Com um aporte de US$ 285 milhões, a estatal chinesa Cofco ergue uma estrutura que visa garantir seu abastecimento de grãos, acirrando a disputa geopolítica com os Estados Unidos diretamente do litoral paulista.
Um investimento de 285 milhões de dólares no Porto de Santos, o maior da América Latina, está mudando o cenário do comércio internacional. Liderado pela gigante estatal chinesa Cofco, o projeto de um novo terminal de grãos não apenas reforça a posição do Brasil como principal fornecedor agrícola da China, mas também intensifica a crise para os agricultores dos Estados Unidos, colocando o país em um ponto central da disputa entre as duas maiores potências do mundo.
Um gigante asiático no maior porto da América Latina
O Porto de Santos é o coração da economia exportadora brasileira. Em 2024, o complexo portuário movimentou um recorde de 180 milhões de toneladas de carga. Mais da metade desse volume veio do agronegócio. A soja é a protagonista, com o Brasil exportando mais de 101 milhões de toneladas em 2023. Desse total, o porto paulista foi responsável por escoar cerca de 40% das exportações para a China.
É nesse cenário que a Cofco, uma das maiores estatais chinesas, investe pesado. O novo terminal chinês em Santos será quase exclusivo para o escoamento de grãos. O projeto surge como uma resposta direta à saturação do porto, que, segundo a Folha de São Paulo, já opera com mais de 91% de sua capacidade para exportação de grãos. A obra cria uma ponte logística direta e eficiente entre o campo brasileiro e os portos chineses.
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Engenharia e estratégia: os detalhes do novo terminal
O objetivo da Cofco é claro: triplicar sua capacidade de embarque no Brasil. A meta é saltar de 4,5 milhões para até 14 milhões de toneladas por ano. Para isso, o projeto integra engenharia de ponta e logística apurada. O terminal terá acesso direto à malha ferroviária da Rumo e às principais rodovias, garantindo o transporte rápido de soja e milho do Centro-Oeste.
A estrutura contará com silos de armazenagem verticalizados e esteiras transportadoras automatizadas com capacidade de até 2.000 toneladas por hora. Berços dedicados e calados profundos permitirão a atracação de navios de grande porte, acelerando o carregamento. O projeto também inclui práticas de mitigação de impacto, como sistemas de contenção de particulados e captação de água da chuva, atendendo a critérios internacionais de ESG. A expectativa é que a operação comece entre o final de 2025 e o início de 2026.
O tabuleiro geopolítico: como o Brasil abala a disputa China-EUA
Este investimento é um ponto de inflexão no comércio global. Durante décadas, os Estados Unidos foram os principais fornecedores de grãos para a China. A guerra comercial iniciada em 2018 mudou esse cenário. Com as barreiras tarifárias, o Brasil assumiu a liderança nas exportações de soja, milho e carnes para o mercado chinês.
O novo terminal chinês em Santos aprofunda essa mudança. A estrutura permitirá que a China reduza ainda mais sua dependência dos EUA. O fato de o terminal ser operado por uma estatal chinesa dá a Pequim controle direto sobre parte de sua rota de suprimentos no Brasil. Para os Estados Unidos, o alerta é claro. O Departamento de Agricultura do país estima que os produtores americanos perderam mais de 27 bilhões de dólares em exportações apenas na primeira fase da guerra comercial.
Santos vs. Golfo do México: a nova concorrência no agronegócio
A escala do projeto brasileiro rivaliza com os maiores terminais graneleiros dos EUA, localizados em portos como New Orleans e Houston. O terminal da Cargill na Louisiana, por exemplo, tem capacidade para mais de 10 milhões de toneladas anuais. A nova estrutura da Cofco em Santos mira uma capacidade superior, de 14 milhões de toneladas.
O Brasil, no entanto, possui vantagens competitivas importantes. A proximidade geográfica com o coração agrícola do país reduz custos logísticos. Além disso, o controle do terminal por uma estatal chinesa elimina intermediários e garante contratos de longo prazo, oferecendo uma estabilidade que os terminais privados americanos não conseguem replicar no atual cenário geopolítico. O eixo do agronegócio global está migrando de New Orleans para Santos.