PMEs brasileiras acessam operações em yuan em 2025 via fintechs e bancos chineses; avanço reduz custos cambiais, mas amplia dependência de Pequim.
Até 2020, negociar com a China era um desafio quase intransponível para pequenas e médias empresas brasileiras. Além da barreira da língua e da distância, havia o peso do dólar como moeda obrigatória em qualquer contrato. Isso significava enfrentar spreads altos, taxas bancárias elevadas e oscilações cambiais que, em muitos casos, inviabilizavam negócios menores. Mas em 2025, esse cenário começou a mudar radicalmente. PMEs – Pequenas e médias empresas brasileiras já podem acessar operações diretas em yuan, a moeda chinesa, sem depender da triangulação pelo dólar.
A novidade foi possível graças a dois vetores: o avanço de fintechs de câmbio digital no Brasil e a expansão da atuação de bancos chineses como o ICBC e o Bank of China em território nacional.
Essa mudança representa um salto histórico: o yuan deixou de ser moeda exclusiva para contratos bilionários do agronegócio e da mineração e passou a fazer parte do cotidiano de empresas menores, que movimentam importações e exportações de menor escala.
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Como essa mudança foi construída
O caminho até aqui foi gradual:
- 2023: o Brasil inaugurou o sistema de clearing em yuan, com operações mediadas pelo Industrial and Commercial Bank of China (ICBC). Isso abriu a porta para liquidações BRL–CNY diretas.
- 2024: fintechs como Ebury e bancos digitais locais começaram a oferecer câmbio BRL–CNY para médias empresas, especialmente importadores de eletrônicos, maquinário e insumos agrícolas.
- 2025: o serviço chegou às PMEs. Hoje, pequenas indústrias, cooperativas agrícolas e até e-commerces já podem fechar contratos em yuan, tanto para importar quanto para exportar.
Essa democratização coloca o Brasil entre os primeiros países da América Latina a permitir que empresas de qualquer porte tenham acesso ao yuan como instrumento de comércio internacional.
O impacto financeiro para as PMEs
O benefício é imediato. Uma PME que importa US$ 500 mil em peças industriais da China poderia perder até 5% do valor total apenas em custos cambiais ao passar pelo dólar. Isso equivale a R$ 130 mil em uma única operação.
Com a liquidação direta em yuan, esse custo cai para menos da metade. Além disso, a previsibilidade aumenta: como o Brasil já possui swap cambial de R$ 157 bilhões com a China, há liquidez garantida para cobrir operações em RMB.
Exportadores também ganham. Um produtor de café especial ou de mel de nicho, que envia pequenos lotes para o mercado chinês, agora pode receber em yuan sem precisar abrir conta em dólar no exterior. O resultado é mais competitividade e margens mais altas.
Fintechs e bancos: os novos intermediários
O papel das fintechs é central. Plataformas digitais oferecem contas multi-moeda, integração com marketplaces chineses e conversões instantâneas BRL–CNY. Isso permite que até pequenas lojas virtuais brasileiras vendam em yuan diretamente para consumidores chineses.
Ao mesmo tempo, bancos chineses ampliam sua presença em São Paulo, Rio e Brasília. O ICBC e o Bank of China oferecem crédito em yuan para importadores, além de operações de trade finance em moeda chinesa.
Pequim vê isso não apenas como negócio, mas como estratégia de longo prazo para consolidar o yuan como moeda de referência no comércio internacional.
O agro e as cooperativas
O setor agroindustrial também sente os efeitos. Cooperativas de milho, soja e café de médio porte já testam contratos em yuan com compradores chineses.
Antes, esses produtores eram reféns de tradings globais que intermediam as vendas em dólar. Agora, conseguem negociar diretamente com clientes chineses, reduzindo custos e ganhando protagonismo.
Isso significa que até mesmo o interior do Brasil passa a ser impactado pela ascensão do yuan. Municípios do Mato Grosso, Minas Gerais e Paraná já registram operações diretas em moeda chinesa, especialmente no café e no milho.
O alerta de Washington
O avanço do yuan nas PMEs pode parecer irrelevante em termos globais — afinal, os valores são menores que os contratos de minério ou petróleo. Mas em Washington o alerta já foi soado.
O risco não está no tamanho de cada operação, e sim no efeito cumulativo. Se milhões de pequenas empresas em países emergentes começarem a negociar em yuan, isso representa bilhões de dólares a menos circulando pelo sistema financeiro americano. É uma erosão lenta, mas potencialmente irreversível da hegemonia do dólar.
Os riscos da nova dependência
Apesar dos ganhos, há armadilhas. O yuan ainda não é totalmente conversível e seu uso depende de autorizações do Banco Popular da China. Isso significa que, em cenários de crise, Pequim pode restringir o fluxo de sua moeda.
Para as PMEs brasileiras, esse risco parece distante, mas não deve ser ignorado. Ao trocar o dólar pelo yuan, o Brasil pode estar apenas substituindo uma dependência por outra, menos transparente e mais sujeita a decisões políticas.
O papel do BRICS
Esse movimento também se conecta à agenda dos BRICS. Em 2025, o bloco ampliado discute a criação do BRICS Pay, uma plataforma de pagamentos multilocal. O yuan é o candidato natural a liderar esse sistema, mas o Brasil e a África do Sul defendem o modelo multimoedas.
De qualquer forma, o fato de pequenas empresas brasileiras já operarem em yuan mostra que a integração financeira do bloco não está restrita a grandes contratos, mas atinge a base produtiva da economia.
O futuro do comércio exterior
Se a tendência continuar, especialistas acreditam que até 2030 mais de 60% das operações Brasil–China poderão ser liquidadas em yuan, incluindo contratos de pequenas empresas. Isso mudaria a lógica do comércio exterior brasileiro e poderia tornar o país o primeiro grande exportador agrícola e industrial do Ocidente a adotar a moeda chinesa em larga escala.
O desafio será equilibrar benefícios e riscos, garantindo que o yuan seja uma alternativa vantajosa sem se transformar em nova armadilha de dependência.
Em 2025, as PMEs brasileiras finalmente conquistaram acesso ao yuan. É uma vitória para os negócios locais, que agora conseguem competir em pé de igualdade no comércio com a China. Mas também é um alerta: cada contrato em yuan é um tijolo a menos no edifício da hegemonia do dólar — e um tijolo a mais na influência financeira de Pequim.
A questão é se o Brasil usará essa ferramenta para conquistar autonomia estratégica ou se acabará refém da moeda de seu maior cliente.