Empresa dinamarquesa atribui decisão a custos elevados, problemas logísticos e retração no ambiente de negócios para energia renovável.
A empresa dinamarquesa Orsted, uma das líderes globais em energia eólica offshore, anunciou nesta quarta-feira que não seguirá adiante com o projeto Hornsea 4, considerado um dos maiores empreendimentos do setor no Reino Unido. A decisão marca um momento delicado para o mercado de energia renovável, pressionado por custos crescentes e incertezas econômicas.
Segundo informações divulgadas pela agência Reuters, o cancelamento se deve à combinação de fatores como aumento dos preços na cadeia de suprimentos, elevação das taxas de juros e maior risco de execução. Esses elementos, segundo a própria Orsted, comprometeram o potencial de retorno financeiro esperado para o projeto.
Um revés bilionário para a Orsted
O Hornsea 4 ainda não havia atingido sua decisão final de investimento, mas sua suspensão poderá gerar perdas de até 5,5 bilhões de coroas dinamarquesas (cerca de US$ 837 milhões) em taxas de rescisão e baixas contábeis para a companhia.
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Em comunicado oficial, o CEO Rasmus Errboe afirmou que a medida visa proteger os ativos da empresa. “Acreditamos que a decisão era necessária para garantir que só apresentemos ativos que, confiamos, trarão o valor que desejamos”, declarou.
Errboe assumiu o comando da empresa em janeiro de 2025 com a missão de reestruturar a Orsted e recuperar a confiança dos investidores, em meio à forte desvalorização de mercado enfrentada pela companhia nos últimos anos.
Queda de valor de mercado e ambiente global adverso
Desde seu pico em 2021, a Orsted já perdeu cerca de 80% do seu valor de mercado, refletindo a deterioração do cenário global para projetos de energia eólica offshore. A retração não atinge apenas a empresa dinamarquesa, mas um setor inteiro que enfrenta pressões inflacionárias, logística afetada e mudanças políticas, principalmente nos Estados Unidos.
Nos últimos meses, as ações da Orsted sofreram novas quedas após declarações do presidente dos EUA, Donald Trump, conhecido por sua oposição à energia eólica e preferência por combustíveis fósseis. Embora os projetos nos Estados Unidos continuem em andamento, a empresa relatou perdas contábeis relacionadas a tarifas sobre aço e alumínio — insumos essenciais para as turbinas — que afetaram diretamente seus custos.
Governo britânico ainda espera retomada
O Hornsea 4 estava planejado para ser instalado na costa de Yorkshire, no norte do Reino Unido, com capacidade de gerar 2,4 gigawatts. O projeto havia vencido um leilão de energia renovável promovido pelo governo britânico no ano anterior.
Apesar da suspensão, o Departamento de Segurança Energética e Net Zero do Reino Unido expressou confiança em uma eventual retomada. “Reconhecemos o impacto da alta inflação global e das restrições na cadeia de suprimentos, e trabalharemos com a Orsted para colocar o Hornsea 4 de volta nos trilhos”, afirmou um porta-voz do governo.
Mercado de energia eólica offshore sob pressão
O caso da Orsted revela uma realidade mais ampla enfrentada pelo setor de energia eólica offshore: a dificuldade de manter a viabilidade econômica de grandes projetos diante de um ambiente global incerto. Com taxas de juros elevadas, instabilidade política e custo logístico acima do previsto, o modelo financeiro tradicional desses empreendimentos vem sendo revisto por diversas empresas do setor.
Mesmo com contratos assinados e apoio governamental, as margens de rentabilidade estão mais apertadas, levando à reavaliação de investimentos e à postergação de projetos que antes pareciam viáveis.
Resultados financeiros e perspectiva da Orsted
Apesar dos desafios, a Orsted divulgou um resultado financeiro considerado positivo no primeiro trimestre de 2025. A empresa registrou um lucro operacional (EBITDA) de 8,6 bilhões de coroas dinamarquesas, acima das expectativas dos analistas, que estimavam 7,88 bilhões.
O número, no entanto, exclui os efeitos do cancelamento do Hornsea 4, o que pode mudar o cenário nos próximos balanços. A companhia manteve sua projeção para 2025, mas sem considerar os custos extraordinários relacionados à interrupção do projeto.
A empresa confirmou que dois projetos nos Estados Unidos continuarão conforme o cronograma, apesar das perdas contábeis provocadas pelas tarifas impostas a materiais importados.
Reino Unido segue apostando em energia renovável
O Reino Unido é o maior mercado de energia eólica offshore fora da China e tem mantido seu compromisso com a descarbonização da matriz energética. O país aposta em fontes renováveis como pilar da sua estratégia para reduzir emissões e atingir metas climáticas.
A suspensão do Hornsea 4 é considerada um revés, mas o governo britânico ainda trabalha para manter a confiança dos investidores e fortalecer a estrutura regulatória do setor. A região costeira de Yorkshire, onde o projeto estava previsto, continua sendo considerada estratégica para futuras iniciativas.
Disciplina sob nova gestão
Analistas de mercado veem a decisão da Orsted como um sinal de mudança de postura sob a gestão de Rasmus Errboe. Segundo nota da consultoria Bernstein, o cancelamento é uma “surpresa”, mas demonstra maior disciplina e seletividade nos investimentos da empresa.
Com a reputação abalada e a necessidade de reconquistar o mercado, a Orsted busca demonstrar que está focada em projetos sustentáveis, no sentido financeiro e operacional, mesmo que isso implique abrir mão de empreendimentos considerados promissores.