Brasil aposta no sorgo como alternativa estratégica ao milho, com exportações para a China e destaque crescente no setor de biocombustíveis
O brasileiro comum, principalmente nas grandes cidades, dificilmente já ouviu falar do sorgo. Muitos sequer sabem o que é, mas trata-se de um dos cereais mais cultivados no mundo. No Brasil, começa a ganhar protagonismo no agronegócio, deixando de ser visto apenas como uma cultura secundária.
Uso interno e expansão recente
Historicamente, o sorgo sempre esteve ligado ao mercado interno. A maior parte da produção era destinada à ração animal, especialmente para aves e suínos.
Nos últimos anos, porém, o grão passou a abastecer também a indústria de biocombustíveis, sobretudo na produção de etanol. Essa diversificação reforça sua relevância dentro da cadeia agrícola.
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Uma das razões para o avanço do sorgo é a sua adaptabilidade. A planta se desenvolve bem em regiões quentes e secas, onde culturas como o milho encontram dificuldades. Essa característica o torna estratégico em cenários de irregularidade climática.
Rumo à exportação
Agora, o cereal inicia uma nova etapa. A partir de 2026, o Brasil poderá exportar sorgo para a China, após acordo firmado entre os dois países.
Segundo Lucas Sleutjes Silveira, da Advanta Seeds, o próximo passo é ajustar protocolos fitossanitários e padrões de qualidade. “A expectativa é que já na safrinha de 2026 o Brasil esteja apto a embarcar sorgo granífero para o mercado chinês”, afirmou.
O potencial desse mercado é enorme. Dados do USDA indicam que a China pode demandar até 7,9 milhões de toneladas por ano, o que representa cerca de 81% da importação global. Essa procura coloca o grão em posição de destaque.
Panorama global
Os Estados Unidos são os maiores exportadores, com 5,4 milhões de toneladas. Em seguida aparecem Austrália, com 2,6 milhões, e Argentina, com 1,4 milhão. Juntos, esses três países controlam 96% do comércio internacional.
O mais importante é que a conjuntura começa a abrir espaço para novos fornecedores, já que a área plantada nos EUA mostra sinais de retração.
Além disso, tensões comerciais entre Washington e Pequim reduzem a previsibilidade das compras chinesas.
Nesse cenário, o Brasil surge como candidato natural a ocupar parte desse espaço. O país produziu 5 milhões de toneladas na safra 2024/25 e se consolidou como o terceiro maior produtor mundial.
Vantagens da safrinha
Dentro do território nacional, o sorgo também ganha relevância. A cultura é considerada um “plano B” competitivo frente ao milho safrinha.
A tolerância à seca, a adaptabilidade a diferentes solos e o custo de produção até 30% menor são fatores decisivos. Essas vantagens tornam o grão uma escolha estratégica em janelas de plantio tardias.
Enquanto o milho precisa de mais água e corre risco em anos de estiagem, o sorgo mantém produtividade com menor estresse hídrico.
“O sorgo enfrenta a seca, mas não a fome. Se o produtor adota manejo nutricional adequado, pode colher até 200 sacas por hectare”, explicou o engenheiro agrônomo Wedersom Urzedo.
Em estados como Mato Grosso e Goiás, a expansão já é visível. Só em Goiás, a área deve crescer 2,2% em 2024/25, alcançando 393 mil hectares.
Outro vetor de crescimento é a bioenergia. Pesquisas mostram que o rendimento do sorgo para produção de etanol é semelhante ao do milho, mas com custo de aquisição menor.
Usinas em Mato Grosso do Sul, Maranhão e Vale do Araguaia já adaptaram suas linhas para processar os dois grãos, criando modelos híbridos.
Além disso, o subproduto do etanol, o DDG, é altamente proteico e pode ser usado na alimentação animal. “O DDG gerado após a produção de etanol é altamente proteico e pode ser usado na alimentação animal, agregando valor à cadeia”, destacou Ana Scavone, da Advanta Seeds.
Essa característica reforça a versatilidade do grão, que ainda serve como biomassa e cobertura de solo.
Tecnologia e inovação
O salto da cultura no Brasil está diretamente ligado ao avanço tecnológico. Entre as inovações está a tecnologia igrowth, que aumenta a tolerância do sorgo a herbicidas do grupo das imidazolinonas.
Isso garante maior eficiência no controle de gramíneas, um dos maiores problemas da lavoura. O resultado são colheitas mais limpas, uniformes e produtivas, com benefícios até para culturas subsequentes.
Outro destaque é o consórcio de sorgo com braquiária. Essa integração amplia a cobertura do solo, aumenta a biomassa e fortalece sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta, conhecidos como ILPF.
Desafios do cultivo
Apesar dos avanços, o sorgo ainda enfrenta desafios. O controle de pragas como percevejos, lagartas e pulgões exige atenção constante.
Doenças fúngicas também representam riscos à lavoura. Empresas de pesquisa já oferecem soluções específicas, mas o manejo segue como fator decisivo.
Outro ponto crítico é a nutrição. Muitos produtores, por confiarem na resistência do grão, acabam negligenciando a adubação.
Esse erro compromete o potencial produtivo. “O sorgo exige o mesmo planejamento que o milho, com atenção especial à escolha do material genético e ao preparo do solo”, reforçou Wedersom Urzedo.
Um novo ciclo
Nos últimos quatro anos, a produção brasileira de sorgo dobrou. A cultura deixou de ser vista como “alternativa de risco” e passou a ser encarada como estratégica.
Com o acordo de exportação para a China, o fortalecimento no setor de biocombustíveis e os ganhos tecnológicos, o grão tem potencial para assumir papel de destaque.
Portanto, mais que um complemento ao milho, o sorgo pode se tornar protagonista de uma nova fase da agricultura brasileira, unindo rentabilidade, sustentabilidade e inserção global.
Com informações de Times Brasil.