Com a quebra do monopólio da Petrobras e a chegada de novos players, o mercado de gás natural se reconfigura, prometendo preços mais baixos e maior segurança energética para o país.
O mercado de gás natural no Brasil vive sua mais profunda transformação. Após décadas de domínio da Petrobras sobre toda a cadeia de produção e importação, o setor caminha para um novo modelo competitivo. Essa mudança é impulsionada pela Nova Lei do Gás e, principalmente, pela expansão de terminais privados de Gás Natural Liquefeito (GNL). Esses novos projetos estão quebrando o monopólio na porta de entrada do gás importado, criando uma nova dinâmica para o GNL no Brasil.
Como a nova lei do gás transformou o setor
Por muitos anos, o mercado de gás foi sinônimo de Petrobras. A estatal controlava a infraestrutura essencial, como gasodutos de transporte e, crucialmente, os terminais de importação de GNL. Essa estrutura tornava a competição praticamente inviável. Qualquer concorrente dependia da Petrobras para acessar o mercado.
Tentativas anteriores de liberalização, como a Lei do Gás de 2009, falharam. Elas definiam o acesso de terceiros à infraestrutura como "voluntário"
, o que na prática mantinha as portas fechadas. A mudança real veio com a Lei nº 14.134/2021, a Nova Lei do Gás. Seu pilar central é a garantia de acesso “não discriminatório” a infraestruturas essenciais. Essa cláusula obrigou a abertura de terminais, gasodutos de escoamento e unidades de processamento, criando as condições para uma competição real.
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O novo mapa do GNL no Brasil
Antes, o Brasil contava com apenas três terminais de GNL, todos operados pela Petrobras. Hoje, o cenário é outro. Uma onda de projetos privados está redesenhando a geografia do suprimento de gás ao longo da costa. Novos terminais já operam em pontos estratégicos por todo o país, como o Porto de Sergipe (SE), operado pela Eneva; o Porto do Açu (RJ), da GNA (Gás Natural Açu); o Terminal Gás Sul (SC) e o Terminal de Barcarena (PA), ambos da New Fortress Energy; e o TRSP em São Paulo, da Compass.
A maioria desses projetos é ancorada no modelo “Gas-to-Power”. Uma grande usina termelétrica garante a demanda necessária para viabilizar o investimento bilionário no terminal de GNL. O gás excedente é vendido para a indústria, criando uma nova fonte de receita. Essa expansão descentraliza o suprimento, levando o gás a regiões como o Norte, que antes não tinham acesso à malha.
As estratégias de GNA, New Fortress, Compass e Eneva
Quatro grandes players privados emergiram com estratégias distintas para competir no novo mercado de GNL no Brasil. A GNA (Gás Natural Açu) foca em criar um gigantesco hub de gás e energia no Porto do Açu (RJ), aproveitando economias de escala. Já a New Fortress Energy (NFE) adota uma estratégia de entrada agressiva, implantando terminais rapidamente em mercados como o Norte (PA) e Sul (SC). A Compass, do Grupo Cosan, concentra-se em São Paulo e busca ser pioneira na interiorização do gás através da logística de GNL em pequena escala. Por fim, a Eneva se destaca por seu modelo único e integrado, que entrega gás de seus próprios campos por via rodoviária a grandes clientes.
Redução de preços e maior segurança energética
Historicamente, o gás natural brasileiro é um dos mais caros do mundo, com preços que chegam a ser dez vezes maiores que nos EUA. Esse “Custo Brasil” sempre foi um obstáculo para a competitividade da indústria nacional.
A entrada de novos supridores já mostra resultados. Em regiões com maior concorrência, como o Nordeste, os preços do gás registraram quedas de quase 15%. A própria Petrobras, confrontada com a competição, foi forçada a adaptar sua política de preços para não perder clientes. Além do preço, a nova geografia de terminais aumenta a segurança energética. Regiões que dependiam de uma única fonte, como o gás da Bolívia no Sul, agora têm acesso direto ao mercado global de GNL.
O futuro do GNL no Brasil
Apesar dos avanços, o caminho para um mercado plenamente competitivo ainda tem desafios. O principal gargalo é a malha de gasodutos, que é pouco desenvolvida e concentrada no litoral. Para contornar isso, empresas como Compass e Eneva apostam na logística de pequena escala, criando “gasodutos virtuais” para levar GNL de caminhão ao interior do país.
As oportunidades são imensas. Existe uma enorme demanda industrial reprimida por indústrias que hoje usam combustíveis mais caros e poluentes. O gás natural também é visto como o principal combustível da transição energética, por ser mais limpo que o carvão e o óleo e por garantir a estabilidade do sistema elétrico para a expansão das fontes solar e eólica. O horizonte até 2030 aponta para investimentos robustos, crescimento da oferta e a consolidação do GNL no Brasil como pilar da matriz energética nacional.