Nova lei brasileira amplia o conceito de responsabilidade parental ao incluir a ausência emocional como ato passível de indenização. Entenda como a mudança impacta famílias, decisões judiciais e o papel do afeto na criação dos filhos.
A Lei 15.240/2025, sancionada pelo presidente em exercício, Geraldo Alckmin, alterou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e passou a reconhecer o abandono afetivo como ato ilícito civil.
A norma estabelece que pais e mães têm dever legal de oferecer não apenas sustento financeiro, mas também atenção e convivência regular.
Em caso de omissão comprovada, o responsável pode responder judicialmente e ser condenado a indenizar o filho.
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Antes da nova legislação, havia decisões isoladas em que tribunais brasileiros reconheciam o direito à indenização por abandono afetivo, mas não existia previsão expressa em lei.
Com a alteração no ECA, o tema passa a ter base jurídica explícita, o que tende a dar maior segurança às decisões judiciais e reduzir divergências de interpretação.
A nova norma também reforça medidas de proteção já existentes no Estatuto, como o afastamento do agressor do lar em casos de risco e o acompanhamento por órgãos públicos.
O que é considerado abandono afetivo
O abandono afetivo é definido na lei como a omissão no dever de cuidado emocional e de convivência.
Isso envolve ausência de orientação, falta de acompanhamento da vida escolar e social da criança e ausência de presença, mesmo que à distância, em situações relevantes.
Segundo a advogada Vanessa Paiva, especialista em Direito de Família, não se trata de quantificar o tempo de convivência, mas de avaliar o impacto da omissão.
“Simplesmente ver pouco o filho não garante automaticamente enquadramento. É necessário contexto de omissão relevante e dano”, afirma.
A caracterização do abandono depende da comprovação de que houve prejuízo emocional ou psicológico decorrente da falta de convivência e apoio, conforme explicam juristas consultados pela reportagem.
Dever legal vai além da pensão alimentícia
Com a mudança, o pagamento da pensão alimentícia não é mais suficiente para caracterizar o cumprimento das obrigações parentais.
De acordo com especialistas em direito de família, o dever de presença, cuidado e orientação passa a ter o mesmo peso jurídico do sustento material.
O texto legal reafirma que as responsabilidades parentais compreendem sustento, guarda, educação e assistência afetiva, de forma integrada.
Em casos de guarda compartilhada, a Justiça poderá considerar o histórico de convivência e o cumprimento dos deveres emocionais na avaliação de pedidos de modificação de guarda ou de visitas.
Como a Justiça pode comprovar a omissão afetiva
A constatação do abandono afetivo depende de provas concretas.
De acordo com juristas, o Judiciário costuma analisar o conjunto de evidências que demonstrem a omissão e o dano causado.
São aceitos documentos como histórico de visitas, relatórios escolares, mensagens, e-mails e depoimentos de testemunhas.
Para ter validade, mensagens eletrônicas e outros registros digitais devem ser formalizados em cartório, por meio de ata notarial.
Além disso, laudos psicológicos e relatórios de assistentes sociais podem ser utilizados para demonstrar os efeitos da ausência parental no desenvolvimento emocional da criança.
Segundo especialistas, a análise é feita caso a caso e deve priorizar o melhor interesse da criança e do adolescente, conforme prevê a Constituição e o ECA.
Consequências jurídicas em caso de comprovação
Se houver comprovação de abandono afetivo, o responsável pode ser condenado ao pagamento de indenização por danos morais.
O valor é definido pelo juiz, levando em conta a gravidade da conduta, o impacto psicológico e as condições econômicas das partes.
A sentença pode ainda incluir medidas protetivas voltadas à recomposição dos vínculos familiares, como acompanhamento psicológico, orientação familiar e acompanhamento por órgãos públicos.
Segundo advogados, essas medidas têm caráter educativo e de proteção, não apenas punitivo.
Risco de uso indevido em disputas familiares
Um dos receios apontados por especialistas é a possibilidade de uso da lei em disputas entre ex-casais.
A advogada Vanessa Paiva explica que a legislação prevê salvaguardas para evitar ações movidas por retaliação.
“A exigência de provas concretas e o controle rigoroso do Judiciário tendem a reduzir o risco de uso indevido da norma”, afirma.
Ainda conforme advogados de família ouvidos pela reportagem, o foco da lei é a proteção da criança e do adolescente, não a ampliação de conflitos entre os pais.
O reconhecimento do abandono afetivo dependerá sempre da comprovação de dano real e mensurável à integridade emocional do menor.
Efeitos práticos para famílias e responsáveis
Para juristas e psicólogos da área, a principal consequência prática da nova lei é o reforço da corresponsabilidade parental.
Pais e mães devem participar de forma efetiva da vida dos filhos, não apenas no aspecto financeiro, mas também no acompanhamento cotidiano e emocional.
Em caso de separação, acordos de convivência registrados judicialmente e provas de participação ativa — como presença em reuniões escolares e comunicação regular — podem ser determinantes em eventuais disputas judiciais.
Para famílias, a recomendação de advogados é buscar mediação familiar e orientação jurídica antes de recorrer à Justiça, de modo a evitar conflitos e preservar o bem-estar da criança.
De acordo com especialistas, a nova lei consolida um entendimento já presente em decisões judiciais e políticas públicas voltadas à infância: a convivência e o cuidado emocional são direitos fundamentais.
Com as mudanças legais, uma questão se impõe: até que ponto a responsabilização civil pode ajudar a fortalecer os vínculos familiares e reduzir a negligência emocional?



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