Sob uma montanha no Japão, o Super-Kamiokande, o maior detector de neutrinos do mundo, guarda milhões de litros de água tão pura que se torna corrosiva e revela segredos dos neutrinos e do cosmos.
Sob a montanha de Kamioka, na província de Gifu, Japão, existe uma das câmaras científicas mais impressionantes já construídas pelo ser humano. De fora, parece apenas uma antiga mina abandonada, mas a mil metros de profundidade se revela um espaço monumental que mais parece saído de uma ficção científica: um gigantesco cilindro dourado, iluminado por milhares de tubos fotomultiplicadores, guardando uma água tão pura que chega a ser corrosiva, capaz de danificar metais expostos por longos períodos.
É o Super-Kamiokande, o mais famoso detector de neutrinos do planeta e uma verdadeira “janela” para os segredos mais profundos do universo.
A água que corrói por ser pura está no maior detector de neutrinos do mundo
A primeira impressão causa espanto: como a água pode ser corrosiva? Não se trata de acidez, mas da ausência quase total de sais minerais e impurezas.
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O processo de purificação no Super-Kamiokande é tão extremo que a água fica quimicamente instável, “buscando” dissolver qualquer íon disponível. Essa característica significa que metais, concreto e até superfícies plásticas sofrem desgaste acelerado se mantidos em contato direto.
Essa pureza é essencial para que não haja interferência nos raríssimos sinais de neutrinos que atravessam o detector, vindo do Sol, da atmosfera ou até de explosões estelares a milhões de anos-luz de distância.
O funcionamento do Super-Kamiokande – maior detector de neutrinos do mundo
O observatório é um cilindro de 40 metros de altura por 40 metros de diâmetro, preenchido com 50 mil toneladas de água ultrapura.
Ao redor, mais de 11 mil tubos fotomultiplicadores — enormes sensores circulares que lembram olhos dourados — ficam atentos a cada clarão produzido dentro do tanque. Esse clarão não é visível a olho nu, mas é registrado como um flash de radiação Cherenkov, que ocorre quando uma partícula carregada gerada por um neutrino se move mais rápido do que a luz consegue se propagar dentro da água.
Neutrinos são partículas quase fantasmagóricas, atravessando montanhas, planetas e até nossos corpos sem deixar rastros na maior parte do tempo.
Por isso, a única maneira de detectá-los é justamente criar um ambiente gigantesco e protegido, onde raríssimos sinais possam ser distinguidos do “ruído” das demais partículas.
A profundidade de 1.000 metros na mina serve exatamente para filtrar a chuva de raios cósmicos que atinge a superfície terrestre, permitindo que apenas os eventos mais sutis cheguem até a câmara dourada.
A descoberta que rendeu um Nobel
Foi graças ao Super-Kamiokande que a física de partículas deu um dos maiores saltos do século XX. Em 1998, análises feitas no detector revelaram que os neutrinos mudam de identidade ao viajar pelo espaço — fenômeno chamado de oscilação de neutrinos.
Essa descoberta significou que eles possuem massa, ainda que minúscula, contrariando previsões anteriores.
O feito foi tão impactante que garantiu ao físico japonês Takaaki Kajita o Prêmio Nobel de Física em 2015.
A revelação abriu novas linhas de pesquisa fundamentais: entender como a matéria se comporta no universo primordial, explicar por que o cosmos contém mais matéria do que antimatéria e até investigar se os neutrinos guardam pistas sobre dimensões além do Modelo Padrão da Física.
O futuro: Hyper-Kamiokande
Se o Super-Kamiokande já impressiona, o Japão prepara um projeto ainda mais monumental: o Hyper-Kamiokande, previsto para iniciar operações em 2027.
Será cinco vezes maior, com 260 mil toneladas de água ultrapura e mais de 40 mil sensores de luz, tornando-se o maior detector de neutrinos do mundo.
O Hyper-Kamiokande buscará respostas para perguntas ainda mais profundas: será que os neutrinos podem explicar a assimetria entre matéria e antimatéria? Poderá detectar neutrinos vindos de supernovas distantes, oferecendo informações em tempo real sobre o nascimento de buracos negros? E, quem sabe, ajudar a montar o quebra-cabeça sobre a própria origem do universo.
Entre ciência e maravilha
No coração das montanhas japonesas, essa “caverna dourada” não guarda tesouros de ouro ou pedras preciosas, mas algo infinitamente mais valioso: dados que podem revelar a estrutura invisível do cosmos.
Cada clarão captado nos sensores é um sussurro vindo das estrelas, um fragmento de história cósmica atravessando a Terra silenciosamente.
Enquanto o Hyper-Kamiokande avança, o legado do Super-Kamiokande permanece como símbolo da engenhosidade humana: transformar a água mais pura do planeta em um portal para os mistérios do universo.