Presidente da Gerdau alerta sobre impactos da concorrência chinesa no mercado brasileiro de aço e cobra medidas urgentes do governo para proteger empregos, produção local e garantir condições iguais de competição.
O diretor-presidente da Gerdau, Gustavo Werneck, afirmou que a indústria brasileira do aço enfrenta uma “concorrência desleal da China” e cobrou do governo federal medidas de defesa comercial para restabelecer condições iguais de competição.
A declaração foi feita em entrevista nesta sexta-feira (8) ao programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal.
Segundo ele, a entrada de produtos subsidiados tem pressionado preços, ameaçado empregos e reduzido investimentos no país.
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“A gente não precisa de nenhum tipo de proteção, de benesse do governo. O que a gente tem pedido é que o governo coloque condições isonômicas para a gente poder competir”, disse Werneck.
Para o executivo, o cenário exige resposta urgente das autoridades brasileiras.
Por que a Gerdau fala em concorrência desleal da China
O executivo sustenta que a concorrência desleal da China deriva de subsídios e de um excedente global de capacidade produtiva.
Ele citou o caso do vergalhão, insumo usado na construção civil.
De acordo com Werneck, a demanda brasileira é de cerca de 4 milhões de toneladas, enquanto a China teria capacidade instalada de aproximadamente 400 milhões de toneladas.
“Apenas 1% da capacidade instalada da China seria suficiente para suprir toda a demanda brasileira”, afirmou.
Em sua visão, essa assimetria distorce preços internos e fragiliza a indústria local.
A discussão não é nova, mas ganha intensidade quando importações de aço da China aumentam a participação no mercado, pressionando margens e a utilização das usinas nacionais.
Como esse movimento afeta o emprego e o investimento produtivo?
Werneck argumenta que fábricas são obrigadas a reduzir turnos, adiar projetos e reavaliar estratégias.
Impacto no mercado brasileiro de aço
A concorrência desleal da China tem efeitos em cadeia, segundo o CEO.
Construtoras e distribuidores negociam com base em preços de referência global, enquanto a indústria local arca com custos de energia, tributos e logística do Brasil.
Nesse contexto, importações de aço da China chegariam com valores que empresas nacionais consideram incompatíveis com condições normais de mercado.
Para o consumidor final, a queda momentânea de preços pode parecer positiva.
Mas o que ocorre quando a concorrência doméstica encolhe?
Werneck alerta que, sem equilíbrios mínimos, o país tende a perder capacidade produtiva, tecnologia e empregos qualificados.
O que são os mecanismos de defesa comercial
O executivo pediu aplicação de “mecanismos legais de defesa comercial, aprovados pela OMC”.
Essas ferramentas incluem medidas antidumping (quando há venda abaixo do valor justo), direitos compensatórios (contra subsídios considerados indevidos) e salvaguardas (quando há aumento súbito de importações que causa ou ameaça causar prejuízo grave à indústria doméstica).
São instrumentos previstos nas regras multilaterais para corrigir distorções, mediante investigação técnica e prazos definidos.
Werneck declarou que, “do nosso ponto de vista, falta uma tomada de decisão. Todos os elementos estão na mesa”.
A avaliação dele é que importações de aço da China precisam ser analisadas com rigor para que, se confirmadas as distorções, as medidas adequadas sejam adotadas.
Quais providências cabem às empresas e quais cabem ao Estado?
Pelos procedimentos da OMC, cabe ao governo abrir investigações e decidir sobre eventual aplicação das medidas, após ouvir todos os lados.
Operações nos Estados Unidos e a leitura da desglobalização
Além do efeito das importações de aço da China no Brasil, Werneck abordou o ambiente internacional.
Ele afirmou que a Gerdau opera há quase 40 anos nos Estados Unidos como empresa local e que “mais de 60% do resultado da Gerdau vem de lá”.
Segundo o executivo, a companhia decidiu diversificar geografias e “não acredita mais na facilidade de exportar”, à luz do que chamou de desglobalização e de políticas industriais adotadas em grandes economias.
“A gente opera como empresa americana”, disse.
Para ele, a reindustrialização dos Estados Unidos tem favorecido operações situadas no próprio território, o que reduz incertezas comuns a fluxos de comércio internacional.
Essa estratégia, argumenta, atenua choques domésticos enquanto o Brasil debate concorrência desleal da China e respostas do poder público.
Emprego, cortes e ambiente de negócios
Werneck também comentou o corte de 1.500 empregos anunciado recentemente.
A medida, segundo ele, não se relaciona a tarifas internacionais, mas ao ambiente de negócios no Brasil.
Ele disse que a companhia mantém o compromisso com o país, ainda que com “muita cautela” diante de custos e incertezas.
“De forma alguma a gente vai deixar de investir no Brasil, mas o ambiente de negócios vem se deteriorando ao longo do tempo”, afirmou.
Essa leitura coloca a concorrência desleal da China como parte de um quadro mais amplo, que envolve custos estruturais, segurança regulatória e credibilidade das regras.
Sem previsibilidade, planos industriais sofrem revisões e cronogramas são postergados.
A consequência prática é conhecida: menos máquinas ligadas, menos encomendas e pressão adicional sobre empregos.
Relações com EUA e BRICS
Questionado sobre geopolítica e comércio, o CEO defendeu uma postura equilibrada do governo brasileiro nas relações com os Estados Unidos e com o bloco dos BRICS — acrônimo originalmente formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
“A gente não acredita que convicções políticas deveriam ser impeditivo para relações comerciais. Não dá para não ter uma relação comercial intensa com os Estados Unidos”, disse.
A fala busca separar alinhamentos políticos de decisões econômicas e realça a necessidade de previsibilidade nas regras de comércio.
Nesse tabuleiro, importações de aço da China e exigências de conteúdo local em mercados desenvolvidos compõem variáveis que a indústria brasileira precisa acompanhar de perto.
Como calibrar incentivos domésticos sem ferir compromissos internacionais?
O debate passa por produtividade, infraestrutura, energia, financiamento e, novamente, pela aplicação de mecanismos de defesa comercial quando houver base técnica.
Vínculo histórico com Pernambuco
Ao final, Werneck lembrou a presença da Gerdau em Pernambuco, onde a companhia investiu cerca de R$ 250 milhões nos últimos anos.
Segundo ele, a compra, em 1969, de um empreendimento do grupo Brennand marcou a expansão para além do Rio Grande do Sul.
“Em 1973, a gente começou a produzir pregos aqui na cidade do Recife”, recordou.
O histórico foi citado para ilustrar a visão de longo prazo da empresa no país, apesar das turbulências atuais e do choque oriundo da concorrência desleal da China.
Na sua opinião, o Brasil deve priorizar medidas de defesa comercial imediatas contra importações de aço da China ou investir primeiro em reformas para reduzir custos internos da indústria?