Como a marca montou, em plena Guerra Fria, um acordo de escambo que a colocou — ainda que por pouco tempo — no rol da “sexta maior frota naval do planeta”, trocando toneladas de refrigerante por submarinos, navios de guerra e petroleiros, segundo a CNBC, e redesenhando a disputa comercial com a URSS
A história é real e documentada pela CNBC: no fim dos anos 1980, a Pepsi fechou um acordo de escambo com a União Soviética e, por alguns meses, tornou-se proprietária de uma esquadra que a colocaria entre a “sexta maior frota naval do planeta”. Foram 17 submarinos, três navios de guerra e 10 petroleiros recebidos como contrapartida por milhões de litros de refrigerante, em um negócio avaliado em US$ 3 bilhões.
Para entender por que uma fabricante de bebidas acabou com uma frota militar, é preciso voltar a 1959, quando EUA e URSS abriram exposições para “vender” seus modelos ao mundo. A CNBC relembra que, dali em diante, a Pepsi insistiu por espaço no mercado soviético até selar, em 1972, o primeiro grande contrato capitalista de consumo no bloco. A moeda não conversível levou ao escambo: primeiro, com vodca; depois, com navios e submarinos.
Como começou: marketing, diplomacia cultural e a semente do escambo
Em 1959, Estados Unidos e União Soviética firmaram um acordo de intercâmbio cultural com exposições em Nova York e Moscou.
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A cena icônica do vice-presidente Richard Nixon debatendo com Nikita Khrushchev correu o mundo, assim como o gesto do então executivo Donald Kendall oferecendo um copo de Pepsi ao líder soviético.
A CNBC aponta esse episódio como o gatilho de uma estratégia de décadas.
A ofensiva comercial deu frutos em 1972: a Pepsi tornou-se a primeira empresa capitalista com contrato de distribuição na URSS, um movimento que mirava um mercado de cerca de 240 milhões de consumidores.
Como o rublo não era conversível, a solução foi o escambo: refrigerante por vodca, com a empresa americana distribuindo a bebida soviética nos EUA, relata a CNBC.
Expansão relâmpago: fábricas, anúncio inédito e um bilhão de garrafas
Com a aceitação popular, a primeira planta soviética ficou pronta dois anos depois e a rede cresceu para 10 fábricas em pouco tempo.
Nos anos 1980, a demanda explodiu, e a CNBC registra que a Pepsi veiculou o primeiro comercial capitalista na TV estatal do país.
Ao final da década, os soviéticos consumiam cerca de 1 bilhão de garrafas por ano, e as unidades produtivas passaram de 16 para 20.
Esse crescimento consolidou a marca, mas pressionou o equilíbrio do escambo. A vodca deixou de cobrir o volume de refrigerantes exigido pelo novo contrato.
Ao mesmo tempo, sanções e embargos ligados à geopolítica — como a guerra do Afeganistão — estreitaram as alternativas de compensação, pontua a CNBC.
O acordo incomum: por que a Pepsi recebeu submarinos e navios de guerra
Sem dólares e com o rublo fora do circuito internacional, Moscou propôs uma moeda de troca improvável: ativos navais pouco utilizados.
Segundo a CNBC, a lista incluía 17 submarinos, três navios de guerra e 10 petroleiros, totalizando US$ 3 bilhões.
No papel, isso colocava a companhia entre as donas da “sexta maior frota naval do planeta”, um recorde tão simbólico quanto efêmero.
A Pepsi não virou potência militar: revendeu a frota para uma empresa europeia de reciclagem marítima, relata a CNBC, convertendo ferro em caixa e cumprindo o fornecimento de bebidas.
Donald Kendall ironizou que a empresa estava “desarmando a URSS mais rápido do que o próprio governo americano”, frase lembrada pela CNBC como síntese do absurdo lógico daquele escambo.
Consequências e desfecho: pizza em Moscou, colapso soviético e volta ao jogo “normal”
Como parte do pacote, a Pepsi se comprometeu a investir na abertura de duas unidades da Pizza Hut em Moscou, um símbolo de consumo ocidental em plena transição, conforme a CNBC.
Mas o tempo político correu mais rápido do que o comercial: a URSS colapsou em dezembro de 1991, e os contratos foram readequados ao novo ambiente econômico, com regras de mercado e moedas conversíveis.
A marca seguiu em terra firme, disputando o gigantesco mercado de bebidas com a Coca-Cola, enquanto o episódio da “sexta maior frota naval do planeta” ficou para a história corporativa como um case de criatividade comercial em contexto de restrição cambial — e como um dos capítulos mais improváveis da Guerra Fria, sublinha a CNBC.
O que essa história ensina: negociação em ambientes restritos e reputação de marca
Para além da curiosidade, o caso mostra como empresas usam instrumentos não convencionais quando cadeias de pagamento estão bloqueadas.
Trocar mercadorias por ativos — inclusive militares, desde que desativados e legalmente transferíveis — foi um atalho para capturar demanda reprimida, descreve a CNBC.
É também uma lição de branding: um copo oferecido em 1959 virou décadas de presença cultural e comercial.
Por outro lado, o risco de embargos e a volatilidade geopolítica indicam que acordos “criativos” carregam custos ocultos: logística de alienação de ativos, exposição reputacional e incerteza regulatória.
Sem o colapso soviético, talvez a história fosse outra; com ele, o escambo cumpriu seu papel de ponte até a normalização.
Se você fosse o decisor, teria aceitado um pagamento em submarinos e navios para fechar o maior acordo da época? A “sexta maior frota naval do planeta” nas mãos de uma empresa privada foi genialidade ou risco desnecessário? Conte como você avaliaria um escambo desses hoje (moedas fracas, sanções, ativos alternativos) e se o ganho de mercado justificaria a ousadia — queremos ouvir quem lida com negociação real no dia a dia.