Ele não era um cientista da NASA nem engenheiro de uma multinacional, mas um eletrotécnico de Minas Gerais. Conheça a saga de Nélio Nicolai e sua invenção que mudou para sempre nossa relação com o telefone.
Para quem cresceu com um smartphone no bolso, é difícil imaginar. Mas houve um tempo em que atender ao telefone era um salto no escuro. Cada chamada era uma caixa-preta, uma interrupção anônima que poderia ser qualquer coisa: uma boa notícia, um parente distante, um trote ou uma cobrança indesejada. Foi preciso a genialidade e a teimosia de um brasileiro para acabar com essa incerteza.
Esta é a história da Bina, o identificador de chamadas, e de seu criador, Nélio José Nicolai. Uma saga que envolve uma sacada técnica brilhante, uma batalha de décadas contra gigantes da telefonia e uma mudança cultural que nos deu, pela primeira vez, o poder de decidir a quem daríamos nosso tempo e nossa atenção.
O mundo pré-Bina: a era da chamada anônima
Até o início dos anos 90, o telefone era uma ferramenta essencialmente reativa. Quando ele tocava, a única opção era atender para descobrir quem estava do outro lado da linha. Essa dinâmica criava uma série de inconvenientes sociais e de segurança, desde trotes insistentes até a impossibilidade de filtrar chamadas de trabalho fora do horário ou contatos indesejados. A privacidade era unilateral: quem ligava sabia para quem estava ligando, mas o contrário não era verdade.
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A sacada de um eletrotécnico: a ideia que as teles diziam ser impossível
A revolução começou na mente de Nélio Nicolai, um eletrotécnico mineiro que trabalhava na Telebrasília. Em 1977, durante seu trabalho de manutenção nas centrais telefônicas, ele teve uma percepção fundamental: para que a companhia telefônica pudesse tarifar corretamente uma ligação, a central de destino precisava receber a informação do número de origem (o número de “A”) antes mesmo de completar a chamada para o destino (o número de “B”).
A informação, portanto, já estava lá, trafegando pela rede. O desafio era como “pescar” essa informação e exibi-la para o usuário “B” antes que ele tirasse o telefone do gancho. Nicolai desenvolveu um projeto para um equipamento que faria exatamente isso. Ao apresentar a ideia para as companhias telefônicas da época, ouviu repetidamente que sua proposta era “tecnicamente inviável” – uma resposta padrão para uma inovação que poderia perturbar o modelo de negócio existente.
‘B-identifica-A’: o nascimento de um nome e de um produto
Ignorando os céticos, Nélio Nicolai continuou a desenvolver sua ideia. Ele batizou o projeto de BINA, um acrônimo simples e genial para “B Identifica Número de A”. Em 1982, depositou o primeiro pedido de patente de sua invenção. Após anos aperfeiçoando o protótipo em casa, ele finalmente encontrou uma pequena empresa de eletrônicos em Belo Horizonte, a ATEL, que topou o desafio de produzir o aparelho em escala comercial.
Lançado no mercado em 1992, o aparelho Bina foi um sucesso estrondoso e imediato. A pequena caixa de plástico, com seu visor de cristal líquido, tornou-se um objeto de desejo, um símbolo de status e, acima de tudo, de poder e controle sobre a própria privacidade.
A guerra das patentes: a luta de Davi contra as gigantes da telefonia
Com o sucesso do aparelho, as grandes operadoras de telefonia, que antes diziam ser impossível, rapidamente perceberam o potencial lucrativo da tecnologia. Elas começaram a oferecer o serviço de identificação de chamadas diretamente em seus próprios aparelhos telefônicos, sem pagar os devidos royalties a Nicolai pela patente do identificador de chamadas.
Iniciou-se então a grande batalha de sua vida. Nélio José Nicolai, o inventor, passou mais de duas décadas em uma desgastante e caríssima luta judicial contra as gigantes do setor para ter seu direito como criador reconhecido. Ele ganhou diversas ações, mas a execução das sentenças e o recebimento dos valores foram processos complexos e demorados, que consumiram sua saúde e seus recursos.
O legado da Bina: como uma pequena caixa mudou a cultura do telefone
Nélio Nicolai faleceu em 2017, mas seu legado é imenso e indiscutível. A Bina não apenas nos deu a conveniência de saber quem está ligando; ela mudou fundamentalmente a etiqueta social e a dinâmica de poder da comunicação por voz. Ela nos deu o direito de não atender, de filtrar, de nos preparar para uma conversa.
A função de identificar chamadas, que ele imaginou e pela qual lutou, hoje é tão básica e onipresente em qualquer smartphone que as novas gerações nem imaginam que um dia ela não existiu. Foi a invenção de um brasileiro persistente que, de sua casa, deu ao mundo inteiro o simples, mas revolucionário, poder de escolha.
Você se lembra da chegada da Bina na sua casa? Qual foi a primeira reação ao ver o número de quem ligava antes de atender? Compartilhe sua memória nostálgica!