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Filho ingrato pode perder direito à herança: Novo Código Civil abre guerra nas famílias brasileiras

Escrito por Alisson Ficher
Publicado em 07/10/2025 às 19:50
Novo Código Civil pode permitir exclusão de herdeiros por abandono afetivo e violência psicológica. Entenda as mudanças na lei.
Novo Código Civil pode permitir exclusão de herdeiros por abandono afetivo e violência psicológica. Entenda as mudanças na lei.
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Proposta que tramita no Senado amplia causas de exclusão de herdeiros e inclui abandono afetivo e violência psicológica como motivos de deserdação, acirrando disputas sobre moral familiar, prova judicial e direito sucessório no Brasil.

A proposta de atualização do Código Civil em análise no Senado, o Projeto de Lei 4/2025, amplia as hipóteses de deserdação e pode permitir a exclusão de descendentes da sucessão por condutas consideradas gravemente lesivas no ambiente familiar.

Entram no radar o abandono afetivo voluntário e injustificado, a falta de assistência material quando devida e ofensas à integridade psicológica dos pais.

O tema, antes tratado de forma fragmentada pela jurisprudência, passa a ter previsão expressa, reacendendo disputas que cruzam prova, moral familiar e responsabilidade civil.

O que muda com o PL 4/2025

O Código Civil vigente, de 2002, já admite a exclusão de herdeiros por indignidade ou por deserdação prevista em testamento, com causas taxativas.

Hoje, por exemplo, a exclusão é possível em casos de ofensa física grave, injúria grave a ascendente e em hipóteses de crimes contra a vida e a honra.

O texto em discussão amplia esse rol ao incluir comportamentos que tribunais vinham reconhecendo pontualmente como geradores de dano, mas que não estavam positivados como gatilho para perda de direitos sucessórios.

A previsão expressa de abandono afetivo, quando voluntário e sem justificativa, é o ponto mais sensível, por exigir análise densa de fatos, contexto e nexo entre a omissão e o dano efetivo.

Deserdação continua medida excepcional

Mesmo com a mudança, a deserdação seguirá dependente de manifestação formal do autor da herança, com indicação precisa da causa.

A eficácia não será automática.

A motivação deverá ser demonstrada no inventário ou em ação própria, com contraditório e ampla defesa.

Na prática, o juiz deixa de apreciar tais condutas apenas sob o prisma dos danos morais e passa a avaliá-las também como motivo para exclusão hereditária.

Isso impõe lastro probatório robusto e avaliação qualitativa rigorosa, sob pena de banalizar o instituto.

Abandono afetivo e violência psicológica: onde traçar a linha

A expressão abandono afetivo voluntário e injustificado não se confunde com afastamento circunstancial, desavenças episódicas ou esfriamento recíproco das relações.

A proposta mira situações em que o descendente, podendo prestar assistência mínima moral ou material, se omite de forma contínua e sem justificativa idônea, causando dano concreto.

Já a ofensa à integridade psicológica remete à prática reiterada de humilhação, violência psicológica ou perseguição no seio da família.

Não se trata, portanto, de um evento isolado, mas de um conjunto consistente de indícios, relatos, documentos e, quando necessário, laudos que evidenciem gravidade e persistência.

Prova vira ponto de atrito

O componente probatório tende a ser o centro das disputas.

Reconstruir uma história de vida para aferir abandono afetivo exige examinar mensagens, registros de cuidados, comprovantes de despesas, diários de atendimento e testemunhos.

É preciso diferenciar frustração afetiva — que não é, por si só, ilícito — do inadimplemento de deveres jurídicos.

A ampliação das causas legais deve aumentar a litigiosidade nos inventários, com pedidos de produção de prova mais extensos e discussões sobre o padrão de convencimento.

A exigência de causa expressa e o controle judicial atuam como freios, mas não eliminam o risco de insurgências oportunistas em momentos de fragilidade familiar.

Impacto em inventários e cartórios

A partir da inclusão dessas hipóteses, inventários com alegação de deserdação por abandono afetivo tendem a ganhar instrução probatória mais longa, elevando custos e prazos.

Cartórios poderão registrar escrituras públicas de testamento e disposições patrimoniais com anexos mais detalhados e orientar sobre o alcance de cada cláusula.

Escritórios especializados em família e sucessões já reportam maior procura por revisão de testamentos e por estratégias de documentação de rotinas de cuidado — tanto de quem pretende deserdar quanto de quem busca se precaver contra contestações futuras.

Planejamento sucessório ganha peso

Para quem organiza a sucessão, o projeto reforça a necessidade de registrar a vontade com precisão.

Testamentos devem narrar fatos com clareza, indicar datas relevantes e, quando possível, anexar documentos que evidenciem a persistência da conduta apontada.

Redações genéricas reduzem a eficácia da deserdação e abrem espaço para impugnações.

Além do testamento, doações em vida, cláusulas de incomunicabilidade e seguros de vida podem contribuir para proteger determinados familiares, reduzindo a exposição a litígios em que a prova tem forte componente moral.

Convergência com outras mudanças do direito das sucessões

A proposta dialoga com debates paralelos, como ampliar a liberdade de dispor do patrimônio por ato de última vontade e redefinir a posição do cônjuge sobrevivente no rol de herdeiros.

Nesse cenário, a figura do descendente “ingrato” ganha destaque por aproximar a disciplina da herança de critérios de conduta concreta, não apenas de vínculos formais.

Defensores sustentam que a herança não deve beneficiar quem viola deveres elementares de cuidado e respeito no núcleo familiar.

Críticos ponderam que afetividade é dimensão difícil de juridicizar e que o mecanismo pode ser instrumentalizado como retaliação, com potencial de fragilizar o vínculo filial.

Filtro judicial e critérios objetivos

A calibragem judicial será determinante.

Caberá ao magistrado diferenciar conflitos familiares comuns, por vezes intensos, de comportamentos que afrontam deveres mínimos de solidariedade, dignidade e respeito, com dano verificável.

Ainda que o rol legal se amplie, a deserdação permanece medida excepcional, de interpretação estrita e dependente de prova contundente.

Experiências comparadas indicam que, onde as causas são mais amplas, cresce a necessidade de critérios objetivos e de delimitar o que é voluntário, injustificado e grave, sob pena de insegurança normativa.

Efeitos sociais e arranjos familiares

Os reflexos extrapolam o processo.

Em famílias recompostas, relações mais distantes entre pais e filhos adultos podem ganhar contornos litigiosos.

Em cenários de violência psicológica e patrimonial, a positivação de causas de exclusão é vista como mecanismo de proteção a idosos e pessoas vulneráveis.

De todo modo, a tendência é empurrar as famílias para o planejamento transparente e documental, antecipando em vida discussões que, historicamente, explodiam apenas no inventário.

Como cada lado pode se preparar

Quem pretende acionar a deserdação deverá reunir elementos desde cedo, como registros de tentativas de contato, comprovações de suporte material prestado ou negado e avaliações profissionais que atestem danos psicológicos.

Por outro lado, descendentes que cuidam dos pais ou que justificam ausências por motivo de saúde, distância ou conflitos pontuais podem organizar evidências que demonstrem presença, apoio e boa-fé.

Essa “contabilidade afetiva”, embora incômoda, tende a se tornar prática de gestão de risco jurídico no âmbito familiar.

Se a lei avançar com essas previsões, qual é o limite razoável entre punir condutas que ferem o dever de cuidado e evitar que a herança se torne instrumento de retaliação em disputas afetivas?

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Alisson Ficher

Jornalista formado desde 2017 e atuante na área desde 2015, com seis anos de experiência em revista impressa, passagens por canais de TV aberta e mais de 12 mil publicações online. Especialista em política, empregos, economia, cursos, entre outros temas. Registro profissional: 0087134/SP. Se você tiver alguma dúvida, quiser reportar um erro ou sugerir uma pauta sobre os temas tratados no site, entre em contato pelo e-mail: alisson.hficher@outlook.com. Não aceitamos currículos!

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