Decisões recentes do Superior Tribunal de Justiça têm definido quando o uso exclusivo do imóvel comum após o divórcio gera direito a indenização e quando a presença do filho no local afasta a cobrança, equilibrando responsabilidades entre os ex-cônjuges.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem delimitado dois cenários claros para o uso do imóvel comum após a separação: há indenização proporcional quando um dos ex-cônjuges ocupa o bem de forma exclusiva, e não há indenização quando o imóvel serve de moradia do filho do casal que reside com o genitor guardião.
Em decisões recentes, os ministros reforçaram que a presença do descendente descaracteriza a posse exclusiva e inviabiliza o pedido de “aluguel compensatório”.
Quando a presença do filho afasta a indenização
Em julho de 2024, a Terceira Turma afastou a cobrança de aluguéis de uma ex-mulher que permaneceu no apartamento com a filha.
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O colegiado entendeu que, nesses casos, o imóvel cumpre função de moradia da prole, o que impede enquadrar a situação como benefício exclusivo do adulto que ficou no local e, portanto, afasta a pretensão indenizatória.
A decisão seguiu a linha de casos anteriores e foi divulgada pela Secretaria de Comunicação do tribunal.
O entendimento não é isolado.
Em 2021, a Quarta Turma rejeitou pedido de arbitramento de aluguéis contra ex-marido que vivia com a filha em imóvel comum submetido à partilha, reforçando que a residência do descendente afasta a configuração de posse exclusiva do genitor.
O tribunal também sublinhou o dever parental de prover moradia, o que desloca a discussão do campo da fruição individual para o sustento da prole.
Regra geral: uso exclusivo gera compensação
Quando não há filho morando no local e um dos ex-cônjuges ocupa sozinho o imóvel, a orientação firmada admite o arbitramento de indenização proporcional à fração ideal do coproprietário preterido, inclusive antes da partilha formal.
A construção apoia-se, entre outros, nos artigos 1.319 e 1.326 do Código Civil, que tratam da responsabilidade do condômino pelos frutos percebidos e da partilha dos frutos na proporção dos quinhões.
A lógica é evitar enriquecimento sem causa enquanto perdurar a copropriedade decorrente do divórcio.
Na prática, o valor é calculado a partir do aluguel de mercado do bem, aplicando-se a cota do condômino alijado da posse direta.
Trata-se, em essência, de uma renda locatícia presumida, que busca refletir o que seria obtido se o imóvel estivesse locado a terceiro.
A técnica aparece em precedentes do próprio STJ ao examinar pedidos de “aluguel” em ocupações exclusivas pós-dissolução.
A partir de quando o “aluguel” é devido
Um ponto de impacto prático é o marco inicial da compensação.
Tribunais estaduais têm reiterado que a indenização só passa a ser exigível quando o ocupante recebe ciência inequívoca da oposição do outro coproprietário à fruição exclusiva.
Antes disso, em geral, reconhece-se a existência de comodato tácito — uma tolerância temporária e não remunerada entre ex-consortes.
Por isso, notificações formais, e-mails e petições que expressem a discordância costumam ser decisivos para fixar o início da cobrança.
Por que a moradia do filho muda o quadro
Nos casos em que o filho reside no imóvel, o STJ tem afirmado que a ocupação não representa vantagem exclusiva do adulto, mas cumprimento de dever parental.
A moradia, nesse contexto, integra a prestação de alimentos, deslocando o debate do campo da compensação patrimonial para a esfera do sustento da prole.
Assim, a presença do descendente dilui a ideia de fruição individual e afasta a tese de enriquecimento sem causa.
Em decisões divulgadas pela comunicação do tribunal, essa racionalidade foi explicitada, enfatizando que a residência do filho impede a narrativa de exclusividade que sustenta o pedido de aluguel compensatório.
Sinalização recente e previsibilidade
A tese vem sendo sintetizada também em julgados indexados em repositórios oficiais.
No Recurso Especial 2.082.584, julgado pela Terceira Turma, firmou-se que, servindo o imóvel de moradia ao filho comum em conjunto com o ex-cônjuge guardião, não há posse exclusiva, elemento que fundamenta o arbitramento de aluguel em favor do coproprietário não ocupante.
A formulação fornece previsibilidade para acordos e instrução probatória, reduzindo litígios sobre o que é devido após o fim da vida conjugal.
Antes ou depois da partilha: quando discutir a compensação
A discussão sobre “aluguel compensatório” pode ocorrer antes da partilha, justamente para evitar assimetrias patrimoniais nesse período de transição.
Enquanto subsiste a copropriedade e houver ocupação exclusiva, o pedido é admissível para equilibrar o ônus entre as partes.
Em sentido diverso, se há filho morando no imóvel com o genitor guardião, a jurisprudência tem afastado a indenização, sem prejuízo de o juiz avaliar, no caso concreto, se a moradia atende ou compensa parcelas de alimentos “in natura”.
Provas que costumam pesar
Relatórios de avaliação de mercado, laudos de corretores e documentos sobre despesas ordinárias e extraordinárias do imóvel contribuem para dimensionar o que seria devido ou demonstrar a inexistência da obrigação, conforme as circunstâncias.
Em pedidos de indenização, os elementos que demonstram o valor locatício e a participação de cada coproprietário tendem a orientar o arbitramento.
Quando há filho no imóvel, registros de guarda, residência e necessidades da prole ajudam a delinear a finalidade familiar da posse.
Em síntese prática
Hoje, a baliza é objetiva: uso exclusivo por um ex-cônjuge, sem filho residindo no local, permite a cobrança proporcional do “aluguel”.
Moradia do filho com o ex que ficou no imóvel descaracteriza a exclusividade e afasta a indenização.
O marco inicial, quando cabível, depende da oposição formal do coproprietário preterido, e o valor toma por base a renda de mercado do bem, na fração pertencente ao outro condômino.
Na sua realidade, há filho do casal morando no imóvel e existe documento que comprove que o coproprietário descontente formalizou a oposição ao uso exclusivo?