Nas décadas de 1970 e 1980, o Projeto RADAMBRASIL utilizou tecnologia de radar pioneira para desvendar a Amazônia. Conheça as descobertas, os impactos e o legado deste ambicioso e controverso mapeamento aéreo.
Em meados do século XX, a Amazônia era um vasto território de mistérios e potencial inexplorado para o Brasil. Para mudar essa realidade, surgiu o Projeto RADAMBRASIL, uma iniciativa monumental que, utilizando tecnologia de radar aerotransportado, realizou um mapeamento sem precedentes da região. Este esforço revelou suas imensas riquezas minerais, a diversidade de seus ecossistemas e, também, suas profundas fragilidades.
Concebido em um contexto de desenvolvimentismo e preocupações geopolíticas durante o regime militar, o Projeto RADAMBRASIL gerou um volume de informações que transformou o conhecimento sobre o país. No entanto, também abriu caminho para intensos debates sobre seus impactos socioambientais, um legado que perdura até hoje.
Projeto RADAMBRASIL: desvendando um continente então desconhecido
Até o início dos anos 1970, a Amazônia era uma imensa incógnita. Sua vasta extensão, a densa floresta e a constante cobertura de nuvens dificultavam a exploração e o conhecimento científico sistemático. Este vácuo de informação era uma barreira para os planos de desenvolvimento nacional.
-
Tecnologia dos EUA pode rastrear submarinos sem GPS
-
Um novo “caminho secreto” no mar pode resolver os piores problemas da internet brasileira
-
EUA disparam míssil balístico intercontinental a 6.750 km através do Oceano Pacífico
-
Mistério de 500 anos: DNA de Leonardo da Vinci é rastreado por 15 gerações em projeto inovador
O Projeto RADAMBRASIL, formalmente iniciado em outubro de 1970 com recursos do Plano de Integração Nacional (PIN), surgiu nesse contexto. As motivações eram geopolíticas e desenvolvimentistas, alinhadas com a estratégia do regime militar de integrar o território, garantir a segurança nacional e explorar os recursos naturais da Amazônia. A ideia era “integrar para não entregar”.
A tecnologia de ponta e a escala operacional do Projeto RADAMBRASIL
A chave para o Projeto RADAMBRASIL foi a adoção do Radar de Visada Lateral Aerotransportado (SLAR). Essa tecnologia pioneira permitia imagear a superfície independentemente da luz solar ou da cobertura de nuvens, uma vantagem decisiva na Amazônia. As aeronaves Sud Aviation Caravelle, equipadas com o sistema GEMS-1000, voavam a cerca de 11.000 metros de altitude, mapeando vastas faixas do território com notável resolução para a época.
A escala foi monumental, resultando em centenas de cartas planimétricas. O sucesso dependeu também de equipes multidisciplinares em terra e do crucial apoio logístico da Força Aérea Brasileira (FAB), que utilizou aeronaves Bandeirante e helicópteros Bell para transporte e inserção de pessoal em áreas remotas.
As principais e impactantes descobertas
Uma das consequências mais transformadoras do Projeto RADAMBRASIL foi a revelação de um vasto potencial mineral. A Província Mineral de Carajás (PA), com suas gigantescas jazidas de ferro, manganês, cobre e ouro, foi um dos grandes destaques. Outras descobertas incluíram estanho em Pitinga (AM) e Rondônia, e petróleo em Urucu (AM).
Além dos minerais, o projeto realizou um mapeamento sistemático da cobertura vegetal, dos tipos de solo e do uso da terra, fornecendo a primeira visão integrada da paisagem amazônica. A hidrografia da bacia também foi detalhadamente mapeada, informação essencial para a navegação e o planejamento de infraestrutura.
Projeto RADAMBRASIL expôs tanto riquezas quanto vulnerabilidades
As informações do Projeto RADAMBRASIL foram ativamente usadas para orientar a exploração econômica da Amazônia, impulsionando a mineração, projetos de infraestrutura, agricultura e colonização. Contudo, essa “corrida pelos recursos” também expôs e, muitas vezes, exacerbou as vulnerabilidades da região.
Embora tenha fornecido dados basais para o monitoramento futuro do desmatamento e identificado ecossistemas frágeis, os impactos socioambientais foram severos. A descoberta de minérios em terras indígenas, como no caso do povo Yanomami, desencadeou invasões, conflitos violentos e desestruturação cultural, evidenciando o lado sombrio do desenvolvimento impulsionado pelo projeto.
Entre o sigilo estratégico
A alcunha de “mapeamento secreto” para o Projeto RADAMBRASIL refere-se mais ao controle de informações sensíveis pelo regime militar do que ao projeto em si. Os dados foram gradualmente disponibilizados através de órgãos como o DNPM (atual ANM), CPRM (atual SGB) e, a partir de 1985, pelo IBGE, principalmente através da série Levantamento de Recursos Naturais (LRN). Hoje, projetos como o RADAM-D visam preservar e digitalizar esse acervo.
O Projeto RADAMBRASIL é um marco nas geociências brasileiras, mas seu legado é complexo. Ele forneceu conhecimento inestimável, mas também foi instrumento de um modelo de desenvolvimento com altos custos socioambientais. As lições do Projeto RADAMBRASIL ressoam até hoje, desafiando o país a buscar um desenvolvimento para a Amazônia que seja verdadeiramente sustentável e justo.