1. Início
  2. / Energia Nuclear
  3. / Bill Gates convence Hyundai a apostar em reatores nucleares de sódio líquido e sal fundida para descarbonizar o transporte marítimo
Tempo de leitura 4 min de leitura Comentários 0 comentários

Bill Gates convence Hyundai a apostar em reatores nucleares de sódio líquido e sal fundida para descarbonizar o transporte marítimo

Escrito por Noel Budeguer
Publicado em 27/08/2025 às 23:37
Seja o primeiro a reagir!
Reagir ao artigo

Bill Gates une forças com a Hyundai para criar navios movidos a reatores nucleares SMR. Será este o futuro do transporte marítimo global sem CO2?

A parceria entre o bilionário americano Bill Gates e a gigante sul-coreana Hyundai promete abrir um novo capítulo na história da energia limpa. A iniciativa une o desenvolvimento de reatores nucleares modulares de pequena escala (SMR) à construção naval, trazendo a possibilidade de navios movidos por energia nuclear avançada, mais segura e eficiente.

Se concretizada, essa estratégia pode transformar o comércio marítimo global, hoje responsável por cerca de 3% das emissões de CO₂ no planeta — número equivalente à poluição total de países inteiros, como Japão ou Alemanha.

O reator Natrium e a inovação energética

Por meio da sua empresa TerraPower, fundada em 2008, Bill Gates vem defendendo a adoção de tecnologias nucleares de quarta geração, capazes de superar os riscos e limitações dos modelos convencionais.

O projeto mais avançado nesse campo é o Natrium, desenvolvido em parceria com a Bechtel. Trata-se de um reator refrigerado por sódio líquido, com sistema de armazenamento em sal fundida de até 1 GWh.

Essa configuração oferece vantagens inéditas: elimina o risco de sobrepressão associado aos reatores de água pressurizada, reduz resíduos radioativos e permite modular a geração elétrica de acordo com a demanda.

Render digital do porta-contêineres nuclear da Hyundai. HD KSOE

Isso significa que o Natrium pode funcionar como suporte às energias renováveis intermitentes, como solar e eólica, garantindo estabilidade às redes elétricas.

Segundo Bill Gates, essa é a oportunidade de colocar a energia nuclear “no centro da transição energética global”, unindo confiabilidade e custo competitivo.

A aposta é que o Natrium também possa ter papel fundamental no avanço da mobilidade elétrica em terra, ao fornecer energia para a produção de hidrogênio e para pontos de recarga de veículos.

Hyundai entra em cena: o transporte marítimo nuclear

O transporte marítimo intercontinental enfrenta há anos o desafio de reduzir sua pegada de carbono. Alternativas como GNL (gás natural liquefeito), motores híbridos, amônia verde e biocombustíveis avançados vêm sendo testadas, mas nenhuma conseguiu combinar autonomia, escalabilidade e viabilidade econômica em rotas de milhares de quilômetros.

É nesse cenário que surgem os SMRs. Com densidade energética muito superior e autonomia praticamente ilimitada, esses reatores são ideais para embarcações de grande porte.

Em agosto de 2025, Bill Gates fechou em Seul um acordo estratégico com a HD Hyundai, um dos maiores estaleiros do mundo. A meta: integrar SMRs em porta-contêineres de 15.000 TEU já em desenvolvimento, projeto que recebeu aprovação preliminar da ABS (American Bureau of Shipping).

O vice-presidente executivo da Hyundai, Chung Kisun, afirmou que a tecnologia pode representar um “ponto de inflexão nas cadeias globais de suprimentos”, levando o setor naval a uma independência energética sem emissões diretas de carbono.

A empresa já reservou mais de US$ 200 milhões (cerca de R$ 1 bilhão) para esse projeto, com previsão de colocar os primeiros navios nucleares em operação até 2030.

Além disso, a Hyundai avalia modelos complementares, como plataformas flutuantes nucleares e embarcações com potência de até 240 MW, capazes de produzir hidrogênio em alto-mar.

Esse combustível limpo poderia ser distribuído para abastecer caminhões, ônibus e até aeronaves, conectando o setor marítimo à mobilidade elétrica terrestre.

Bill Gates (TerraPower) e Chung Kisun (HD Hyundai), após a assinatura.

TerraPower e o salto da pesquisa para a aplicação prática

A participação de Bill Gates vai além do financiamento. A TerraPower busca consolidar os reatores rápidos refrigerados a sódio como alternativa viável e segura.

Segundo o CEO da empresa, Chris Levesque, a expertise industrial da Hyundai é essencial para transformar décadas de pesquisa em produtos práticos.

Ele destacou que os SMRs possuem vantagens decisivas: podem ser produzidos em série, têm custo reduzido em comparação às grandes usinas nucleares e exigem menos espaço. Além de propulsionar navios, podem atuar em redes elétricas flutuantes ou na geração de hidrogênio verde.

Ainda assim, os desafios são significativos. O principal entrave está no marco regulatório internacional. Nem a legislação marítima nem a nuclear foram desenhadas para contemplar a instalação de reatores em navios comerciais.

Questões como a gestão de resíduos radioativos, os protocolos de segurança em caso de acidente e a aceitação pública da energia nuclear em larga escala ainda precisam ser resolvidos.

O futuro da energia nuclear no transporte global

Apesar dos obstáculos, o movimento de Gates e Hyundai projeta consequências que vão além da navegação.

A capacidade de gerar energia limpa em alto-mar pode reforçar redes elétricas terrestres e abastecer a cadeia global de hidrogênio, considerado peça-chave na descarbonização da indústria pesada e dos transportes.

Se alcançar escala industrial, essa tecnologia pode reduzir drasticamente a dependência do petróleo no setor marítimo, abrir novos mercados de exportação de hidrogênio e consolidar os SMRs como protagonistas da transição energética.

Para Bill Gates, a equação é clara: “A energia nuclear é indispensável para atingir metas climáticas de longo prazo.” E, com a Hyundai como parceira, essa visão pode deixar de ser apenas uma ideia futurista para se tornar realidade até o fim da década.

Inscreva-se
Notificar de
guest
0 Comentários
Mais recente
Mais antigos Mais votado
Feedbacks
Visualizar todos comentários
Noel Budeguer

Sou jornalista argentino, baseado no Rio de Janeiro, especializado em temas militares, tecnologia, energia e geopolítica. Busco traduzir assuntos complexos em conteúdos acessíveis, com rigor jornalístico e foco no impacto social e econômico.

Compartilhar em aplicativos
1
0
Adoraríamos sua opnião sobre esse assunto, comente!x