O Aeroporto de Lukla, no Nepal, é considerado o mais perigoso do mundo: sua pista tem apenas 527 metros, termina em um penhasco de 700 metros e exige pousos de precisão extrema rumo ao Everest.
Poucos lugares no mundo provocam tanto frio na espinha nos pilotos quanto um pequeno aeroporto cravado nas montanhas do Himalaia. Com apenas 527 metros de comprimento, uma inclinação acentuada e um penhasco de 700 metros na cabeceira da pista, o Aeroporto de Lukla, no Nepal, é considerado por muitos o mais perigoso do mundo.
E não é exagero. Todos os anos, milhares de aventureiros passam por ali rumo ao Everest, a montanha mais alta do planeta. Mas antes de começar a trilha, eles precisam sobreviver a um pouso que exige precisão cirúrgica — e nervos de aço.
O principal acesso ao Everest
Localizado a 2.860 metros de altitude, o Tenzing-Hillary Airport, nome oficial de Lukla, foi construído em 1964 com apoio do alpinista neozelandês Sir Edmund Hillary, o primeiro homem a escalar o Everest ao lado do sherpa Tenzing Norgay. A ideia era criar uma porta de entrada para trekkers e montanhistas que visitam a região de Khumbu, lar do Everest e outras montanhas gigantes.
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Como não há estradas ligando Lukla a Katmandu, a única maneira de chegar rapidamente à região é de avião. Mas o terreno montanhoso impôs um desafio quase insano: a pista só pode ter 527 metros de extensão, com inclinação de 12%, o dobro de uma ladeira de rua convencional.
Por que é considerado o mais perigoso?
São vários os fatores que tornam o aeroporto Lukla um pesadelo logístico para qualquer piloto:
- Pista curta e inclinada: 527 metros é menos da metade do necessário para um avião comercial comum. Por isso, só aviões pequenos (como o Dornier 228 ou Twin Otter) operam ali. A inclinação foi projetada para ajudar na frenagem (em pousos) e na aceleração (nas decolagens).
- Sem margem de erro: Na cabeceira da pista, há um paredão de rocha. Na outra extremidade, um penhasco de 700 metros de queda livre. Não existe “arremetida” possível. Uma vez iniciado o pouso, é tudo ou nada.
- Clima imprevisível: Ventos fortes, neblina repentina e mudanças bruscas de visibilidade são comuns. Em minutos, o céu azul pode virar um manto branco. Pilotos precisam confiar em decisões rápidas e manuais.
- Altitude: O ar rarefeito afeta o desempenho dos motores, a capacidade de frenagem e a resistência física da tripulação. É um desafio tanto técnico quanto humano.
- Ausência de torre de controle: Não há radar nem torre de comando tradicional. A coordenação é feita por rádio entre os pilotos e operadores locais. Tudo depende da experiência e coordenação entre os aviões.
Um histórico marcado por acidentes
Infelizmente, o aeroporto Lukla tem um histórico real de acidentes fatais. Nos últimos 20 anos, diversos incidentes ocorreram, incluindo colisões com montanhas próximas, derrapagens, erros de manobra e até explosões em solo. Entre os casos mais graves:
- 2008: Um Yeti Airlines colidiu com o terreno durante o pouso. 18 pessoas morreram.
- 2017: Um cargueiro derrapou durante o pouso e bateu em um helicóptero estacionado.
- 2019: Um avião da Summit Air perdeu o controle durante a decolagem, atingindo dois helicópteros e matando 3 pessoas.
Ainda assim, a maioria dos voos é bem-sucedida graças ao alto nível de treinamento dos pilotos, muitos dos quais acumulam milhares de horas apenas em pousos em Lukla.
Como é voar até Lukla?
Para quem compra um bilhete para Lukla, a experiência começa em Katmandu, a capital do Nepal. De lá, pequenos aviões de 14 a 20 passageiros decolam em voos panorâmicos de 30 a 40 minutos. Os últimos minutos são os mais tensos.
A aeronave desce entre vales estreitos, ladeados por picos nevados. Não há muita margem para erro. Quando Lukla surge à frente, é como mirar um alvo do tamanho de um campo de futebol — mas cercado por rochas e abismos.
O pouso ocorre em inclinação ascendente, para ajudar na frenagem. O avião toca o solo e, segundos depois, já está parado. Um erro de cálculo e ele pode bater no morro ou despencar no penhasco.
Passageiros relatam a experiência como “única, intensa e assustadora”. Muitos saem do avião em silêncio, com sorrisos nervosos e mãos suadas.
A infraestrutura é precária?
Apesar da fama mundial, o aeroporto Lukla é extremamente simples. A pista é de asfalto, mas estreita e sem luzes de auxílio. Não há sistema de radar. Não há aparelhos de navegação sofisticados. O terminal é pequeno, com estrutura de madeira e poucos serviços.
O tráfego aéreo é intenso na alta temporada (março-maio e setembro-novembro). Cerca de 20 a 30 voos por dia operam ali em dias claros. Mas qualquer mudança no tempo pode causar atrasos ou cancelamentos em massa.
Quando isso acontece, os visitantes precisam esperar dias por uma nova chance de voar ou encarar a caminhada de mais de dois dias montanha abaixo até o vilarejo de Phaplu, onde há outra pista menos arriscada.
Modernização é possível?
Há planos, mas são lentos. O governo do Nepal e ONGs discutem desde 2015 a construção de um teleférico ou uma estrada parcial para reduzir a dependência do aeroporto. Mas os custos são altíssimos e os desafios geográficos enormes.
Também existe uma proposta para equipar Lukla com sistemas de aproximação por satélite e melhorias na pista. Porém, o aeroporto continua funcionando essencialmente da mesma forma que há 30 anos.
Apesar dos riscos, Lukla virou ícone do trekking internacional. Chegar ali é, para muitos, o início oficial da jornada ao Everest. E sobreviver ao pouso é quase um troféu.
Guias locais dizem que Lukla testa a coragem de cada viajante antes da caminhada. “Se você consegue encarar o pouso, o resto da trilha parece mais fácil.”
Para a população local, o aeroporto também é um salva-vidas. Ele encurta viagens que durariam dias por trilhas perigosas, trazendo mantimentos, turistas, médicos e, às vezes, esperança.