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Novo Código Civil ‘libera’ barriga de aluguel sem juiz e muda tudo: contrato define quem é pai, cartório registra direto, clínicas terão novas regras e confronto entre médicos, igrejas e Justiça se intensifica

Escrito por Alisson Ficher
Publicado em 04/10/2025 às 14:49
Novo Código Civil propõe regras para barriga de aluguel sem juiz, define filiação contratual e muda registro civil no Brasil.
Novo Código Civil propõe regras para barriga de aluguel sem juiz, define filiação contratual e muda registro civil no Brasil.
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Proposta no Senado muda regras da gestação por substituição, elimina a exigência de autorização judicial e transfere o registro civil para o cartório, acirrando o debate entre medicina, religião e direito sobre os limites da autonomia reprodutiva.

A proposta de inserir regras explícitas sobre gestação por substituição no Código Civil chegou ao Senado com o PL 4/2025 e redesenha o procedimento no Brasil.

O texto autoriza a prática sem finalidade lucrativa, transfere o registro de nascimento para a via administrativa e permite que a filiação seja definida previamente em contrato, dispensando autorização judicial prévia.

A iniciativa recoloca o tema no campo legal, deslocando-o de resoluções técnicas para norma de lei, e reacende o embate entre entidades médicas, lideranças religiosas e operadores do direito.

O projeto estabelece que a cessão temporária de útero poderá ocorrer quando a gestação natural for inviável ou desaconselhada por indicação médica.

Não há margem para remuneração: permanece a vedação a lucro, com preferência para que a cedente tenha vínculo de parentesco com os beneficiários.

O arranjo deve ser fechado antes da implantação do embrião, por instrumento público ou particular, com cláusula que atribui expressamente a filiação aos autores do “projeto parental”.

A novidade está na centralidade do documento: a parentalidade passa a ser antecipada e fundamentada no consentimento formal, trazendo previsibilidade ao registro civil.

Registro civil direto no cartório

O procedimento no cartório é descrito de forma detalhada.

O oficial do Registro Civil lavrará o assento em nome dos autores do projeto parental mediante a apresentação da Declaração de Nascido Vivo, do termo de consentimento informado assinado na clínica e do contrato de cessão temporária de útero com a indicação de filiação.

O cartório fica proibido de revelar no assento o caráter da gestação por substituição.

Com isso, o eixo de controle migra do Judiciário para o âmbito administrativo, apoiado na conferência documental.

Críticos veem nessa eliminação da chancela judicial obrigatória um ponto sensível, sobretudo em situações de maior complexidade ética ou com indícios de intermediação indevida.

Regras para gametas, sigilo e acesso excepcional

No entorno da reprodução assistida, a proposta permite doação de gametas sem comercialização e impõe que clínicas comuniquem ao Sistema Nacional de Produção de Embriões os nascimentos vinculados a material genético doado, para futura consulta por ofícios de registro em verificações de impedimentos matrimoniais.

O sigilo do doador é preservado; contudo, a pessoa nascida pode acessar sua origem biológica em hipóteses justificadas de saúde e mediante autorização judicial.

O texto enfatiza que não há vínculo de filiação entre o concebido por doação e o doador de gametas.

Outro dispositivo que suscita debate determina que embriões criopreservados não poderão ser descartados: deverão ter destino definido, como pesquisa ou entrega a terceiros, o que abre questões bioéticas e operacionais nas clínicas sobre custódia, consentimentos sucessivos e prazos de decisão.

Parentalidade por vontade e documento

A redação proposta não exige que os beneficiários forneçam seus próprios gametas para consolidar a parentalidade.

A filiação decorre do projeto parental formalizado e do consentimento informado.

Especialistas destacam que o desenho jurídico privilegia o elemento volitivo e documental na definição de quem é mãe ou pai, com potencial para reduzir ações declaratórias posteriores.

Ainda assim, permanecem abertas as vias judiciais para alegações de vício de consentimento e para situações em que a socioafetividade seja invocada como elemento de manutenção de vínculos.

Do regulatório à lei: mudança de patamar

Até agora, a prática vinha sendo balizada por resoluções do Conselho Federal de Medicina e por normas administrativas do sistema registral.

O Provimento 63 do CNJ já disciplinou o registro de nascimentos em reprodução assistida e, para casos de gestação por substituição, vedou a inclusão do nome da parturiente no assento.

O PL 4/2025 desloca essas referências para o nível legal, ao incorporar os dispositivos no Código Civil, o que tende a oferecer maior densidade normativa e uniformidade a procedimentos hoje resolvidos por atos infralegais e orientações de corregedorias.

Três frentes de controvérsia

No plano jurídico, o debate se concentra no risco de insegurança decorrente de cláusulas abertas e na discussão sobre a conveniência de um controle judicial prévio em cenários específicos, como quando não há parentesco entre cedente e beneficiários ou surgem sinais de intermediação comercial.

A defesa de filtros adicionais inclui, por exemplo, exigências documentais reforçadas e participação obrigatória do Ministério Público em casos complexos.

Sob a ótica bioética, a tensão envolve autonomia reprodutiva, proteção da mulher que cede o útero e o interesse da criança.

A proibição de lucro pretende coibir exploração econômica, mas reabre a discussão sobre a diferença entre reembolso de despesas e remuneração indireta, tema que demandará regulamentação técnica e fiscalização efetiva.

Enquanto isso, o tratamento dos embriões congelados mobiliza argumentos sobre dignidade, destino adequado e compatibilidade com práticas internacionais.

No eixo cultural e religioso, lideranças divergem sobre limites da tecnociência na formação de famílias e sobre a conciliação entre liberdade individual, dignidade humana e proteção da infância.

Há quem sustente que a lei deve espelhar pluralidade de arranjos e, ao mesmo tempo, resguardar princípios de não mercantilização do corpo.

Impactos no dia a dia de famílias, clínicas e cartórios

Para famílias que enfrentam barreiras clínicas para engravidar, a positivação em lei é percebida como caminho para previsibilidade e menor judicialização, especialmente no momento do registro.

Já as clínicas deverão fortalecer rotinas de consentimento, armazenamento de documentos e reportes ao sistema nacional, com protocolos claros sobre gestão e destino de embriões.

Nos cartórios, o impacto é operacional: caberá aos oficiais verificar o conjunto probatório antes da lavratura, resguardar o sigilo e aplicar as regras de atribuição de filiação conforme o contrato.

Trâmite no Senado e pontos sujeitos a ajustes

O processo legislativo avança no Senado, com comissão temporária designada para analisar o texto e possibilidade de ajustes.

Alterações podem incidir sobre a extensão do sigilo, os requisitos para cessão por não parentes, as balizas do consentimento informado e os detalhes do procedimento registral.

Mesmo que prevaleça um modelo sem autorização judicial como regra, a prática notarial continuará a exigir documentação robusta e, em casos duvidosos, a suscitar consultas a corregedorias para orientação, preservando uma interface institucional de segurança.

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Alisson Ficher

Jornalista formado desde 2017 e atuante na área desde 2015, com seis anos de experiência em revista impressa, passagens por canais de TV aberta e mais de 12 mil publicações online. Especialista em política, empregos, economia, cursos, entre outros temas. Registro profissional: 0087134/SP. Se você tiver alguma dúvida, quiser reportar um erro ou sugerir uma pauta sobre os temas tratados no site, entre em contato pelo e-mail: alisson.hficher@outlook.com. Não aceitamos currículos!

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