Estudo mostra que a prática de exercícios físicos faz o tempo parecer mais lento, independentemente da intensidade ou da presença de competição.
O tempo parece desacelerar quando estamos fazendo exercício físico? Quem já correu na esteira ou fez uma série longa na academia sabe: minutos viram uma eternidade.
Mas essa impressão é apenas subjetiva ou existe uma explicação científica por trás dessa sensação?
Estudo revela percepção distorcida durante o esforço físico
Uma pesquisa publicada em abril de 2024 no periódico Brain and Behavior trouxe novas respostas sobre como percebemos o tempo durante o exercício físico .
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Segundo os autores, a sensação de que os minutos se arrastam enquanto nos exercitamos não é apenas impressão. Os testes mostraram que, de fato, as pessoas sentem o tempo passar mais devagar nesses momentos.
Os pesquisadores conduziram o estudo com 33 adultos ativos fisicamente, sendo 16 mulheres e 17 homens.
Todos eles realizaram três testes de ciclismo de 4 quilômetros em um ambiente virtual. Em um dos testes, o participante pedalava sozinho.
Nos outros dois, pedalava acompanhado por uma figura virtual: um colega não competitivo ou um competidor direto.
Durante as sessões, os pesquisadores pediram aos participantes que estimassem o tempo de 30 segundos. Esse exercício físico foi feito antes, durante e após os treinos.
Os resultados mostraram diferenças claras na percepção temporal ao longo das etapas.
Percepção do tempo foi alterada durante o exercício
De acordo com Stein Menting, coautor do estudo, os participantes geralmente diziam “parar” aos 28 segundos durante o exercício físico .
Já antes e depois do esforço, esse mesmo comando ocorria aos 31,4 e 31,6 segundos, respectivamente. Os pesquisadores concluíram que, durante o exercício, o tempo foi percebido como mais lento.
Esse padrão foi observado tanto quando os participantes pedalavam sozinhos quanto em grupo, seja com um colega virtual ou um competidor.
Ou seja, a simples presença de um “rival” não alterou a forma como o tempo era percebido, embora tenha impactado outros aspectos do desempenho.
Competições aumentam desempenho, mas não afetam o tempo percebido
Ainda que a percepção do tempo não tenha mudado com a presença de competidores, o desempenho físico dos participantes foi diferente.
Em média, os ciclistas terminaram a prova em 459 segundos quando estavam competindo com outra pessoa virtual.
Esse tempo foi mais rápido do que nos testes com o colega não competitivo (467 segundos) e também no teste solo (470 segundos).
Isso mostra que o estímulo da competição aumentou a velocidade, mesmo sem interferir na percepção de duração da atividade.
Os participantes também relataram que o exercício parecia mais difícil conforme avançavam nas provas.
No entanto, esse aumento de esforço não foi suficiente para alterar a percepção de tempo, o que indica que a distorção não está necessariamente ligada à intensidade sentida.
Intensidade controlada pode alterar a percepção
Apesar do resultado, Stein Menting alertou que a intensidade pode, sim, afetar a percepção de tempo em certos contextos.
Estudos anteriores mostraram que exercícios com intensidade fixa mais elevada podem fazer o tempo parecer ainda mais lento.
Neste novo estudo, os participantes controlavam sua própria intensidade, o que pode ter influenciado nos resultados.
Outro ponto relevante é a composição da amostra. Como explicou Andrew Edwards, também autor do estudo, os participantes não eram atletas profissionais, mas estavam em boa forma física. Isso levanta dúvidas sobre a aplicabilidade dos resultados em populações menos ativas.
Edwards destacou que o tamanho da amostra foi pequeno. Portanto, os resultados não devem ser generalizados de forma ampla, pelo menos por enquanto. Novos estudos com grupos maiores e diferentes perfis físicos podem trazer mais respostas.
Como o cérebro percebe o tempo durante o exercício
Os autores sugerem que o tempo desacelera durante o exercício porque a pessoa entra em um estado de atenção extrema.
Isso aumentaria a percepção de cada sensação física. Assim, em vez de o tempo passar normalmente, parece que mais experiências estão acontecendo em menos segundos, criando a impressão de uma duração maior.
Contudo, essa explicação baseada na atenção é questionada por outros cientistas. O psicólogo Philip Gable, da Universidade de Delaware, acredita que a motivação é o principal fator que altera a percepção temporal, e não a atenção.
Em seus estudos, Gable observou que o tipo de motivação influencia o tempo percebido. Quando a motivação é positiva — como a expectativa de algo bom — o tempo parece voar.
Mas quando a motivação é de fuga, ou seja, o desejo de parar algo desagradável, o tempo desacelera.
No caso do estudo de ciclismo, Gable acredita que os participantes estavam motivados a evitar o esforço extremo. Esse tipo de motivação gera uma percepção de tempo mais lento.
O cérebro, ao perceber o desconforto, envia um “alerta” que desestimula a continuidade, fazendo o tempo parecer mais longo do que é.
Distorção do tempo pode afetar desempenho e motivação
Segundo Gable, essa distorção pode afetar até mesmo o desempenho de atletas.
Quando o tempo parece passar mais devagar, a sensação de esforço aumenta e a pessoa pode perder o ritmo, comprometendo os resultados. Isso vale também para quem treina por saúde ou lazer.
Uma das dicas de Gable é ajustar o treino para evitar esse efeito aversivo. Exercícios que provocam medo ou desconforto extremo tendem a aumentar a percepção de tempo e, com isso, reduzir a adesão ao plano de treino.
“É importante encontrar um ritmo de exercício que seja sustentável e que não cause muita evasão — você não quer odiar seus exercícios”, afirmou Gable à Live Science.
O estudo traz evidências de que a percepção do tempo realmente muda durante o exercício. Ainda que a competição aumente o desempenho, ela não altera essa sensação.
A forma como o cérebro lida com esforço físico pode ser decisiva para a adesão ao treino, o desempenho em esportes e até para a motivação de seguir um estilo de vida mais ativo. Pesquisas futuras devem ampliar o conhecimento sobre como controlar esses efeitos.