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O caminhão russo Kamaz sobreviveu ao colapso soviético, a incêndios, guerras e sanções, e ainda domina o Rally Dakar com força, tecnologia e resistência fora do comum

Escrito por Bruno Teles
Publicado em 04/04/2025 às 23:03
Caminhão russo sobrevive a guerras, incêndios e gelo e ainda domina o Rally Dakar
Caminhão russo sobrevive a guerras, incêndios e gelo e ainda domina o Rally Dakar
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O caminhão russo da marca Kamaz virou lenda por cruzar rios, encarar nevascas e desafiar as dunas, e sua história é mais imprevisível que os terrenos por onde passa

Você já deve ter visto um vídeo assim: um caminhão russo mergulha num rio, enfrenta uma ribanceira impossível ou desaparece em meio à neblina congelante. E volta. Sempre volta. Por trás dessa cena cinematográfica existe uma história real, e surpreendente, de um gigante chamado Kamaz, o caminhão russo criado na era soviética que virou símbolo de força, resiliência e, por que não, teimosia de aço.

O caminhão russo Kamaz é o tipo de veículo que parece ter saído de um filme de ficção pós-apocalíptico. Mas não. Ele nasceu em 1976, no coração da União Soviética, e continua até hoje cruzando trilhas intransitáveis, rodando sobre lagos congelados, cortando desertos e, agora, enfrentando um novo inimigo: as sanções internacionais. Sua história mistura glória esportiva, colapso econômico, renascimentos dignos de fênix e uma sobrevivência teimosa em tempos de guerra, literalmente.

Forjado para o impossível

Tudo começou com uma decisão política em 1969: o governo soviético queria uma fábrica de caminhões pesados que fosse capaz de abastecer o país continental. O local escolhido foi Naberezhnye Chelny, no Tartaristão, onde nasceria a Kamaz, à beira do rio Kama.

Em pouco tempo, a cidade virou canteiro de obras, e o caminhão russo começou a ganhar forma. Em 1976, o primeiro modelo foi lançado. Com tração 6×6 e uma estrutura que parecia feita para enfrentar o fim do mundo, o Kamaz 5320 já mostrava a que veio.

A produção cresceu num ritmo alucinante. Em 1979, apenas três anos depois do lançamento, a Kamaz já havia fabricado 100 mil unidades. No ano seguinte, 150 mil. Os caminhões passaram a ser usados em todo tipo de tarefa: transporte de grãos, construção, missões militares, resgates e até exploração petrolífera em condições extremas. O caminhão russo virou selo postal, peça de propaganda estatal e orgulho da indústria pesada.

O monstro que voa no deserto

Mas foi no esporte que o caminhão russo mostrou ao mundo que podia mais. Em 1988, nasceu a equipe Kamaz Master, destinada a participar do Rally Dakar. Um caminhão de várias toneladas em meio a dunas? Muita gente riu. Depois, aplaudiu. O Kamaz empilhou vitórias. Em 2022, conquistou seu 19º título na prova, mantendo-se como a equipe mais vencedora da história da categoria caminhões. Os vídeos do Kamaz voando sobre dunas são tão surreais que parecem animação digital — mas são só o resultado de engenharia extrema.

O fim da União Soviética quase arrastou a Kamaz junto. As vendas despencaram, a estrutura desmoronou e, em 1993, um incêndio destruiu a principal fábrica de motores. Muitos apostaram que era o fim. Não foi. O caminhão russo renasceu das cinzas. Com ajuda do governo e novas parcerias, como a com a Daimler (dona da Mercedes-Benz), voltou a produzir e modernizou tudo: motores, cabines, tecnologia. A nova geração tinha cara de Europa, mas alma soviética.

Da neve à eletricidade

Com os anos 2000, o caminhão russo se adaptou a novos tempos. Vieram os modelos K3, K4 e K5, com cabines modernas, eletrônica embarcada, versões elétricas, movidas a hidrogênio e até protótipos autônomos. A Kamaz fornecia ônibus urbanos para Moscou, desenvolvia veículos para mineração e testava caminhões sem motorista em regiões polares. Mas em 2022, veio mais um baque: a guerra na Ucrânia.

Sanções e isolamento global

Com o início da invasão russa à Ucrânia, o caminhão russo entrou na mira das sanções internacionais. Parceiros estrangeiros romperam acordos. A Daimler se retirou. Componentes pararam de chegar. A Kamaz, com forte ligação ao governo e às Forças Armadas, foi incluída em listas de embargo. Em 2023 e 2024, a equipe Kamaz Master foi barrada do Rally Dakar por recusar assinar um documento que condenava a guerra. Sem aceitar correr sob bandeira neutra, a marca preferiu se retirar.

Para driblar o isolamento, a Kamaz se juntou à retomada da marca Moskvitch, agora rebatizando SUVs chineses montados na antiga fábrica da Renault. Também expandiu sua linha de caminhões militares e modelos industriais, mirando no mercado interno e em países ainda alinhados à Rússia. Com ou sem apoio externo, o caminhão russo insiste em rodar, e essa, talvez, seja sua característica mais fascinante.

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Bruno Teles

Falo sobre tecnologia, inovação, petróleo e gás. Atualizo diariamente sobre oportunidades no mercado brasileiro. Com mais de 7.000 artigos publicados nos sites CPG, Naval Porto Estaleiro, Mineração Brasil e Obras Construção Civil. Sugestão de pauta? Manda no brunotelesredator@gmail.com

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