Diretor foi enganado por golpistas nigerianos, pagou US$ 12 milhões a uma mãe de santo e acabou preso; entenda o caso que marcou a história e é detalhado pelo canal Conhecimento Global como a maior fraude bancária do Brasil.
A aquisição de um banco é um processo complexo que envolve análises financeiras rigorosas, conhecidas como due diligence. Foi exatamente durante uma dessas auditorias, em 1997, que o banco espanhol Santander, ao negociar a compra do Banco Noroeste, descobriu um rombo que entraria para a história. O que parecia ser uma transação de US$ 500 milhões para adquirir uma instituição de finanças saudáveis revelou-se o palco da maior fraude bancária do Brasil, um esquema que desviou US$ 242 milhões, mais da metade do patrimônio do Noroeste.
O caso, amplamente dissecado pelo canal Conhecimento Global, não se resume a números. A trama envolve um executivo experiente, Nelson Tetsuo Sakaguchi, que foi seduzido por uma falsa promessa de investimento na Nigéria, uma caçada internacional pelo dinheiro, processos em múltiplos países e um elemento surpreendente: o desvio de milhões de dólares para uma mãe de santo na tentativa desesperada de recuperar o valor perdido. A história expôs falhas de controle e a vulnerabilidade humana diante da ambição e do engano.
A descoberta: o rombo nas contas do paraíso fiscal
No final da década de 90, o Santander estava em plena expansão no Brasil e via na aquisição do Banco Noroeste uma oportunidade estratégica. O Noroeste era uma instituição consolidada, especialmente no estado de São Paulo, com mais de 70 agências. Conforme o protocolo, antes de fechar o negócio, os auditores do Santander mergulharam nos livros contábeis do Noroeste. Foi quando o alarme soou: metade do patrimônio do banco, algo em torno de US$ 250 milhões, estava registrada na agência das Ilhas Cayman.
-
Meta fiscal zero já virou ilusão: TCU aponta déficit bilionário, critica mudanças no IOF e pressiona Haddad a cortar gastos imediatos
-
Trump anuncia novas tarifas de até 100% sobre medicamentos, móveis e caminhões pesados e promete proteger indústria dos EUA por segurança nacional
-
Brasil, México e Canadá elevam tarifas contra aço chinês e tentam recuperar espaço perdido no mercado
-
Dólar vive pior semestre em 50 anos: moeda americana se desvaloriza 11% em 2025, e sanções de Trump aceleram busca por alternativas
O problema, no entanto, era grave. Ao verificarem o caixa dessa agência, os auditores encontraram apenas US$ 7 milhões. A diferença era colossal e ninguém na diretoria sabia explicar o paradeiro do dinheiro. O responsável pela área internacional e pela agência no paraíso fiscal era Nelson Sakaguchi, que, convenientemente, estava de férias. A pressão sobre ele começou assim que retornou, culminando em uma confissão que daria início a um escândalo sem precedentes no sistema financeiro nacional.
O golpe nigeriano: a falsa promessa de um aeroporto
Tudo começou em 1995 com um fax. Como detalha a apuração do canal Conhecimento Global, uma quadrilha liderada por Emmanuel Nwude, então diretor do Union Bank da Nigéria, aproveitou o momento de otimismo econômico do país africano para arquitetar um golpe sofisticado. Eles criaram um falso convite de investimento para a construção de um aeroporto na nova capital nigeriana, Abuja, e o enviaram para bancos ao redor do mundo. Um desses faxes chegou à mesa de Nelson Sakaguchi, no Banco Noroeste.
Intrigado com a proposta, Sakaguchi respondeu pedindo mais informações. A partir daí, a quadrilha colocou em prática a segunda fase do plano. O executivo brasileiro foi convidado para uma reunião em Londres, onde foi recebido com extremo luxo, incluindo limusines e hospedagem em hotéis de primeira classe. Lá, ele foi apresentado a uma comitiva de supostas autoridades nigerianas, incluindo um homem que se passava por presidente do Banco Central do país, o próprio Emmanuel Nwude. Ofereceram a Sakaguchi uma generosa comissão pessoal, o que foi suficiente para convencê-lo a assinar o contrato sem comunicar seus superiores.
A engrenagem da fraude: anos de desvios e contabilidade fictícia
Após a reunião em Londres, Sakaguchi fez a primeira transferência, de US$ 4 milhões, e selou seu destino. Nos três anos seguintes, entre 1995 e 1997, o executivo realizou 93 transferências para os golpistas, que continuamente apresentavam novas despesas, como taxas, impostos e subornos. Para não levantar suspeitas, Sakaguchi mantinha o valor de cada transação abaixo de US$ 6 milhões, montante que não exigia autorização de outros diretores, explorando uma brecha nos controles internos do Noroeste.
Para encobrir o rombo crescente, ele lançava na contabilidade lucros fictícios gerados pelo suposto investimento no aeroporto. Essa manobra não só escondia os desvios durante as auditorias internas, como também inflava artificialmente o capital do banco. O esquema era meticuloso e só foi descoberto por causa da auditoria externa do Santander. O total desviado para a Nigéria chegou a US$ 192 milhões dos US$ 242 milhões do rombo total.
Do desespero à mãe de santo: o rastro de US$ 12 milhões para rituais
Quando a fraude foi exposta pela auditoria, Sakaguchi, pressionado pelos colegas, finalmente confessou o “investimento” e tentou acalmar os ânimos, dizendo que o retorno financeiro era iminente. Nesse ponto, o caso deixou de ser um problema administrativo e se tornou um caso de polícia. Foi durante as investigações que os detalhes mais bizarros vieram à tona. Os investigadores descobriram transferências que somavam mais de US$ 12 milhões para uma mulher chamada Maria Rodrigues da Silva.
A investigação revelou que ela era uma mãe de santo, líder da casa de umbanda Caboco de Fogo. Aparentemente, ao perceber que havia caído em um golpe e desesperado para recuperar o dinheiro do banco antes que alguém descobrisse, Sakaguchi recorreu à ajuda espiritual. Ele a procurou para realizar “trabalhos” que trouxessem o investimento de volta. A líder espiritual, segundo relatos, passou a exigir quantias cada vez maiores para a compra de milhares de animais para os rituais, fazendo com que o executivo caísse em um segundo golpe, desta vez dentro do Brasil.
A caçada internacional e a recuperação do dinheiro
Com o negócio com o Santander ameaçado, os donos do Banco Noroeste, as famílias Cochrane e Simonsen, concordaram em abater o prejuízo do valor da venda e contrataram a renomada agência de investigação Kroll Associates para rastrear o dinheiro. A investigação descobriu uma complexa rede de lavagem de dinheiro que passava por bancos no Reino Unido, Suíça, Hong Kong e Estados Unidos.
Ainda assim, a caçada teve sucesso. O chefe da quadrilha, Emmanuel Nwude, e seus comparsas foram localizados. Eles haviam usado o dinheiro para comprar mansões e Nwude chegou a se tornar o maior acionista individual do banco onde trabalhava. Graças à cooperação internacional, os golpistas foram processados e condenados na Nigéria. Nelson Sakaguchi foi preso em Nova York em 2002, extraditado para a Suíça, onde cumpriu pena por lavagem de dinheiro, e, posteriormente, condenado também no Brasil em 2014. Surpreendentemente, boa parte do valor foi recuperado, pois os criminosos investiram em imóveis que se valorizaram com o tempo.
Um legado de alertas e consequências
O caso da maior fraude bancária do Brasil é um estudo sobre como a ambição pessoal e a falha de governança corporativa podem levar uma instituição financeira à beira do colapso. O destino de Nelson Sakaguchi foi trágico: após cumprir pena, ele retornou ao Brasil e, segundo reportagens da época, enfrentou severas dificuldades financeiras, tendo que vender todos os seus bens para sobreviver. Isso reforça a tese de que ele foi mais uma vítima enganada do que um cérebro do crime.
A história do Banco Noroeste levanta questões importantes sobre controles internos, responsabilidade executiva e a natureza humana diante de promessas de ganho fácil. Você acredita que a ambição de Sakaguchi o torna tão culpado quanto os golpistas, ou ele foi principalmente uma vítima de um esquema muito bem elaborado? Qual é a sua opinião sobre um executivo de alto nível recorrer a medidas tão desesperadas? Deixe seu ponto de vista nos comentários, queremos entender como você enxerga as complexidades deste caso.