Entenda como o desperdício de energia renovável no Rio Grande do Norte revela desafios antigos e oportunidades para o futuro sustentável do país
O desperdício de energia renovável tornou-se, ao longo dos últimos anos, um dos principais temas nas discussões sobre o futuro energético do Brasil.
Em setembro, o Rio Grande do Norte atingiu um recorde nacional nesse tipo de perda, conforme apontam os dados do Operador Nacional do Sistema (ONS), analisados pela consultoria CarpeVie e pelo Centro de Estratégias em Recursos Naturais e Energia (CERNE).
O estado, amplamente reconhecido por ser um dos maiores produtores de energia eólica do país, respondeu por 36,01% dos cortes de geração entre todas as unidades da federação.
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Esse fenômeno, chamado de curtailment, ocorre justamente quando usinas eólicas e solares precisam reduzir ou interromper a geração de energia em razão da falta de capacidade de escoamento nas linhas de transmissão.
De acordo com o presidente do CERNE, Darlan Santos, o prejuízo acumulado no setor renovável brasileiro já ultrapassa R$ 5 bilhões, o que evidencia um problema estrutural que se repete e se agrava a cada ano.
Assim, a situação no Rio Grande do Norte reflete um desafio mais amplo, que envolve não apenas o setor elétrico, mas também o planejamento energético nacional.
A origem do problema e o impacto histórico da infraestrutura
Historicamente, o Brasil tem se destacado pela produção de energia limpa.
Desde o início dos anos 2000, quando o país iniciou grandes investimentos em parques eólicos, o Nordeste passou a ser visto como um exemplo mundial de geração sustentável.
O Rio Grande do Norte, em especial, destacou-se por aproveitar ventos constantes e fortes, transformando seu potencial natural em uma vantagem competitiva.
Contudo, ao mesmo tempo em que a produção cresceu, a infraestrutura de transmissão não acompanhou o ritmo da expansão.
As redes que deveriam transportar a energia gerada nas usinas não foram ampliadas na mesma proporção.
Como resultado, parte dessa eletricidade limpa acaba sendo descartada, o que representa um desperdício de energia renovável com consequências econômicas e ambientais.
Além disso, esse problema evidencia uma contradição preocupante.
Embora o Brasil seja um dos líderes mundiais em energia renovável, ele também figura entre os países que mais desperdiçam esse tipo de produção.
Conforme o levantamento da CarpeVie, o Rio Grande do Norte ocupa o segundo lugar nacional em perdas em 2025, ficando atrás apenas da Bahia.
Ao todo, 70% das perdas estão concentradas no Nordeste, região que deveria ser o motor da transição energética do país.
A expansão da energia limpa e os desafios regionais
Nos últimos anos, o avanço da energia eólica e solar transformou o Nordeste em um verdadeiro polo de produção renovável.
Entretanto, embora o potencial seja imenso, a falta de linhas de transmissão adequadas ainda impede que toda essa energia chegue às regiões de maior consumo.
Por essa razão, muitas usinas são obrigadas a reduzir sua geração, o que significa desperdiçar energia renovável limpa e abundante.
Além do prejuízo financeiro para as empresas, há também uma consequência ambiental significativa.
Sempre que há cortes na produção de energia renovável, aumenta-se a dependência de fontes fósseis, que emitem gases poluentes e elevam o custo do sistema elétrico.
Nesse contexto, é fundamental compreender que o problema não está apenas na geração de energia.
Ele envolve planejamento, licenciamento ambiental, execução de obras e investimento público e privado.
Assim, quando essas etapas sofrem atrasos ou falhas de coordenação, o país acaba desperdiçando o potencial energético que poderia impulsionar sua economia de forma sustentável.
Portanto, se o Brasil deseja consolidar sua liderança global em energias limpas, precisa investir em infraestrutura, integração regional e inovação tecnológica.
Somente assim será possível transformar perdas em ganhos e fazer da energia renovável um vetor permanente de desenvolvimento.
Caminhos para o aproveitamento pleno da energia renovável
Para enfrentar o desperdício de energia renovável, é necessário, antes de tudo, um planejamento estratégico de longo prazo.
O país precisa acelerar a construção de linhas de transmissão entre o Nordeste e o Sudeste, onde se concentra a maior demanda por energia.
Além disso, deve incentivar o uso de sistemas de armazenamento, como baterias de alta capacidade, que podem equilibrar a oferta e a demanda em momentos de pico.
Ao mesmo tempo, o Brasil deve investir em modernização e digitalização do sistema elétrico, permitindo uma gestão mais inteligente e eficiente do fluxo de energia.
A diversificação das fontes também é essencial, pois a integração entre energia solar, eólica, hídrica e biometano reduz riscos e garante mais estabilidade ao sistema.
Internacionalmente, países como Alemanha e Dinamarca enfrentaram desafios semelhantes.
Contudo, por meio de políticas públicas consistentes, incentivos à inovação e à descentralização da geração, eles conseguiram reduzir drasticamente o desperdício.
Dessa forma, o Brasil pode seguir esse exemplo e adaptar as soluções estrangeiras à sua própria realidade territorial e climática.
Assim, com vontade política e investimento coordenado, o país pode transformar um problema crônico em uma oportunidade de desenvolvimento sustentável.
O papel do Rio Grande do Norte e a busca por eficiência energética
O Rio Grande do Norte, por ser o principal produtor de energia eólica do Brasil, ocupa uma posição estratégica na transição energética nacional.
No entanto, o estado também enfrenta o desafio de melhorar seu sistema de escoamento e de integrar-se de forma mais eficiente às redes regionais e nacionais.
Com políticas adequadas e investimentos direcionados, o RN pode converter seu atual recorde de desperdício em um exemplo de superação.
Para isso, é essencial promover a cooperação entre governo, agências reguladoras e empresas privadas, de modo que o crescimento da geração seja acompanhado pela modernização da infraestrutura elétrica.
Além disso, à medida que novas tecnologias se consolidam, como o uso de inteligência artificial para prever variações na geração e o armazenamento em larga escala, o estado poderá garantir um aproveitamento mais racional e sustentável de seus recursos naturais.
Portanto, se houver continuidade nas políticas energéticas e incentivo à inovação, o Rio Grande do Norte pode transformar seu desafio atual em uma vitrine mundial de eficiência e sustentabilidade.
O futuro da energia limpa e o desafio de evitar perdas
O desperdício de energia renovável, além de um problema técnico, representa uma questão econômica e ambiental profunda.
Cada megawatt desperdiçado significa recursos financeiros perdidos, emissões evitáveis e oportunidades que deixam de gerar benefícios sociais.
Por outro lado, o Brasil tem condições únicas para mudar esse cenário.
Com uma matriz energética diversificada, vastos recursos naturais e tecnologia em expansão, o país pode avançar rapidamente em direção a uma gestão mais inteligente e sustentável da energia.
Em suma, o desperdício de energia renovável precisa ser encarado não apenas como uma falha, mas como um ponto de virada.
A partir dele, o Brasil pode consolidar um novo modelo energético, mais justo, eficiente e ambientalmente responsável.
Assim, com planejamento, inovação e cooperação, o país poderá transformar o vento e o sol — hoje parcialmente desperdiçados — em pilares de um futuro verdadeiramente sustentável.