Bilionário aposta no “real zero” e mantém projeto no Complexo do Pecém mesmo após críticas financeiras e ajustes de planos internacionais
Um dos maiores projetos de transição energética do mundo está sendo desenvolvido no Brasil. A mineradora australiana Fortescue Metals, comandada pelo bilionário Andrew Forrest, aposta no Complexo do Pecém, no Ceará, para instalar um polo de hidrogênio verde avaliado em até 18 bilhões de dólares.
A iniciativa, confirmada em 2022 com a assinatura de um pré-contrato, pode transformar o estado em um dos grandes centros de produção e exportação do combustível no cenário global. Entretanto, o projeto avança sob críticas financeiras, oscilações de mercado e ajustes estratégicos importantes.
Fortescue enfrenta críticas e perdas no mercado
A estratégia de Forrest de apostar em energia limpa tem sido chamada por analistas conservadores de “fantasia verde”. Em agosto de 2024, as ações da Fortescue valiam 35% menos do que no pico do mesmo ano. Além disso, segundo a Bloomberg, a fortuna do empresário caiu para 25 bilhões de dólares, levando-o a perder a liderança no ranking de bilionários da Austrália.
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Apesar da pressão, Forrest declarou à revista Veja Negócios que “não aceita” as críticas. Além disso, ele ressaltou que a base de acionistas aumentou de 50 mil para quase 200 mil em poucos anos. Para ele, os números confirmam apoio sólido do mercado.
O conceito de “real zero” e a meta até 2030
Diferentemente da maioria das mineradoras, que adotam o net zero por meio de compensações de carbono, Forrest defende o conceito de “real zero”. Ou seja, eliminar completamente o uso de combustíveis fósseis até 2030.
A ambição é ousada: a companhia produz mais de 170 milhões de toneladas de minério de ferro por ano em duas minas entre as maiores do planeta. Portanto, a Fortescue precisará de grandes volumes de energia renovável, o que justifica a escolha do Ceará como destino estratégico.
Ceará como plataforma de energia limpa
De acordo com Max Quintino, presidente do Complexo do Pecém, a chegada da Fortescue fortalece a industrialização do estado. Além disso, atrai novas cadeias produtivas e consolida o Brasil como potência exportadora de hidrogênio verde.
O contrato assinado em 2022 foi o primeiro do tipo no Pecém. Assim, ele abriu caminho para outras seis companhias interessadas em investir na região. Caso avance, o projeto será o maior da história econômica do Ceará.
Potencial e usos do hidrogênio verde
O hidrogênio não é fonte, mas sim um vetor energético. Ele é produzido por meio de eletricidade e pode ser reconvertido em energia quando necessário. Essa característica o torna essencial para armazenar energia solar e eólica, que são intermitentes.
Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), o combustível também pode abastecer caminhões, trens e navios pesados, especialmente em áreas sem infraestrutura. Além disso, o hidrogênio é matéria-prima industrial em diversos setores, ampliando sua relevância.
Cronograma e decisões no Pecém
As sete empresas que assinaram pré-contratos no Pecém, incluindo a Fortescue, têm até 2026 para tomar a decisão final sobre os investimentos. Nesse sentido, a previsão é que a produção comece no fim de 2027.
Em agosto de 2024, a Fortescue suspendeu projetos semelhantes na Austrália (por altos custos) e nos Estados Unidos (afetados pelo efeito Trump). Mesmo assim, o projeto no Ceará foi mantido, reforçando sua prioridade estratégica.
Financiamento chinês e disputa geopolítica
No início de agosto de 2024, a Fortescue fechou com o Banco da China o maior financiamento já feito para uma empresa estrangeira: 14 bilhões de iuanes (cerca de 2 bilhões de dólares).
A China, que já é o principal destino do minério de ferro da companhia, deverá ser também a maior importadora do “ferro verde”. Forrest, crítico de Donald Trump, afirmou que conforme os Estados Unidos recuam, a China e a Fortescue avançam.
Estrutura renovável e tecnologia na Austrália
Na Austrália, a Fortescue já mantém uma usina solar em operação e outra em construção. Além disso, investe em 640 km de linhas de transmissão e em baterias em larga escala.
A empresa também encomendou caminhões e perfuratrizes elétricas e já utiliza escavadeiras movidas a energia limpa. O sistema será coordenado por softwares capazes de reduzir desperdícios e integrar máquinas autônomas.
Segundo a companhia, o uso de inteligência artificial em máquinas pesadas gera 30% de economia energética. Com isso, o investimento previsto nessa frente chega a 6,2 bilhões de dólares.
Fortescue Zero e o navio Green Pioneer
Para expandir a inovação, a Fortescue criou a subsidiária Fortescue Zero, voltada para tecnologias limpas e soluções de engenharia para a indústria pesada.
Entre os projetos em desenvolvimento estão sistemas de controle de emissões, baterias inteligentes e veículos autônomos. O exemplo mais simbólico é o navio Green Pioneer, movido a amônia, que deve atracar em Belém durante a COP30 em 2030.