Em cúpula virtual, Xi Jinping apresentou três propostas para orientar o Brics, destacando multilateralismo, abertura econômica e solidariedade, em meio a críticas indiretas ao papel dos Estados Unidos e menções ao dólar como ponto central das discussões.
A China apresentou nesta segunda-feira (08) um roteiro em três frentes para orientar o Brics nos próximos anos. A informação é do portal Poder 360.
De acordo com o site, na cúpula virtual presidida por Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente Xi Jinping defendeu reforçar o multilateralismo, preservar a abertura econômica e consolidar a solidariedade do bloco.
O pronunciamento incluiu menção ao dólar e colocou sob escrutínio o papel dos Estados Unidos, em contraste com a visão associada a Donald Trump.
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Participaram também os líderes de Rússia e África do Sul, Vladimir Putin e Cyril Ramaphosa.
Xi Jinping e o foco no multilateralismo
Logo no início de sua participação, Xi enquadrou a agenda como resposta a um ambiente de incertezas.
Sem ceder a alusões diretas, atacou conceitos como hegemonismo, unilateralismo e protecionismo — termos recorrentes no léxico chinês quando o assunto é governança global.
“O multilateralismo é a aspiração compartilhada dos povos e a tendência predominante de nosso tempo”, afirmou, ao defender que o Brics atue de forma coordenada em fóruns internacionais e busque regras mais equilibradas.
Ao longo do discurso, o presidente organizou as prioridades em três eixos. Primeiro, sustentar um multilateralismo efetivo, com países em desenvolvimento ganhando voz na arquitetura global.
Essa diretriz confronta práticas unilaterais e busca ampliar a participação do Sul Global em instâncias de decisão.
Em seguida, insistiu na abertura e na cooperação de benefício mútuo para proteger a ordem econômica e comercial internacionais, que, segundo ele, deve permanecer previsível e inclusiva.
Por fim, defendeu preservar a solidariedade entre os integrantes do Brics como caminho para o desenvolvimento comum, com ênfase em projetos compartilhados, transferência tecnológica e agendas sociais.
O dólar e o recado aos Estados Unidos
A menção ao dólar apareceu como parte do argumento por um ambiente financeiro menos vulnerável a choques e sanções.
Ao colocar a moeda norte-americana no centro do debate, Xi sinalizou a intenção de reduzir assimetrias e ampliar instrumentos de liquidação que não dependam exclusivamente do sistema ancorado nos EUA.
O ponto dialoga com tentativas recentes do bloco de incentivar pagamentos em moedas locais e reforçar bancos de desenvolvimento como alternativas complementares, ainda que sem ruptura com o sistema vigente.
Esse enquadramento também serve de recado ao papel de Washington.
Ao criticar unilateralismo e protecionismo, o líder chinês confronta ideias que ganharam força na política externa dos Estados Unidos, sobretudo durante a gestão Trump.
Na prática, a defesa de regras multilaterais e de mercados abertos funciona como contraponto à lógica de tarifas, sanções e acordos assimétricos.
A ênfase na palavra “cooperação” tornou-se, assim, uma forma de delimitar diferenças de abordagem sem transformar a cúpula em arena de acusações diretas.
Lula e o papel do Brasil na cúpula
O formato do encontro reforçou o tom pragmático. Conduzida de maneira remota e sob a presidência de Lula, a sessão reuniu chefes de Estado para pactuar princípios e coordenar posições em temas sensíveis.
O Brasil operou como moderador de agendas, buscando preservar a coesão e manter o foco em resultados concretos.
A presença de Putin e Ramaphosa deu peso geopolítico às mensagens e confirmou a disposição do bloco de falar de forma articulada em debates que atravessam comércio, finanças e segurança internacional.
Cooperação econômica e abertura de mercados
No campo econômico, a segunda diretriz — manter a abertura e a cooperação de benefício mútuo — apareceu como antídoto a barreiras comerciais e disputas tecnológicas.
Xi associou previsibilidade regulatória a crescimento e apontou a necessidade de cadeias de suprimentos mais resilientes.
A leitura implícita é que países do Brics podem amortecer choques por meio de integração produtiva, investimentos cruzados e coordenação regulatória, preservando competitividade sem recair em práticas de fechamento.
Solidariedade e desenvolvimento comum
A terceira frente, voltada à solidariedade e ao desenvolvimento comum, destacou iniciativas com potencial de impacto social direto.
Em vez de apenas declarações de princípio, a ênfase recaiu sobre cooperação em infraestrutura, digitalização e transição energética, áreas em que o compartilhamento de tecnologias e financiamento pode acelerar entregas.
O discurso reafirmou que divergências internas não impedem a busca por ganhos coletivos, desde que o planejamento se ancore em metas verificáveis.
Conflitos internacionais em pauta
Os desdobramentos diplomáticos também estiveram na pauta. Os países do Brics afirmaram que pretendem manter canais de comunicação sobre conflitos em curso, incluindo a guerra entre Rússia e Ucrânia e a crise em Gaza decorrente da operação militar israelense.
Para o caso ucraniano, os líderes defenderam o uso do Grupo de Amigos pela Paz, coalizão de países do Sul Global dedicada a intermediar entendimentos e promover medidas de confiança.
Na questão palestina, reiteraram a defesa da solução de dois Estados, diretriz que aparece de forma recorrente em posicionamentos multilaterais e que, na visão do bloco, continua sendo a base para uma paz sustentável.
Governança global e futuro do Brics
A referência à governança global não ficou restrita à diplomacia. Ao falar de multilateralismo, Xi indicou a necessidade de atualização de instituições internacionais para refletir o peso econômico e demográfico emergente.
O argumento se apoia na ideia de que fóruns decisórios precisam acolher prioridades do Sul Global — da reforma de cotas em bancos multilaterais a negociações comerciais mais inclusivas.
A proposta busca mitigar a percepção de que regras são impostas por poucos e ampliar a legitimidade de compromissos no longo prazo.
Enquanto isso, a discussão sobre a moeda norte-americana remete a um debate de fôlego.
Países do Brics têm aumentado a atenção a instrumentos que reduzam custos cambiais e exponham menos suas economias a sanções financeiras.
O ponto não significa substituição imediata do sistema atual, mas abre espaço para alternativas técnicas e operacionais que diversifiquem riscos.
Em linguagem diplomática, a menção ao dólar funciona como convite à experimentação gradual, com salvaguardas e coordenação para evitar turbulências.