Projeto de lei aprovado cria crédito emergencial e isenções fiscais. É a mesma lógica usada pela China para sustentar sua indústria
O Senado deu um passo decisivo nesta quarta-feira (24) ao aprovar, por unanimidade, o texto-base do projeto que cria um mecanismo emergencial para enfrentar os efeitos do tarifaço imposto pelos Estados Unidos contra produtos brasileiros.
A proposta exclui essas despesas do teto de gastos e autoriza o governo federal a liberar cerca de R$ 30 bilhões em financiamentos e renúncias fiscais para socorrer empresas atingidas.
Segundo o autor do projeto, senador Jaques Wagner (PT-BA), as tarifas anunciadas pelo presidente norte-americano Donald Trump afetam 36% de todas as exportações brasileiras destinadas ao mercado dos EUA em 2024, o que representa US$ 14,5 bilhões de um total de US$ 40,4 bilhões.
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O impacto, alerta o texto, pode comprometer cadeias produtivas de todas as regiões e colocar em risco milhões de empregos.
Programa Brasil Soberano e impacto imediato
O projeto, relatado pelo senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), está diretamente ligado à Medida Provisória 13/2025, que instituiu o programa Brasil Soberano, lançado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em agosto.
A medida prevê que os recursos sejam destinados ao Fundo Garantidor de Exportações (FGE), permitindo crédito com juros reduzidos e prioridade para empresas que dependem do mercado norte-americano.
O diferencial é que as pequenas e médias empresas também terão acesso ao programa por meio de fundos garantidores, desde que mantenham seus empregos ativos.
Essa condição busca proteger os trabalhadores em meio à turbulência causada pelas tarifas internacionais.
Exceções fiscais e regras do novo arcabouço
Em caráter excepcional, as despesas e renúncias fiscais vinculadas ao tarifaço não serão contabilizadas nas metas de resultado primário de 2025 e 2026, conforme previsto no Novo Arcabouço Fiscal.
Isso significa que os gastos para enfrentar a crise não serão considerados como violação às regras de responsabilidade fiscal.
Além disso, o texto isenta o governo de cumprir exigências tradicionais da Lei de Responsabilidade Fiscal, como a apresentação imediata de impacto orçamentário-financeiro e compensações de receita.
A exceção é limitada a R$ 5 bilhões no biênio 2025-2026, garantindo margem de manobra ao Executivo.
Aportes bilionários em fundos garantidores
O projeto também autoriza a União a reforçar três fundos estratégicos:
- Fundo Garantidor de Operações (FGO): até R$ 1 bilhão
- Fundo Garantidor de Operações de Crédito Exterior (FGCE): até R$ 1,5 bilhão
- Fundo Garantidor para Investimentos (FGI): até R$ 2 bilhões
Esses aportes vão permitir que o governo amplie a cobertura de operações de crédito, compartilhe riscos com o setor privado e fortaleça programas emergenciais como o PeacFGI Solidário, voltado para apoio rápido a empresas exportadoras.
Estratégia semelhante à usada pela China
Especialistas apontam que a estratégia brasileira guarda semelhanças com o modelo adotado pela China, onde o Estado atua como um amortecedor frente às pressões externas.
Assim como Pequim injeta subsídios, crédito barato e isenções fiscais para proteger suas empresas em disputas comerciais globais, Brasília agora utiliza fundos garantidores e renúncias fiscais para preservar a competitividade de seus exportadores.
A lógica é a mesma: usar a força do Estado para manter cadeias produtivas ativas, segurar empregos e evitar que tarifas internacionais comprometam a soberania econômica do país.
Perspectivas e próximos passos
Apesar da aprovação do texto-base, os senadores ainda precisam analisar duas emendas ao projeto, com previsão de votação na próxima semana.
Se confirmada a aprovação integral, a medida deve aliviar parte da pressão sobre setores industriais e agrícolas que têm os EUA como principal destino de suas vendas.
O governo aposta que, com o Brasil Soberano, será possível garantir liquidez às empresas, preservar empregos e mitigar a onda de instabilidade provocada pelo tarifaço.
Ao mesmo tempo, a proposta reforça a postura política de Lula de enfrentar os efeitos da política comercial de Trump sem comprometer o equilíbrio fiscal.