STJ muda tudo e decide que prêmio da loteria pode ser dividido mesmo em separação de bens. A decisão garante à viúva direito sobre parte do valor e abre novo caminho para casos de herança no Brasil
Um caso recente analisado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) reacendeu um debate antigo entre juristas e herdeiros: afinal, um prêmio de loteria recebido por um dos cônjuges durante o casamento pode ser dividido com o outro, mesmo quando o regime é de separação obrigatória de bens?
A decisão inédita da Corte Superior respondeu sim — e abre um precedente que pode alterar a forma como futuras heranças e partilhas são conduzidas no país.
O julgamento envolveu o espólio de um homem que, ainda em vida, havia ganhado uma quantia milionária na loteria.
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O prêmio foi recebido durante o casamento celebrado sob o regime de separação obrigatória, previsto no Código Civil para determinadas situações, como uniões com pessoas acima de 70 anos ou casamentos com pacto antenupcial específico.
Após a morte do ganhador, iniciou-se a disputa judicial entre a viúva e os herdeiros diretos do falecido, que reivindicavam a totalidade do valor.
A decisão que muda a jurisprudência
O STJ entendeu que o prêmio de loteria, embora adquirido individualmente, é considerado fruto do esforço comum e do convívio familiar, o que justifica a inclusão do valor na herança e a divisão proporcional entre os herdeiros e o cônjuge sobrevivente.
Segundo os ministros, a lógica da separação obrigatória não deve ser interpretada de forma absoluta, já que o objetivo da norma é proteger o patrimônio das partes — e não eliminar completamente a comunhão de ganhos eventuais.
Na prática, o tribunal consolidou o entendimento de que a separação de bens não impede o direito à meação de valores provenientes de sorteios ou prêmios recebidos durante a convivência, quando houver prova de que o casal mantinha vida conjugal estável e contribuía mutuamente para a manutenção da família.
O voto vencedor destacou ainda que o regime jurídico precisa ser interpretado à luz da realidade social contemporânea, em que muitos casamentos em separação obrigatória não significam ausência de compartilhamento de vida ou de interesses econômicos.
A decisão foi unânime na Quarta Turma do STJ e servirá como referência para casos semelhantes em todo o território nacional.
Impactos práticos e reflexos no direito de família
A decisão repercute diretamente sobre milhares de processos de sucessão e herança em andamento no Brasil. Casos envolvendo prêmios de loteria, indenizações, ganhos extraordinários e investimentos de alto valor agora terão de considerar a nova interpretação adotada pelo STJ.
Advogados especializados em direito de família avaliam que o entendimento representa um avanço na humanização das partilhas, já que reconhece o esforço e o vínculo afetivo como elementos de relevância patrimonial.
Em muitos casamentos longos, o cônjuge sobrevivente participava ativamente da vida financeira e doméstica, ainda que formalmente não possuísse direito sobre os bens.
Por outro lado, especialistas alertam para a necessidade de atualização dos contratos de casamento e pactos antenupciais, especialmente em uniões de pessoas com idade avançada ou com patrimônios significativos.
O novo entendimento pode gerar insegurança em famílias que acreditavam estar totalmente protegidas pelo regime de separação obrigatória.
Além do aspecto jurídico, a decisão também reacende discussões sobre a função social do casamento e da herança, questionando até que ponto a lei deve reconhecer o afeto e a convivência como fatores legítimos de partilha. Para os ministros do STJ, a resposta é clara: o casamento, mesmo com separação de bens, cria um laço que vai além dos papéis e contratos.
O que muda daqui para frente
A partir deste julgamento, os tribunais de todo o país deverão seguir a orientação do STJ, aplicando o mesmo raciocínio em casos semelhantes.
Isso significa que prêmios de loteria, indenizações ou outros ganhos extraordinários obtidos durante o casamento poderão ser divididos entre o cônjuge e os herdeiros, mesmo quando o regime for de separação obrigatória.
A decisão não altera a lei, mas fixa uma interpretação vinculante para os tribunais inferiores, servindo como parâmetro nas futuras decisões sobre o tema.
Na prática, quem se casar sob separação obrigatória e receber prêmios de alto valor durante o relacionamento poderá ver parte desse dinheiro incluído na herança ou partilhado com o companheiro.
Para os advogados, o caso também serve como alerta para a importância de formalizar intenções patrimoniais de forma clara, seja por meio de testamentos, pactos antenupciais detalhados ou registros complementares.
O STJ reforçou que, mesmo diante de um regime de separação, o contexto da convivência e o princípio da solidariedade conjugal devem prevalecer.