A maior crise migratória da América Latina no século XXI: Venezuelanos decidiram reconstruir a vida fora
A Venezuela vive, desde 2014, a maior crise migratória da América Latina no século XXI. Estima-se que mais de 8 milhões de pessoas tenham deixado o país em busca de sobrevivência e oportunidades. Esse êxodo supera, em números absolutos, países em guerra como Síria e Ucrânia.
A crise tem origem na combinação da queda do petróleo, má gestão econômica e instabilidade política. O resultado foi um colapso social: inflação em níveis históricos, escassez de alimentos e medicamentos, e um salário mínimo que hoje não passa de alguns dólares por mês. Pesquisas indicam que 60% da população venezuelana ainda deseja emigrar.
Para onde vão os venezuelanos?
O destino principal dos venezuelanos é a própria América do Sul. A Colômbia abriga cerca de 2,8 milhões de refugiados, o Peru já recebeu 1,7 milhão e o Brasil conta com mais de 626 mil venezuelanos integrados em diferentes regiões.
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Esses três países concentram a maior parte da saída por fatores combinados: fronteiras terrestres acessíveis, políticas de acolhimento mais abertas e economias relativamente grandes, capazes de absorver mão de obra migrante.
No entanto, o mesmo não se aplica às Guianas, apesar da proximidade geográfica. Apenas 71 mil venezuelanos estão na região, sendo 29 mil na Guiana e 42 mil no Suriname. Já na Guiana Francesa, território ultramarino da França, não há estatística oficial, mas estimativas falam em cerca de 30 mil pessoas.
Geografia e fronteiras: uma barreira natural
Se no mapa as Guianas parecem próximas, na prática estão muito longe. A fronteira entre Venezuela e Guiana, por exemplo, possui 743 km de extensão cobertos integralmente pela floresta amazônica, sem estradas transitáveis.
O único acesso por terra passa pelo estado de Roraima, no Brasil. Isso significa que o venezuelano que pretende chegar às Guianas precisa percorrer rotas muito mais caras e complexas — avião, navio ou caminhos fluviais. Para quem emigra com pouquíssimos recursos, essa opção torna-se inviável.
Barreiras políticas e falta de estrutura de acolhimento
Além da geografia, existem barreiras legais. A Guiana exige visto e documentação regular, o que já reduz o fluxo. O Suriname adota exigências semelhantes. No caso da Guiana Francesa, como parte da União Europeia, a entrada é ainda mais restrita, seguindo as mesmas regras impostas a quem deseja imigrar para a França.
Outro obstáculo é a baixa capacidade institucional de acolhimento. Diferente da Colômbia, que criou o Estatuto de Proteção Temporário para regularizar milhões, ou do Peru, que implementou o Permisso Temporal de Permanência, as Guianas não possuem programas robustos de integração. Isso faz diferença para refugiados que chegam com pouco ou nenhum recurso e precisam de apoio imediato para se estabelecer.
Economia e oportunidades: o peso do mercado de trabalho
Os venezuelanos também buscam países que ofereçam um mínimo de estabilidade econômica. O Brasil, maior economia da América Latina, tem mercado diversificado e uma Lei de Refúgio e Imigração considerada acolhedora. A Colômbia e o Peru, com populações maiores e economias mais abertas, também oferecem possibilidades de emprego.
Já as Guianas possuem populações pequenas — nenhuma passa de 1 milhão de habitantes — e mercados de trabalho muito limitados. Isso reduz a atratividade para quem precisa reconstruir a vida rapidamente.
A barreira cultural
Outro fator muitas vezes ignorado é a diferença cultural. A maior parte da América do Sul compartilha raízes ibero-americanas, com idioma espanhol ou português e tradição católica. Isso facilita a integração dos venezuelanos em países vizinhos.
As Guianas, porém, são exceção. A Guiana tem inglês como língua oficial, fruto do passado colonial britânico. O Suriname fala holandês, além de dialetos locais como o sranantongo. Já a Guiana Francesa mantém o francês como idioma e segue o sistema europeu. A diversidade cultural é grande, com forte presença de descendentes de africanos, indianos e javaneses.
Para quem sai de um país hispânico e chega sem rede de apoio, essa barreira linguística e cultural amplia o isolamento.
Um contraste que explica a escolha dos destinos
Na prática, os venezuelanos optam por caminhos que ofereçam idioma familiar, políticas de acolhimento claras e economias com mais oportunidades. Por isso, mesmo caminhando milhares de quilômetros, preferem ir para Colômbia, Peru ou Brasil em vez de cruzar fronteiras geograficamente mais próximas, mas politicamente e culturalmente mais distantes.
No Brasil, desde 2018, o governo brasileiro mantém a Operação Acolhida, em Roraima, para registrar, vacinar e interiorizar venezuelanos para outras cidades do país. Essa política reforça a imagem do Brasil como destino de esperança e viabilidade.
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