Tribunal reafirma que laços de afeto têm força jurídica e asseguram partilha de bens em igualdade com filhos biológicos
Uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), divulgada em novembro de 2024, consolidou um marco no Direito de Família brasileiro. A 3ª Câmara de Direito Privado manteve a sentença da 3ª Vara de Família e Sucessões de Sorocaba, que reconheceu a filiação socioafetiva de uma mulher com o pai de criação. A decisão garantiu a ela os mesmos direitos sucessórios da filha biológica.
O caso se apoia no artigo 1.593 do Código Civil, que define que “o parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”. Essa expressão — “outra origem” — tem sido interpretada pelos tribunais como uma abertura legal para o reconhecimento dos laços de afeto. O entendimento está em consonância com a Constituição Federal de 1988, que valoriza a dignidade da pessoa humana e a proteção da família.
Reconhecimento de vínculo afetivo na Justiça
A autora da ação foi criada desde o nascimento, em 1993, por um homem que a acolheu após a morte de sua mãe durante o parto. O acolhimento ocorreu com o consentimento do pai biológico. Ao longo dos anos, o homem exerceu de forma contínua e pública o papel de pai.
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Após o falecimento dele em 2021, a mulher teve o direito de filiação contestado pela irmã biológica. Ela tentou impedir a partilha dos bens herdados. Contudo, o tribunal concluiu que o vínculo socioafetivo estava amplamente comprovado.
Entre as provas, constavam o convite de casamento em que o falecido aparecia como pai e documentos oficiais que indicavam a autora como dependente. Também havia depoimentos que evidenciavam convivência familiar duradoura.
Segundo o relator do caso, desembargador João Pazine Neto, as evidências “demonstram a existência de uma relação paterno-filial legítima”. Ele destacou ainda que “a paternidade pode decorrer de vínculo biológico, legal ou afetivo”.
Fundamentos legais e evolução social
O entendimento do magistrado reflete uma mudança significativa no conceito de família. O Código Civil, ao admitir o parentesco por “outra origem”, reconhece juridicamente o afeto como base legítima das relações familiares.
Desse modo, o TJ-SP reafirmou que o amor, a convivência e o cuidado produzem efeitos jurídicos concretos, inclusive no campo sucessório e patrimonial. Essa interpretação, segundo especialistas como Maria Berenice Dias, está alinhada com o princípio da dignidade da pessoa humana e o melhor interesse da criança. Ambos são pilares constitucionais do Direito de Família moderno.
Além disso, decisões como essa fortalecem a ideia de que a filiação socioafetiva não depende de vínculo genético. Ela se baseia na presença contínua, no reconhecimento social e na responsabilidade afetiva. Assim, o Direito acompanha as transformações sociais e amplia a proteção jurídica a diversas formas de família.
Impactos jurídicos e simbólicos da decisão
A decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo também possui um peso simbólico relevante. Ela reafirma que filhos socioafetivos e biológicos têm direitos iguais na partilha de bens. Esse entendimento evita discriminações e assegura equidade nas relações familiares.
O caso de Sorocaba reforça um precedente importante para outros tribunais do país, que têm seguido a mesma linha interpretativa. A partir dessa decisão, novas ações de reconhecimento socioafetivo tendem a ser analisadas sob o mesmo prisma. Isso consolida uma jurisprudência mais humana e coerente com a realidade social brasileira.
Especialistas afirmam que esse avanço demonstra a maturidade do sistema jurídico. Ele reconhece o amor e a convivência como elementos que constroem a identidade familiar. A Justiça, portanto, passa a atuar de maneira mais próxima da vida real das pessoas. Afinal, o vínculo emocional tem tanto valor quanto o biológico.
Um marco de equidade e reconhecimento humano
A decisão da 3ª Câmara de Direito Privado, proferida em novembro de 2024, representa um divisor de águas na jurisprudência brasileira. Ela reafirma o papel do afeto como fonte legítima de direitos e deveres familiares.
Para o TJ-SP, negar efeitos jurídicos a uma relação afetiva seria negar a própria essência da convivência humana. O tribunal deixou claro que o afeto, quando construído de forma pública, contínua e voluntária, é capaz de gerar laços familiares plenos.
O caso de Sorocaba não apenas garantiu igualdade sucessória entre filhas biológicas e socioafetivas. Ele também reforçou a noção de justiça baseada na verdade emocional.
Ao reconhecer o valor jurídico do afeto, a Justiça brasileira avança em direção a um Direito mais sensível e adaptado às transformações sociais.
Afinal, não seria o amor, quando reconhecido pela lei, a mais legítima herança que um pai pode deixar?


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