Com cortes americanos e disputas políticas, o BRICS se organiza para ocupar espaço em financiamento, votação e definição de normas dentro da ONU
O BRICS, hoje reunindo Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul e membros expandidos como Egito, Etiópia, Indonésia, Irã e Emirados Árabes Unidos, surge como bloco disposto a preencher o vazio deixado pelos Estados Unidos em agências da ONU. A leitura compartilhada por diplomatas e analistas é que, diante da retração de Washington, cresce a chance de o grupo moldar decisões e conceitos que regem a organização.
Esse cenário foi reforçado por relatos apresentados durante uma conferência em Bruxelas e nos bastidores da 80ª Assembleia Geral da ONU, em Nova York. Com postura multilateral mais afirmativa, os países do BRICS enxergam na ONU um palco estratégico para influenciar agendas de direitos humanos, financiamento e governança global.
O que está em jogo na ONU
A retirada de recursos e o afastamento dos EUA de agências-chave, com saídas de UNESCO e OMS e cortes em manutenção da paz, criaram pressão orçamentária inédita no sistema.
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Como principal financiador, Washington respondia por parcela relevante do orçamento; o recuo forçou o secretário-geral António Guterres a adotar um plano de cortes e demissões.
Nesse vácuo, a China e aliados do BRICS ampliam presença financeira e política.
Há, porém, inconsistências operacionais: contribuições chinesas nem sempre ocorrem no prazo, o que gera dúvidas sobre previsibilidade, ainda assim o movimento de ocupar cargos e pautas avança.
Conclusão prática: quem paga e comparece ganha poder para definir prioridades.
Como o BRICS pretende ocupar espaço
Mais que trazer dinheiro, o BRICS busca redefinir parâmetros.
Defensores de direitos humanos alertam que Pequim e parceiros impulsionam mudanças de linguagem e critérios aplicados na ONU, do conceito de “direitos” à forma de monitorar violações.
Isso transborda para a economia, afetando cadeias de suprimentos, compliance e decisões de investimento.
Segundo participantes da conferência, a China integra direitos humanos ao cálculo estratégico: o tema é tratado como variável econômica e geopolítica de longo prazo.
O horizonte de 30 anos, sem ciclos eleitorais frequentes, dá vantagem ao BRICS em organismos onde países ocidentais operam sob pressões domésticas imediatas.
Expansão, ambição e limites internos
O BRICS foi além do quinteto original. Novos membros como Egito, Etiópia, Indonésia, Irã e Emirados Árabes Unidos ampliam peso demográfico e econômico e reforçam vínculos com o Sul Global.
O bloco também cultiva países parceiros, permitindo presença em cúpulas sem adesão plena.
Ainda assim, há tensões. China e Índia disputam influência; sanções à Rússia testam a coesão; e rivalidades regionais podem contaminar agendas comuns.
Ambições monetárias, da desdolarização à moeda comum, esbarram em custos políticos elevados, como união bancária e convergência macroeconômica.
Resumo honesto: o BRICS cresceu e pesa, mas nem sempre fala com uma só voz.
O impacto econômico das novas normas
Modificar definições de direitos, padrões regulatórios e riscos de due diligence na ONU tem efeito direto nos balanços corporativos.
Empresas expostas a cadeias globais podem ver auditorias, certificações e critérios ESG recalibrados conforme novas maiorias em conselhos e comitês.
Investidores e áreas de risco já mapeiam cenários com múltiplos padrões concorrentes, o que eleva custo de conformidade e redistribui vantagens setoriais e geográficas.
Ponto-chave: o BRICS trabalha por dentro das regras para alterar as próprias regras. É um jogo de paciência que rende dividendos normativos.
Brasil no centro do tabuleiro
À frente da presidência rotativa em 2025, o Brasil tenta arbitrar diferenças e atrair o Sul Global para reformas de governança.
Em paralelo, a política segue ruidosa. Na Assembleia Geral, Donald Trump endureceu o tom contra a ONU e disse que o Brasil fracassará sem cooperar com os EUA, ao mesmo tempo em que fez gestos de aproximação com Lula nos bastidores.
A ambiguidade é calculada, com discurso duro para a base doméstica e canal aberto para negócios e segurança.
Para Brasília, o desafio é equilibrar pontes: manter diálogo com Washington, liderar no BRICS e evitar alinhamentos automáticos que fechem mercados ou estrangulem investimentos.
Em linguagem de diplomacia econômica, trata-se de maximizar opções sem perder acesso.
O que vem a seguir para o BRICS
No curto prazo, o bloco deverá pressionar por reformas na governança global, ampliar coordenação econômica e avançar em instrumentos financeiros como o Novo Banco de Desenvolvimento.
A desdolarização seguirá gradual, com foco em moedas locais e arranjos de liquidez. Longe de substituir o dólar, perto de reduzir vulnerabilidades a sanções.
No médio prazo, o teste é político: transformar massa crítica em consenso prático. Se conseguir, o BRICS influenciará votos, financiamento e léxico normativo na ONU.
Se patinar, a expansão pode virar clube heterogêneo com retórica forte e entregas contidas.
O BRICS encontrou uma janela estratégica na ONU e quer ditar parte da agenda num momento de retração americana.
A questão é se o bloco converte essa oportunidade em regras duráveis, e com quais custos para empresas, investidores e políticas públicas.
Você concorda que o BRICS deve ocupar esse espaço? Onde o Brasil deveria puxar o freio e onde deveria acelerar? Conte nos comentários qual decisão impacta mais o seu setor, moedas locais no comércio, novos padrões de compliance ou reformas na governança da ONU.