Descoberta de uma variedade tradicional de milho capaz de captar nitrogênio do ar chama a atenção de cientistas, produtores e do agronegócio mundial, podendo impactar custos, sustentabilidade e inovação no campo.
O milho que capta nitrogênio do ar deixou o status de curiosidade de laboratório para ganhar manchetes internacionais após ser descrito publicamente, em 2021, pelo professor Alan Bennett, da Universidade da Califórnia.
A informação foi publicada originalmente pelo portal agropecuário Compre Rural, que destacou o potencial da descoberta para reduzir custos com adubação e mitigar impactos ambientais.
Desde então, universidades, empresas de sementes e governos monitoram cada passo da pesquisa que pode alterar a base da agricultura moderna.
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Milho que capta nitrogênio: da Serra Mixe para os holofotes científicos
Na região montanhosa da Serra Mixe, em Oaxaca, México, agricultores indígenas cultivam há séculos uma variedade local chamada olotón.
Em solo pobre, o milho fixador de nitrogênio sobrevive graças a raízes aéreas que continuam surgindo depois de a planta atingir a fase adulta.
Essas raízes liberam uma mucilagem açucarada que abriga bactérias diazotróficas — microrganismos capazes de capturar nitrogênio atmosférico e convertê-lo em amônia, forma assimilável pelas plantas.
Ensaios de campo apontam que o cereal obtém de 29 % a 82 % do elemento sem qualquer fertilizante químico.
Raízes aéreas e mucilagem: o mecanismo inovador do milho
Cada raiz aérea forma uma capa gelatinosa com baixo teor de oxigênio, ambiente ideal para a enzima nitrogenase realizar a fixação.
O açúcar exsudado serve de alimento às bactérias endofíticas, criando uma parceria simbiótica incomum em gramíneas.
Essa mesma lógica, comum em leguminosas como feijão e soja, nunca havia sido comprovada em milho comercial.
O milho que capta nitrogênio do ar inaugura uma nova categoria agronômica ao unir alta demanda nutricional a uma fonte biológica própria.
Impactos econômicos e ambientais para o agronegócio
A produção de fertilizantes nitrogenados consome cerca de 2 % da energia mundial e responde por até 5 % das emissões globais de gases de efeito estufa.
Ao dispensar esses insumos, o milho fixador de nitrogênio promete:
- Reduzir custos diretos de produção, principalmente em regiões onde a ureia representa parcela expressiva dos gastos dos pequenos produtores.
- Diminuir a pegada de carbono do agronegócio, contribuindo para metas internacionais de mitigação climática.
- Evitar a eutrofização de mananciais, já que o excesso de nitrogênio deixa de escorrer para rios e lagos.
Do conhecimento tradicional à genética moderna no milho
Pesquisadores vêm mapeando os genes envolvidos na formação das raízes aéreas e na síntese de mucilagem.
O objetivo é introgressar esses genes em híbridos de alto rendimento sem sacrificar produtividade.
Testes em estufas e microparcelas avançam nos Estados Unidos, México, Brasil, China e Índia.
Entretanto, a previsão mais otimista indica liberação de sementes comerciais apenas na próxima década.
“Ainda precisamos entender completamente a regulação genética antes de pensar em larga escala”, reforça Bennett, em declarações reproduzidas pelo Compre Rural.
Desafios regulatórios e de repartição de benefícios
A bioprospecção da variedade mexicana levanta questões jurídicas sob o Protocolo de Nagoya, tratado que exige repartição justa de benefícios com comunidades locais.
Organizações indígenas da Serra Mixe solicitam participação em eventuais royalties, argumento que ganhou força diante do interesse de multinacionais de sementes.
Vantagens para a agricultura familiar
Mesmo nos cenários em que a fixação cobre apenas 30 % da demanda, experimentos mostram que já é possível eliminar pelo menos uma adubação de cobertura, economizando até 60 kg de ureia por hectare.
Para agricultores familiares em regiões tropicais, o milho que capta nitrogênio do ar pode representar independência de insumos caros e instáveis no mercado internacional.
Possibilidades para outras culturas agrícolas
Ao compreender o mecanismo, cientistas pretendem aplicar ferramentas como CRISPR para transferir a característica a outras culturas de alto consumo de nitrogênio, caso do arroz irrigado e do trigo.
Se bem-sucedida, a estratégia ampliará o alcance da tecnologia e potencializará os ganhos ambientais.
Pontos críticos para o futuro do milho fixador de nitrogênio
- Estabilidade da fixação em solos ricos em nitrogênio, onde plantas tendem a desativar o processo natural.
- Quantificação precisa da contribuição bacteriana em diferentes zonas climáticas.
- Escalabilidade da produção de sementes sem diluir a adaptação original da Serra Mixe.
Entre a promessa e a adoção prática no agronegócio
Enquanto produtos biológicos tentam suprir parte da demanda de nitrogênio na lavoura, o milho fixador de nitrogênio surge como alternativa autossuficiente.
No entanto, especialistas alertam que, sem manejo adequado, a simples adoção da nova genética não resolverá problemas de erosão, balanço de nutrientes ou conservação de solos.
Desafios e oportunidades para produtores de milho
O milho que capta nitrogênio do ar carrega potencial de reformular a matriz de custos agrícolas, reduzir emissões e democratizar tecnologia entre produtores de diferentes escalas.
Mesmo com obstáculos técnicos e regulatórios, a inovação agronômica desperta otimismo em um momento de pressão global por sistemas alimentares mais sustentáveis.
Você acredita que os agricultores adotarão rapidamente essa variedade ou o domínio dos fertilizantes ainda ditará o ritmo da produção de grãos nos próximos anos?