Comunidade que fala a língua Fá d’Ambô vê no Brasil a única esperança contra o apagamento cultural e político.
A ilha de Ano Bom, também chamada de Annobón, é um pequeno território de apenas 17 km², localizado ao sul de São Tomé e Príncipe, no Golfo da Guiné. Com alguns milhares de habitantes, a ilha é marcada por praias de origem vulcânica, pesca artesanal e plantações de subsistência. Por isso, sua população preserva a língua crioula Fá d’Ambô e tradições católicas arcaicas, tornando-a um espaço único de resistência cultural no Atlântico.
Uma trajetória de séculos até a Guiné Equatorial
Primeiramente, a ilha foi descoberta por Portugal entre 1473 e 1501. Em seguida, em 1778, passou para a Espanha pelo Tratado de El Pardo. Posteriormente, em 1968, durante o processo de independência da Guiné Equatorial, foi incorporada ao novo país, mesmo contra a vontade de sua população. Assim, a identidade linguística e cultural diferenciada manteve a comunidade isolada, de acordo com historiadores e linguistas.
Língua e fé como resistência
Apesar disso, os habitantes conservaram a Fá d’Ambô, um crioulo de base portuguesa que sobreviveu ao longo dos séculos. Além disso, pesquisadores como Hagemeijer e Zamora (2016) apontam semelhanças com crioulos de São Tomé e Príncipe, reforçando vínculos históricos. Do mesmo modo, a fé católica local, preservada desde o período colonial, mantém características arcaicas, bem diferentes das práticas africanas mais recentes. Portanto, a língua e a religião tornaram-se instrumentos de preservação identitária.
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Denúncias internacionais e abandono político
Ao longo das décadas, denúncias de abusos chamaram a atenção da comunidade internacional. Em 1988, ONGs e médicos alertaram sobre planos de transformar Ano Bom em depósito de resíduos tóxicos, o que teria causado danos ambientais severos. Logo depois, em 1993, relatórios da Amnesty International registraram prisões, tortura e execuções após protestos da população. Mais recentemente, em 2024, organizações civis denunciaram apagões de internet e detenções arbitrárias, ampliando a sensação de isolamento.
Apesar dessas acusações, nenhuma medida efetiva foi tomada pela comunidade internacional. Desse modo, para os anobonenses, essa omissão representa um risco direto de apagamento cultural e físico.
A busca por apoio e o apelo ao Brasil
Em 2022, liderados por Orlando Cartagena Lagar, os habitantes proclamaram a independência simbólica da República de Ano Bom. Contudo, sem reconhecimento internacional, eles passaram a enviar cartas e pedidos de ajuda à CPLP, à ONU e a diversos países lusófonos. Entretanto, a maioria dos apelos não obteve resposta.
Nesse contexto, o Brasil passou a ser visto como a única esperança. De acordo com Lagar, Brasília poderia propor um acordo com São Tomé e Príncipe e intermediar a retirada das tropas da Guiné Equatorial, oferecendo garantias contra retaliações. Além disso, a Marinha do Brasil poderia prestar apoio humanitário temporário, garantindo água, medicamentos e segurança à população. Assim, o Brasil se tornaria o elo entre dois povos irmãos.
Segundo o líder exilado, o Brasil reúne legitimidade histórica, cultural e linguística para assumir esse papel. Ele também ressalta que a integração com São Tomé e Príncipe só seria viável com a mediação brasileira, capaz de unir povos separados por séculos de decisões políticas externas.
Linha do tempo da luta de Ano Bom
- 1473–1501 — Descoberta portuguesa no Golfo da Guiné.
- 1778 — Tratado de El Pardo transfere a ilha para a Espanha.
- 1968 — Incorporação à Guiné Equatorial.
- 1988 — Denúncias sobre resíduos tóxicos em território da ilha.
- 1993 — Protestos seguidos de repressão violenta documentada.
- 2006 — Guiné Equatorial torna-se observadora na CPLP.
- 2010/2011 — Oficialização do português como idioma nacional.
- 2014 — Adesão plena do país à CPLP.
- 2022 — Proclamação simbólica da independência de Ano Bom.
- 2024 — Denúncias de apagões digitais e prisões arbitrárias.
- 2025 — Apelo direto ao Brasil como última esperança de sobrevivência.
O papel que o Brasil pode desempenhar
Portanto, os habitantes de Ano Bom enxergam no Brasil um aliado estratégico não apenas pela língua, mas também pelo peso diplomático na CPLP e pela capacidade de mobilização regional. Além disso, acreditam que a intervenção brasileira significaria não só ajuda humanitária imediata, mas também a preservação de séculos de história e cultura.
Diante disso, a pergunta que ecoa entre os anobonenses é clara: o Brasil aceitará a responsabilidade histórica de ajudar um povo irmão ou permitirá que a ilha seja apagada para sempre?