Nestlé Brasil encara alta de custos com café e cacau, aposta em inovação, tradição e escala para sustentar crescimento e competitividade no país
A Nestlé construiu ao longo de mais de um século uma presença marcante no Brasil. Hoje, a operação local é a terceira maior do grupo no mundo, atrás apenas de Estados Unidos e China. Esse peso, porém, vem acompanhado de desafios que estão cada vez mais evidentes.
Inflação de insumos pressiona a operação
Segundo Marcelo Melchior, CEO da Nestlé Brasil, a empresa enfrenta uma das maiores pressões de custos já registradas.
A disparada nos preços de matérias-primas, principalmente cacau e café, mudou a lógica da operação.
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“Tivemos uma inflação muito elevada. Nunca tínhamos visto uma inflação assim ”, afirmou o executivo em entrevista ao podcast da EXAME.
O cenário recente mostra que, mesmo com crescimento de receita em dois dígitos no último ano, a companhia conviveu com queda de volume em 2024.
Para uma indústria desenhada para alta escala, a perda de volume representa um risco enorme. Isso porque as fábricas ficam ineficientes, os custos unitários aumentam e a competitividade diminui.
O peso de cacau e café
Boa parte da pressão vem do mercado internacional. No caso do cacau, cerca de 70% do insumo usado no Brasil é local, mas ainda há 30% importado da África Ocidental, região marcada por instabilidades climáticas.
Já o café utilizado pela Nestlé é totalmente certificado e adquirido no país. A empresa trabalha dentro do programa Coffee Plan, que garante rastreabilidade e qualidade.
Mesmo assim, problemas climáticos, como secas e queimadas, resultaram em grãos menores e menos valorizados, impactando toda a cadeia.
Responsabilidade diária com o consumidor
A força da Nestlé no Brasil está ligada ao consumo cotidiano. Produtos de tíquete baixo, como biscoitos, achocolatados e leite condensado, estão presentes em 99% dos lares.
Essa recorrência impõe uma responsabilidade grande. Um erro na qualidade, na disponibilidade ou no preço pode significar a perda imediata de um consumidor. “Se eu falhar hoje, amanhã você já não compra mais”, destacou Melchior.
Por isso, a companhia busca consistência. O compromisso é manter o padrão do produto, o abastecimento das gôndolas e a competitividade dos preços.
Exportações: impacto pequeno, foco no Brasil
Apesar da relevância mundial, a operação brasileira mantém foco quase exclusivo no mercado interno. Menos de 10% do faturamento vem de exportações.
Assim, medidas externas, como barreiras impostas por outros países, têm efeito reduzido.
“O desenho industrial é feito para atender o consumidor brasileiro”, explicou o presidente.
Inovação sem perder os clássicos
Um ponto central da estratégia é equilibrar tradição e modernidade. Segundo Melchior, os produtos icônicos — como Leite Moça, Ninho e os chocolates — precisam ser mantidos vivos e rentáveis. Só assim a empresa cria base sólida para investir em novidades.
Nos últimos anos, a Nestlé aplicou mudanças graduais, como redução de açúcar e sódio, inclusão de vitaminas e uso de embalagens sustentáveis. Tudo isso sem alterar a essência do sabor.
Antes de chegar ao mercado, cada lançamento passa pelo chamado teste 60-40. Isso significa que, em degustações às cegas, ao menos 60% dos consumidores devem preferir o produto da Nestlé em relação ao da concorrência.
As aquisições também fazem parte da estratégia, mas não são tratadas como o motor principal. Negócios como Garoto (2016), Pura Vida (2021) e Grupo CRM (2023), dono das marcas Kopenhagen e Brasil Cacau, foram movimentos que aceleraram a presença em categorias estratégicas.
“A compra pode ser um acelerador, mas não é a estratégia”, reforçou o CEO.
Resultados globais da Nestlé e perspectivas
Em fevereiro de 2025, a Nestlé global anunciou crescimento de vendas acima das previsões. O avanço em volume, de 0,7% para 0,8% em 2024, foi sustentado por aumentos de preços em insumos como café e cacau. A margem de lucro, no entanto, ficou mais estreita.
Segundo o CEO global, Laurent Freixe, essa redução é temporária, já que o grupo investe pesado em crescimento.
No Brasil, Melchior projeta um novo ciclo positivo. Apesar da inflação elevada dos insumos, a expectativa é de manter crescimento em dois dígitos neste ano.
O que explica a inflação recorde
As commodities agrícolas vivem um momento de instabilidade. No caso do café, o fenômeno El Niño reduziu colheitas de robusta no Vietnã e na Indonésia.
Somado a isso, o clima adverso no Brasil comprometeu a florada e reduziu a qualidade dos grãos.
Já o cacau enfrenta limitações mais profundas. Grande parte da produção está concentrada na Costa do Marfim e em outros países da África Ocidental.
Além disso, a cultura do cacau não possui sementes tão adaptáveis como outras lavouras, o que a torna mais vulnerável.
Para o pesquisador Felippe Serigati, do FGV Agro, essa combinação de oferta frágil e demanda crescente torna a commodity ainda mais sujeita a choques.
Enquanto isso, o leite vive uma fase de recuperação, favorecida pela queda nos preços do milho, principal insumo da ração.
Equilíbrio desafiador
O retrato atual mostra um agronegócio em busca de equilíbrio. Para a Nestlé, os próximos passos envolvem manter escala, investir em produtividade e reforçar a confiança do consumidor.
O desafio é diário. Mas, com presença em quase todos os lares do país, a companhia se apoia em sua força histórica e aposta em inovação para seguir relevante, mesmo em um cenário de custos tão imprevisível.
Com informações de Exame.