Atrasos frequentes de até 10 minutos levantam dúvidas entre trabalhadores; entenda o que a CLT prevê e quando pode gerar problemas sérios.
No ambiente de trabalho, é comum ouvir colegas comentarem que a lei permite atraso de funcionário de até dez minutos por dia sem problemas. Mas será que isso é verdade?
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) realmente prevê uma tolerância nos registros de ponto, mas ela não é um “direito de atrasar” e, se usada de forma abusiva, pode até resultar em demissão por justa causa.
Este artigo explica o que diz a lei, como os tribunais interpretam essa tolerância e por que o trabalhador precisa ter cuidado para não confundir flexibilidade com permissividade.
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O que a lei determina
A CLT, no artigo 58, fixa a duração normal do trabalho em oito horas diárias, salvo acordo ou convenção coletiva que preveja outro limite. O ponto-chave está no parágrafo 1º desse artigo, que estabelece:
“Não serão descontadas nem computadas como jornada extraordinária as variações de horário no registro de ponto não excedentes de cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos diários.”
Na prática, isso significa que pequenas variações na marcação do ponto — tanto para mais quanto para menos — não podem gerar desconto ou horas extras, desde que o total de minutos de diferença não ultrapasse dez no mesmo dia.
Portanto, se o trabalhador entrar cinco minutos antes do horário oficial e sair cinco minutos depois, a empresa não pode registrar isso como hora extra.
Do mesmo modo, se entrar cinco minutos atrasado e sair cinco minutos mais cedo, também não haverá desconto.
A interpretação dos tribunais
O Tribunal Superior do Trabalho (TST) consolidou esse entendimento na Súmula 366, que reforça a regra da CLT e acrescenta: quando as variações ultrapassam os dez minutos diários, o tempo excedente deve ser computado integralmente como hora extra ou desconto, já que o empregado se encontra à disposição do empregador.
Isso deixa claro que a tolerância é uma margem de ajuste e não uma autorização para atrasar ou sair antes diariamente.
O risco da desídia
Se o trabalhador passa a usar essa tolerância de forma constante, mesmo sem ultrapassar os dez minutos, a empresa pode entender que há desídia.
Esse termo aparece no artigo 482 da CLT como uma das hipóteses de demissão por justa causa.
A desídia é caracterizada por falta de interesse, preguiça, negligência ou má vontade no cumprimento das funções. Pequenos atrasos, repetidos todos os dias, podem ser interpretados como indício desse comportamento.
Na prática, o empregador costuma adotar medidas gradativas: primeiro uma advertência, depois uma suspensão e, em casos de insistência, a rescisão do contrato por justa causa.
Exemplos práticos
Imagine três situações diferentes:
- Funcionário A chega quatro minutos atrasado em um dia isolado. A variação está dentro da tolerância e não gera desconto.
- Funcionário B chega sete minutos atrasado e sai três minutos mais cedo. No total, a diferença é de dez minutos, ainda dentro do permitido.
- Funcionário C chega seis minutos atrasado todos os dias. O comportamento é habitual e ultrapassa a margem isolada de cinco minutos, o que pode levar ao desconto e até a medidas disciplinares.
Esses exemplos mostram que a lei protege o trabalhador de injustiças pontuais, mas não o autoriza a acumular atrasos de forma recorrente.
Impactos para empresas e trabalhadores
Do lado das empresas, a tolerância legal evita discussões sobre segundos ou minutos de diferença que poderiam tornar inviável o controle de ponto.
Por outro lado, exige monitoramento para que o benefício não seja distorcido.
Já para os trabalhadores, a mensagem é clara: a regra existe para garantir flexibilidade em situações eventuais, como trânsito, problemas no transporte ou filas no acesso ao trabalho.
Mas quem adota atrasos frequentes corre o risco de ser enquadrado em desídia e perder o emprego com justa causa.
A chamada “tolerância de dez minutos” é real e está prevista no artigo 58, §1º da CLT, além de ter respaldo na Súmula 366 do TST. Ela funciona como um ajuste técnico no registro de ponto, evitando discussões sobre minutos insignificantes.
Entretanto, isso não significa que o trabalhador pode se atrasar todos os dias sem consequências. A lei garante flexibilidade, mas também protege a empresa contra abusos. Quando o comportamento se repete e demonstra falta de interesse, pode ser interpretado como desídia, prevista no artigo 482 da CLT, e resultar até em demissão por justa causa.
Em resumo: a lei protege quem precisa lidar com imprevistos, mas não respalda o “corpo mole”. O melhor caminho é usar a tolerância com responsabilidade e cumprir a jornada corretamente.