Relacionamentos no trabalho não são proibidos pela CLT, mas regras internas podem limitar condutas, férias conjuntas e até impor sanções disciplinares
Um episódio recente envolvendo executivos da empresa norte-americana Astronomer reacendeu o debate sobre namoros e relacionamentos dentro do ambiente de trabalho. A polêmica começou quando uma câmera de transmissão pública, a conhecida kiss cam, flagrou um momento íntimo entre o CEO da companhia e a diretora de recursos humanos durante um show do Coldplay, em Boston, no dia 17 de julho.
A cena viralizou e trouxe uma pergunta: o que aconteceria se o caso tivesse ocorrido em uma empresa no Brasil? Afinal, traições ou namoros entre colegas podem ser motivo para demissão por justa causa?
O que diz a CLT sobre relacionamentos profissionais
A Consolidação das Leis do Trabalho não proíbe relações afetivas entre funcionários. A Constituição também protege a intimidade e a vida privada, impedindo que namoros ou casamentos sirvam como justificativa legal para punições no ambiente corporativo.
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Tese 125 do TST amplia estabilidade provisória e garante direito mesmo sem afastamento de 15 dias ou auxílio-doença em casos de doença ocupacional.
Segundo a advogada trabalhista Cristina Pena, impor restrições nesse campo pode ferir direitos fundamentais. “Proibir que as pessoas se apaixonem é inconstitucional. O que é possível é estabelecer condutas adequadas no ambiente de trabalho, desde que não haja discriminação ou abuso”, afirma.
Empresas podem impor regras internas
Mesmo sem vedação legal, companhias têm autonomia para estabelecer normas que evitem conflitos de interesse.
Políticas internas, como códigos de ética e manuais de conduta, podem restringir relações hierárquicas diretas ou exigir comunicação ao setor de RH quando um relacionamento se formaliza.
Quando a justa causa é aplicada
O artigo 482 da CLT prevê demissão por justa causa em casos de “incontinência de conduta”, que pode incluir comportamentos inadequados no trabalho.
No entanto, os tribunais costumam ser cautelosos ao aplicar essa justificativa em situações envolvendo traição ou namoro.
Tolentino destaca que apenas em casos extremos, como violação direta de normas internas ou prejuízo comprovado à empresa, a justa causa pode ser aceita. Caso contrário, o desligamento deve ocorrer sem justa causa, mais seguro juridicamente.
Afeto público pode gerar advertência
Embora relacionamentos sejam permitidos, manifestações excessivas de carinho no ambiente profissional podem ser limitadas.
A advogada Ana Gabriela Burlamaqui explica que beijos, abraços frequentes ou condutas similares podem ser considerados inadequados, dependendo da política interna.
“Caso o casal descumpra normas de convivência ou regras de conduta previamente divulgadas, a empresa pode aplicar advertências, suspensões e, em situações reincidentes ou graves, até rescindir o contrato”, observa.
Relacionamentos secretos e riscos
Manter um namoro em sigilo não é ilegal. Contudo, se a empresa tiver regras específicas para relações entre subordinados diretos, esconder a situação pode resultar em penalidades.
Ana Gabriela esclarece: “a justa causa só se aplica se a empresa comprovar que houve violação de norma conhecida e que o ato comprometeu o bom funcionamento da equipe ou a imparcialidade em processos decisórios”.
Cônjuges e nepotismo
A contratação de cônjuges ou parentes próximos pode ser alvo de restrições internas, principalmente para evitar nepotismo.
Entretanto, proibições genéricas podem ser consideradas discriminatórias pelo Tribunal Superior do Trabalho.
Para Cristina Pena, o critério deve ser objetivo. “Se a empresa justificar a restrição com base em riscos reais de comprometimento da imparcialidade administrativa, ela pode ser considerada legítima. O importante é que a política seja fundamentada e não viole o princípio da igualdade de oportunidades”, explica.
Férias e escalas compatíveis
Casais podem solicitar férias conjuntas ou escalas parecidas, mas a decisão final cabe à empresa. A CLT determina que os interesses do trabalhador devem ser considerados, porém o empregador tem a palavra final ao organizar períodos de descanso.
Demissão discriminatória pode gerar indenização
Se um empregado for dispensado unicamente por causa de um relacionamento e não houver descumprimento de norma, ele pode entrar na Justiça pedindo indenização por dano moral.
Para isso, será necessário comprovar que a dispensa foi discriminatória e lesiva à sua honra.
Exposição pública exige cautela empresarial
Casos de grande repercussão, como o da Astronomer, mostram que a exposição pública de relacionamentos pode afetar a imagem da companhia.
Ainda assim, medidas punitivas devem ser embasadas em critérios legais e objetivos.
Especialistas recomendam que empresas invistam em políticas de compliance, treinamentos e canais de comunicação claros para prevenir problemas.
O equilíbrio entre privacidade e normas
Relacionamentos entre colegas não são proibidos pela legislação, mas exigem cuidado. A melhor solução é que empresas criem políticas transparentes, capazes de preservar tanto a privacidade dos colaboradores quanto o bom funcionamento do ambiente de trabalho.
A justa causa só se aplica quando há quebra comprovada de regras internas ou prejuízo efetivo à empresa.
Portanto, o caminho mais seguro está na combinação de respeito aos direitos individuais e regras claras de convivência.
Com informações de Cirocontador.com e portal G1.