De desertos pobres a fundos trilionários: veja como Emirados, Arábia Saudita e Noruega usaram o petróleo para evitar o colapso e garantir aposentadorias milionárias.
Imagine um país cercado por deserto, com pouca água, infraestrutura precária e economia estagnada. Um lugar onde a expectativa de vida era baixa, as oportunidades eram escassas e a maioria da população dependia da criação de animais, pesca ou agricultura de subsistência. Agora, imagine que esse mesmo país, duas décadas depois, se tornasse sinônimo de luxo, estabilidade e aposentadorias generosas financiadas por um fundo público que cresce mesmo quando os poços secam. Parece ficção? Pois essa é a história real de como o petróleo salvou nações inteiras do colapso e transformou sua riqueza subterrânea em segurança para gerações futuras. Dos Emirados Árabes Unidos à Noruega, passando pela transição silenciosa da Arábia Saudita, o que esses países têm em comum é a habilidade de transformar uma maldição geológica — o excesso de petróleo bruto — em um ativo estratégico para reinventar sua própria existência.
Emirados Árabes: de aldeias de pescadores à meca do luxo global com o mercado de petróleo
Nos anos 1960, os Emirados ainda não existiam como país unificado. Eram conhecidos como os “Estados da Trégua”, um conjunto de pequenos emirados governados por xeques locais, vivendo em sua maioria da pesca de pérolas e da navegação costeira. Dubai, por exemplo, não passava de uma vila no deserto com menos de 60 mil habitantes.
A descoberta de grandes reservas de petróleo e gás natural em Abu Dhabi, Ras Al Khaimah e Dubai mudou completamente a rota do país. Com uma visão de longo prazo, os líderes locais — especialmente o xeque Zayed bin Sultan Al Nahyan — tomaram uma decisão incomum: usar o petróleo não apenas para construir infraestrutura, mas para criar um fundo soberano que garantiria a riqueza mesmo após o fim dos poços.
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Hoje, esse fundo — o Abu Dhabi Investment Authority (ADIA) — é um dos maiores do mundo, com ativos estimados em mais de US$ 800 bilhões. Ele financia desde educação gratuita, saúde pública de ponta, aposentadorias para todos os cidadãos locais e ainda sobra para investir em empresas globais como SpaceX, Uber e imóveis em Manhattan.
Mais impressionante: menos de 30% da economia dos Emirados hoje vem do petróleo. O restante vem de turismo, tecnologia, comércio e serviços financeiros. O país conseguiu usar a riqueza do petróleo como trampolim — e não como muleta.
Arábia Saudita: da dependência extrema à transição bilionária com petróleo
Durante décadas, a Arábia Saudita foi o exemplo clássico do “Estado petroleiro”. Com cerca de 17% das reservas mundiais conhecidas, o país financiava quase tudo — de salários públicos a subsídios de energia — com dinheiro do petróleo. Quando os preços estavam altos, o reino nadava em superávits. Quando o barril caía, o déficit explodia.
A virada veio com a crise do petróleo em 2014, que expôs a fragilidade do modelo baseado apenas na exportação de petróleo bruto. Foi aí que nasceu a Visão 2030, uma ambiciosa estratégia liderada pelo príncipe herdeiro Mohammed bin Salman para diversificar a economia, criar empregos no setor privado e construir uma nova Arábia Saudita.
O projeto inclui megacidades como NEOM, que será inteiramente abastecida por energia renovável, parques industriais, fundos de capital de risco e até turismo de luxo no deserto. Tudo isso financiado por um fundo soberano, o Public Investment Fund (PIF), que já administra mais de US$ 900 bilhões em ativos — incluindo participações em clubes de futebol, empresas de inteligência artificial e startups do Vale do Silício.
Mais recentemente, o PIF começou a investir também em energia verde, mineração crítica e tecnologia militar, transformando a renda do petróleo em vetor de soberania e segurança estratégica.
Noruega: o milagre frio que ninguém esperava
Mas se há um exemplo que redefine o uso do petróleo de forma pacífica e socialmente responsável, é a Noruega. Um dos países mais igualitários do mundo, com população de cerca de 5,5 milhões de habitantes, a Noruega passou por uma transformação silenciosa após descobrir campos petrolíferos no Mar do Norte nos anos 70.
Ao contrário dos países árabes, a Noruega não tem deserto nem monarquia. O que ela tem é uma mentalidade de gestão pública exemplar. Desde o início, o país tratou o petróleo como um bem pertencente a toda a população — e não ao governo da vez. Criou leis rígidas, proibiu o uso excessivo da renda petrolífera no orçamento corrente e, em 1990, fundou o Government Pension Fund Global.
Hoje, esse fundo — que aplica em empresas como Apple, Microsoft e Coca-Cola — é o maior fundo soberano do mundo, com mais de US$ 1,6 trilhão em ativos. Ele garante aposentadorias milionárias, estabilidade econômica e imunidade contra crises globais. Mais impressionante ainda: a Noruega é líder em transição energética, usando seus lucros do petróleo para investir em energia eólica offshore, captura de carbono e transporte elétrico.
É um dos únicos países do mundo onde o petróleo financiou a superação do próprio petróleo.
O que o Brasil poderia aprender?
O Brasil também é uma potência petrolífera — com grandes reservas no pré-sal, produção recorde e forte presença da Petrobras no cenário global. Mas ainda há dúvidas se o país está seguindo o caminho de riqueza sustentável ou apenas vivendo ciclos de bonança e recessão baseados na cotação do barril.
Enquanto isso, os exemplos da Noruega, Arábia Saudita e Emirados mostram que o segredo não está no petróleo em si, mas na estratégia de longo prazo. Não se trata de extrair mais — mas de transformar essa riqueza em segurança social, independência tecnológica e fundos que protejam o país contra as marés voláteis do mercado internacional.
A criação de um fundo soberano bem gerido, blindado contra interesses políticos de curto prazo e com foco em aposentadoria, tecnologia e transição energética, poderia colocar o Brasil em outro patamar. Com o mundo migrando para novas matrizes, o tempo para agir é agora — antes que a era do petróleo acabe.