanto, investir em ouro é delicado. É necessário escolher bem o momento e estar seguro de que haverá uma crise que desvalorize as moedas e o petróleo, fazendo com que as pessoas busquem refúgio no ouro. Mas isso é raro. Não recomendaria investir em ouro, pois é preciso estar muito atento ao que pode acontecer a curto prazo”, conclui.
Não é só a China…
Rússia e EUA também mantêm uma grande parte de suas reservas em ouro. Por ser um ativo seguro e politicamente neutro, ele oferece proteção contra a inflação, sanções e até apreensões, conforme apontou Gita Gopinath, diretora adjunta do FMI, durante um evento em Stanford.
“A porcentagem de ouro nas reservas cambiais do bloco chinês tem aumentado desde 2015 – uma tendência que não é exclusiva da China e da Rússia. É importante notar que, durante o mesmo período, a participação do ouro nas reservas cambiais dos países do bloco dos EUA permaneceu globalmente estável”, explica Gopinath.
A tendência entre os bancos centrais, segundo um estudo do FMI, indica que a compra de ouro é motivada por preocupações com o risco de sanções econômicas. “Os gestores de reservas cambiais tendem a aumentar suas participações em ouro para se proteger contra a incerteza econômica e geopolítica, incluindo o risco de sanções.”
… e o futuro?
Para Cardoso, há outra motivação no horizonte chinês para o aumento das reservas de ouro. Ele sugere olhar para o passado para entender o futuro. O Acordo de Bretton Woods, firmado em 1944 entre os países vencedores da Segunda Guerra Mundial, estabeleceu regras para o sistema monetário internacional. Uma dessas regras foi a proibição de lastrear a moeda em ouro, suspensa em 1971 pelo presidente dos EUA, Richard Nixon. O que isso tem a ver com a China agora?
“No futuro, a China planeja ter uma moeda digital lastreada em ouro. Isso é um retorno ao período anterior ao pós-guerra. Ela teme que a base monetária americana perca o controle devido ao endividamento, resultando em uma inflação global sem precedentes. Como deseja manter o controle de sua moeda e desindexá-la do dólar, a China compõe suas reservas com ouro físico. Ela compra ouro no mercado internacional e armazena. É uma reserva de valor que não se perde com o tempo”, observa Cardoso.
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