A Ferrovia Norte–Sul foi concebida em 1987 como espinha dorsal do transporte de cargas; entregue formalmente em 2023, o projeto prevê 4.155 km passando por 12 estados, com operação dividida entre VLI (norte) e Rumo (sul) e investimentos públicos e privados superiores a R$ 11 bilhões
A Ferrovia Norte–Sul nasceu para integrar o Brasil de ponta a ponta e reduzir o custo logístico do país. Iniciada em 1987, no governo José Sarney, a obra atravessou cinco governos federais, duas recessões e uma pandemia, alternando fases de avanço e paralisação. A entrega formal do trecho final, conectando os eixos aos portos de Itaqui (MA) e Santos (SP), ocorreu em junho de 2023.
Hoje, a ferrovia soma 2.257 km em operação, dentro de um plano total de 4.155 km que cortará 12 estados (entre eles Pará, Maranhão, Tocantins, Goiás, Minas Gerais e São Paulo). O custo acumulado ultrapassa R$ 11 bilhões, com concessões e aportes privados decisivos para a conclusão da malha e a expansão de terminais.
O que é a Ferrovia Norte–Sul e por que ela importa
Pensada como espinha dorsal do sistema ferroviário, a FNS foi desenhada para ligar áreas produtoras do Centro-Norte aos grandes portos, reduzindo a dependência do modal rodoviário.
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O objetivo central é diminuir o frete e elevar a competitividade, especialmente de grãos (soja, milho), minérios e produtos industriais.
Na prática, a rota cria corredores logísticos que conectam polos agrícolas e industriais a terminais ferroviários e retroportos.
Ao encurtar distâncias econômicas e padronizar fluxos, a FNS tende a suavizar gargalos de safra, mitigar a sazonalidade de fretes e atrair novos investimentos em armazenagem e processamento de cargas.
Linha do tempo: 1987–2023
O traçado inicial previa cerca de 1.550 km entre Açailândia (MA) e Anápolis (GO). Entre 2003 e 2016, a obra ganhou tração, mas também acumulou denúncias de desvios e mudanças de projeto, que alongaram prazos e custos.
Em 2019, o trecho sul (Porto Nacional/TO–Estrela d’Oeste/SP, 1.537 km) foi subconcedido à Rumo Logística por R$ 2,719 bilhões de outorga.
A Rumo anunciou cerca de R$ 4 bilhões para concluir obras e erguer terminais estratégicos.
Em 2023, a entrega final consolidou a ligação operacional com Itaqui (MA) e Santos (SP), conectando áreas produtoras às duas principais saídas marítimas do país. Resultado: a FNS passou de promessa a eixo efetivo de escoamento.
Extensão, operação e governança
O projeto total prevê 4.155 km, cruzando 12 estados ao longo de quatro macrorregiões.
Em operação, são 2.257 km, com a malha dividida entre VLI Logística (trecho norte) e Rumo Logística (trecho central e sul).
Essa divisão por concessões exige coordenação de janelas, acordos de passagem e padronização de procedimentos para manter regularidade e previsibilidade de trens.
No lado financeiro, a FNS combina investimentos públicos históricos (via Valec) com capex privado recente para acabamento de obra, pátios, sinalização, material rodante e terminais multimodais.
É nessa governança compartilhada que a ferrovia busca ganho de escala, segurança operacional e previsão de longo prazo para embarcadores.
Integração logística: onde estão os ganhos e os gargalos
Os ganhos aparecem quando a ferrovia se conecta com terminais de transbordo, armazéns e boas rodovias de acesso.
Nesses casos, embarcadores reportam reduções expressivas de custo, com impacto direto na formação de preço do frete e na competitividade das exportações.
A consistência do trem cheio no sentido porto–interior também sustenta tarifas mais estáveis.
Os gargalos surgem quando faltam pátios, acessos urbanos, licenças de expansão ou quando há interferências na faixa de domínio (passagens irregulares, invasões).
Sem integração ponta a ponta, perdem-se os benefícios do trilho: caminhões fazem trechos longos, o ciclo de vagões desacelera e o custo total volta a subir.
A chave é a multimodalidade bem amarrada.
Impacto econômico e setorial
Para o agronegócio, a FNS viabiliza rotas mais curtas e previsíveis até os portos, o que melhora a logística de exportação e incentiva investimentos em esmagamento, etanol de milho e armazenagem próximos à ferrovia.
Indústrias de cimento, siderurgia, papel e celulose também ganham com lotação pesada e menor variabilidade de frete ao longo do ano.
No plano regional, o trilho induz novos polos de serviços (oficinas, manutenção, operadores logísticos), amplia empregos qualificados e melhora a arrecadação local.
Com menor emissão por tonelada transportada, o modal ferroviário ainda agrega um efeito ambiental positivo frente à matriz rodoviária predominante.
Custos, concessões e números-chave
O custo total da FNS ultrapassa R$ 11 bilhões ao longo de quase quatro décadas, somando investimento público (fases iniciais) e aportes privados recentes.
Em 2019, a Rumo venceu a subconcessão do trecho sul por R$ 2,719 bilhões e investiu cerca de R$ 4 bilhões em conclusão de obras e terminais.
O trecho norte está sob operação da VLI, com foco em manutenção, segurança e aumento de capacidade.
Ponto sensível: a diluição do capex exige volume constante de carga e contratos de médio e longo prazo.
Sem demanda firme, o custo por tonelada ferroviária sobe, desincentivando o shift modal e reabrindo espaço ao caminhão em trechos intermediários.
Desafios imediatos e próximos passos
O desafio imediato é consolidar a continuidade operacional entre concessões, eliminar gargalos de acesso e acelerar terminais privados em entroncamentos agrícolas e industriais.
Padronização de processos, priorização de cruzamentos e tecnologia de sinalização ajudam a aumentar a janela útil sem sacrificar segurança.
No horizonte, a meta é alcançar os 4.155 km projetados, ampliar conexões com outras malhas e estabilizar corredores Norte e Sudeste com previsibilidade de safra e contratos take-or-pay.
Quando a ferrovia “fecha o ciclo” com porto, pátio e acesso rodoviário, o efeito é cumulativo: mais carga, menor custo unitário e maior competitividade externa.