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Em meio a tempestade, rajadas de ventos e caos em alto mar, práticos brasileiros conseguiram fundear com segurança dois navios petroleiros e receberam prêmio por bravura

Escrito por Paulo Nogueira
Publicado em 19/10/2020 às 19:23
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Por evitarem grave acidente em Ilhabela, os práticos Marcio Santos Teixeira e Fábio Rodrigues Alves de Abreu ganharam o Prêmio IMO por Bravura Excepcional no Mar, reforçando um trabalho que prima 24 horas pela segurança no mar e da comunidade ao manobrar os navios com excelência e perícia

Durante quase seis horas os práticos Marcio Santos Teixeira e Fábio Rodrigues Alves de Abreu enfrentaram no dia 28 de abril de 2019 uma tempestade com rajadas de mais de 130 km/hora (70 nós), ondas de 1,5 a 2 metros, chuva constante, muita tensão e um enorme desafio pela frente: no meio desse caos fundear em segurança dois navios petroleiros carregados e atrelados um ao outro por cabos de aço.  Esses navios estavam à deriva no Canal de São Sebastião, levados pela força das correntes marítimas e rumando perigosamente para Ilhabela, colocando em risco seus moradores e o meio ambiente. E se não bastante todo o estresse dos comandantes dos dois navios e da tripulação, eles ainda tiveram que interromper a delicada operação para retirar um tripulante em estado crítico e mandá-lo para a terra para tentar um atendimento rápido no hospital.

Para superarem essas condições adversas do tempo e do mar, eles usaram de todo conhecimento da região e da experiência, conseguindo concluir essa missão, reconhecida internacionalmente agora com o Prêmio IMO por Bravura Excepcional no Mar, da Organização Marítima Internacional, considerado o de mais alto reconhecimento mundial.

Indicados pelo Brasil, por sua determinação, profissionalismo e expertise no manejo de navios demonstrados em uma emergência causada por condições climáticas extremas durante operação no Terminal Almirante Barroso, no Porto de São Sebastião, as ações seguras e assertivas dos práticos Márcio e Abreu salvaram vidas e evitaram graves danos a estruturas de cais e instalações de petróleo, com a possiblidade de um grande acidente ecológico, com derramamento de óleo. Todos os fatos e procedimentos foram considerados durante o longo processo da premiação, que envolve várias etapas e a participação de um grupo de jurados de entidades reconhecidas pela comunidade internacional.

O resultado saiu no dia 10 de setembro de 2020 e foi recebido com muito entusiasmo na Praticagem de São Paulo. Para o presidente Carlos Alberto de Souza Filho, a premiação é uma grande honra para a empresa e revela, mais uma vez, a importância da atividade como essencial para o interesse público na coordenação eficiente do tráfego marítimo e em todo gerenciamento de riscos inerentes à navegação em águas restritas. “Trabalhamos 24 horas por dia com qualquer tempo e em qualquer condição, com a prioridade de preservar a segurança, atender às emergências e garantir as operações. É uma atividade que envolve muitos riscos, temos o conhecimento, a técnica, a coragem e a determinação como, princípios básicos para o exercício da profissão, como provaram nossos bravos práticos Márcio e Abreu”, afirmou.

Como tudo começou

No dia 28 de abril de 2019, os práticos Márcio e Abreu foram alertados pelo gerente do Terminal que, devido a rajadas de vento inéditas de até 70 nós, os cabos de amarração de dois petroleiros atracados em operação navio a navio estavam partindo. Com pouca visibilidade, causada por fortes chuvas e ondas altas no canal, os dois práticos embarcaram na lancha da Praticagem para tentar chegar aos petroleiros, quando perceberam que os navios já estavam à deriva.

 Em condições bastante desafiadoras, Márcio conseguiu embarcar no navio-tanque Rio 2016, onde encontrou a tripulação bastante apreensiva. Inicialmente ele se informou sobre a situação crítica para planejar a melhor abordagem, uma vez que os dois navios ainda estavam conectados por mangueiras de óleo e cabos de amarração e derivando para a região de Ilhabela.

Nesse ínterim, correndo sérios riscos, Abreu conseguiu subir a escada de prático do petroleiro Milton Santos. Ter um prático em cada navio era essencial para fins de comunicação e como plano de backup. Márcio comenta: “Foi um fato inédito e uma grande aprendizagem para nós. Essa operação nunca tinha sido realizada pela Praticagem de São Paulo. Eu e o prático Abreu só descobrimos que os navios já estavam à deriva e ainda amarrados um ao outro quando nos aproximamos deles com a lancha da Praticagem. Um navio estava atracado a contrabordo do outro no mesmo berço quando os 20 cabos de aço que os ligavam ao cais se partiram com a força do vento. Além das dificuldades de toda a operação, um grande desafio foi o embarque pelas condições do tempo. O navio estava praticamente parado, sem propulsão, o que prejudicou a estabilidade da lancha, ao contrário do que se poderia pensar.  O embarque no navio em uma velocidade normal, de seis nós (11 km/h), é bem mais fácil.”

Prioridade foi cuidar do tripulante

Um dos momentos de maior tensão ocorreu quando Márcio foi acionado por Abreu, informando que havia um tripulante em estado crítico, aparentemente com problemas cardíacos no Milton Santos, e que precisava ser desembarcado urgentemente para ser levado para um hospital mais próximo. Esta passou a ser a prioridade máxima. Como seria impossível pelas condições do mar desembarcar o tripulante direto do Milton Santos para a lancha da Praticagem, Márcio decidiu, juntamente com os comandantes e com o Abreu, que ele seria transferido primeiro para o seu navio e depois para o rebocador. “Foi muito rápido, as tripulações trabalharam muito bem, o paciente foi levado na maca em um guindaste e em menos de 5 minutos já estava no rebocador. Foi um momento crítico, um rebocador faria muita falta, mas a vida humana era prioridade. O Centro de Operações da Praticagem já havia solicitado uma ambulância que estava esperando, mas, infelizmente mesmo chegando ao hospital não resistiu”.

Operação de salvamento

A única alternativa foi usar a área de fundeio no norte do canal e só os recursos do “Rio 2016”, que foi rebocando o “Milton Santos” a contrabordo. “Tivemos que seguir a, no máximo, um nó e meio de velocidade, mais expostos a ventos e correntes, porque os mangotes para transferência de óleo ainda estavam conectados. Como os ventos nos jogavam para Ilhabela, tínhamos que jogar a proa para a direção de São Sebastião. O navio, na verdade, navegava de lado. Mas mostrei ao Comandante, nas telas dos equipamentos, que era o que tínhamos que fazer e fomos trabalhando em equipe, incluindo os Comandantes dos rebocadores”, contou Márcio.

Márcio deu continuidade à navegação do Rio 2016, rebocando o Milton Santos ao lado, a uma velocidade máxima de 1,5 nós (2,8 km/h), em direção à área de fundeio. Após 40 minutos de navegação e uma desafiadora evacuação do tripulante gravemente ferido do Milton Santos, infelizmente chegou a informação de que ele havia falecido. A velocidade do vento diminuiu para 56 km/h (30 nós) e, enquanto o ferro (a âncora) do Rio 2016 estava sendo lançada, as embarcações foram desconectadas.

Os dois práticos manobraram cuidadosamente o Milton Santos para longe do Rio 2016 com o auxílio de rebocadores e, após mais de cinco horas estressantes, o navio finalmente também largou a âncora.

Depois de 5h30 de um trabalho cuidadoso e realizado com muita eficiência, eles finalmente conseguiram evitar um grave acidente com os dois petroleiros da classe Suezmax carregados de óleo.

Concluir a operação, separando os petroleiros e fundeando ambos em segurança no meio do canal, trouxe um sentimento de alívio e realização: “Acho que  a fase mais crítica, com todos os cálculos possíveis e o conhecimento da região, foi conseguir girar os navios com segurança ao local de fundeio e tirá-los da área de perigo. Nossa sensação, minha e do Márcio, quando tudo terminou, foi de que a tripulação não tinha ideia do risco que todos estavam correndo, caso os navios continuassem à deriva, mas nós sabíamos o que poderia acontecer e, por isso, todos as ações foram tomadas com muita agilidade”, disse Abreu.

Segunda premiação

Das 31 indicações para o prêmio, uma dividiu o primeiro lugar com os Práticos Brasileiros. Foi a do suboficial de segunda classe Ralph OfallaBarajan da Guarda Costeira filipina, indicado pelas Filipinas, pela liderança e determinação demonstradas, fora de serviço, durante a inundação e naufrágio do M / V SiargaoPrincess, onde era passageiro junto com 54 pessoas.

Paulo Nogueira

Com formação técnica, atuei no mercado de óleo e gás offshore por alguns anos. Hoje, eu e minha equipe nos dedicamos a levar informações do setor de energia brasileiro e do mundo, sempre com fontes de credibilidade e atualizadas.

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