Construído a um custo de US$ 240 milhões, o Novo Aeroporto Internacional Gwadar, no Paquistão, tornou-se um símbolo da ambição chinesa na Nova Rota da Seda — mas segue quase sem voos e cercado por tensões
O Novo Aeroporto Internacional Gwadar, construído a um custo de US$ 240 milhões — cerca de R$ 1,3 bilhão —, tornou-se símbolo de um ambicioso projeto de infraestrutura que ainda não decolou. Localizado na região do Baluquistão, no Paquistão, o terminal substituiu o antigo aeroporto de mesmo nome, mas opera apenas um voo por semana, quando não há cancelamentos.
Inauguração sem movimento
Oficialmente inaugurado em 10 de janeiro de 2025, o aeroporto recebeu seu primeiro voo rumo a Mascate, em Omã.
No entanto, a primeira aterrissagem só ocorreu no final daquele mês, com um Airbus A319 da Rotana Jet vindo dos Emirados Árabes.
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Nos meses seguintes, o cenário foi de incerteza. Em fevereiro, a agência Associated Press relatou que o aeroporto permanecia sem aviões ou passageiros, e que as razões para sua construção continuavam sendo “um mistério”, já que o antigo terminal oferecia apenas três voos semanais.
Com capacidade para 400 mil passageiros, o aeroporto atende uma cidade de apenas 90 mil habitantes, que ainda enfrenta carências básicas.
Gwadar sequer está ligada à rede nacional de energia e depende do fornecimento vindo do Irã ou de painéis solares.
A escassez de água potável também é um problema constante, o que levanta questionamentos sobre a utilidade da estrutura bilionária.
Voos cancelados e pista vazia
O aeroporto só passou a aparecer em agosto na plataforma FlightRadar24, mas com registros escassos. Um único voo semanal deveria conectar Gwadar à cidade de Karachi.
Contudo, uma pesquisa recente apontou que até esse voo foi cancelado, e a imprensa internacional afirma que cancelamentos são frequentes.
Na plataforma FlightAware, os painéis de partidas e chegadas seguem completamente vazios. O mapa de tráfego aéreo tampouco mostra qualquer movimento no espaço aéreo da região.
A falta de operações regulares transformou o moderno terminal em uma estrutura praticamente ociosa, alimentando críticas e especulações sobre suas verdadeiras intenções.
Um projeto da Nova Rota da Seda
Grande parte do investimento veio da China, dentro da estratégia de expansão da Nova Rota da Seda, uma rede global de infraestrutura que busca integrar rotas comerciais e logísticas entre a Ásia, a África e a Europa.
“Este aeroporto não é para o Paquistão ou para Gwadar. É para a China, para que eles possam ter acesso seguro ao Baluquistão”, afirmou o especialista em relações internacionais Azeem Khalid à Associated Press.
Na última década, o governo chinês destinou bilhões de dólares ao litoral do Baluquistão. A região é estratégica porque liga Xinjiang, província chinesa mais ocidental, ao Mar Arábico e ao Golfo de Omã.
Essa rota é vital para o transporte de petróleo — cerca de um quarto da produção mundial passa por ali — e representa um elo fundamental do Corredor Econômico China-Paquistão (CPEC, na sigla em inglês).
Gwadar, nesse contexto, foi planejada como uma das principais portas de entrada para o corredor econômico, mas a instabilidade política e social da região ameaça o projeto.
Tensão e militarização no Aeroporto
Os investimentos chineses provocaram tensões locais. Grupos separatistas acusam o governo paquistanês e Pequim de explorarem os recursos da região em detrimento da população baluchi, minoria étnica que reclama discriminação e falta de oportunidades.
Esses grupos já realizaram ataques contra forças paquistanesas e trabalhadores chineses. Em resposta, o governo aumentou a presença militar, instalando postos de controle, torres de vigilância e barreiras por toda a cidade.
Hoje, Gwadar se parece mais com uma zona militarizada do que com um polo turístico ou econômico. Oficiais de inteligência monitoram jornalistas e restringem o acesso a locais públicos, como o mercado de peixes, considerado “muito sensível” para reportagens.
Segundo o governo, o CPEC já criou cerca de 2 mil empregos na área, embora não esteja claro quantos foram destinados a moradores locais.
A crescente presença militar e a sensação de insegurança afastam investidores e visitantes.
Possível uso militar e clima de desconfiança
A tensão não se limita às fronteiras paquistanesas. O pesquisador Antoine Levesques, do International Institute for Strategic Studies, declarou ao South China Morning Post que a Índia, principal rival regional do Paquistão, mantém “profundas dúvidas” sobre o corredor econômico e o novo aeroporto.
Segundo ele, há potencial para “camadas de militarização” que podem resultar em uma guerra híbrida ou até em conflito aberto de alta intensidade.
Levesques acredita que o aeroporto de Gwadar pode acabar integrando uma futura base militar chinesa no Oceano Índico.
A proximidade das montanhas também torna o local vulnerável a ataques separatistas. O risco é tão real que, durante a inauguração, o governo optou por realizar a cerimônia de forma virtual, evitando aglomerações.
Portanto, apesar da imponência e do investimento bilionário, o futuro do Novo Aeroporto Internacional Gwadar segue incerto.
Entre tensões políticas, desconfianças internacionais e cancelamentos de voos, o terminal continua esperando para, de fato, decolar.
Com informações de UOL.