Cecafé aponta 1.542 contêineres “encalhados” e 508,7 mil sacas não embarcadas por deficiência portuária, atraso e alteração de escalas atingiram metade dos navios em julho de 2025.
O Brasil deixou de receber R$ 1,084 bilhão em julho de 2025 porque 508.732 sacas de 60 kg de café não foram embarcadas. O volume corresponde a 1.542 contêineres parados por falhas de infraestrutura portuária, segundo levantamento do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), que monitora atrasos e mudanças de escala desde junho de 2024.
O cálculo considera o preço médio FOB do café verde e a cotação média do dólar no mês, o que também equivale a US$ 196 milhões em receita cambial. A avaliação foi confirmada por veículos setoriais e de economia ao repercutirem o boletim do Cecafé.
Além da perda cambial, exportadores somaram R$ 4,14 milhões em custos extras de armazenagem, detentions, pré-stacking e antecipação de gates apenas em julho. Desde o início do monitoramento, em 2024, o setor relata R$ 83,061 milhões acumulados com despesas imprevistas ligadas a atrasos e alterações nas escalas.
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O que travou as exportações de café em julho
De acordo com o Cecafé, 51% dos navios que operaram nos principais portos brasileiros em julho sofreram atrasos ou mudanças de escala. Na prática, cada ajuste de janela de atracação encurta prazos de gate, aumenta filas e eleva o risco de rollover de cargas, com contêineres ficando para viagens seguintes.
O Porto de Santos concentrou 80,4% dos embarques de café entre janeiro e julho. Em julho, teve 65% de casos de atraso ou alteração de escala entre 182 porta-contêineres, com espera máxima de 35 dias. O complexo do Rio de Janeiro, segundo maior corredor do café, registrou 37% de atrasos e picos de 40 dias entre o primeiro e o último deadline.
Os números de julho se somam a uma trajetória de estrangamento. Em maio de 2025, por exemplo, ficaram sem embarque 356,3 mil sacas e os custos adicionais chegaram a R$ 2,7 milhões, mostrando que o problema é recorrente e não pontual.
Impacto direto no produtor e na cadeia do café
O diretor técnico do Cecafé, Eduardo Heron, destaca que o Brasil é um dos países que mais repassem o preço FOB ao produtor, com média superior a 90% nos últimos anos. Quando a receita de exportação não entra, o repasse ao cafeicultor diminui, comprimindo margens em toda a cadeia.
Além da perda de competitividade, há efeito reputacional. Atrasos frequentes levam importadores a revisarem contratos, prazos e prêmios, o que pode deslocar compras futuras para origens com logística mais previsível. Setores como cafés especiais sentem ainda mais, porque calendários de torrefação e lançamento são sensíveis ao timing de entrega. (Análise com base nos dados do DTZ e dinâmica do mercado.)
No curto prazo, exportadores absorvem custos extraordinários de armazenagem e detenção. No médio, a ineficiência encarece fretes, reduz janelas de embarque e pressiona o prêmio do café brasileiro nas negociações internacionais, justamente quando a safra aumenta a demanda por contêineres.
Por que o segundo semestre preocupa
O Cecafé projeta piora no segundo semestre de 2025. Com a chegada mais intensa do café recém-colhido e sem aumento de capacidade nos terminais, a pressão sobre pátios e berços tende a crescer. Sem medidas emergenciais, a fila de contêineres pode se estender e o efeito-bola-de-neve sobre custos e prazos se amplificar.
No 1º trimestre deste ano, já havia sinais de saturação: reportagens especializadas apontaram que Santos respondeu por quase 78% dos embarques do período e acumulou 63% de atraso ou alteração de escalas, com espera que chegou a 42 dias. Esses dados ajudam a explicar por que os gargalos se transformaram em perdas bilionárias no meio do ano.
Para o cafeicultor e para a indústria, o recado é claro: sem fluidez logística, preços internos sofrem com o descompasso entre oferta e embarque, e a receita cambial — importante para o caixa do setor — fica travada.
O que está sendo feito, indicadores, articulação e leilões
O Cecafé afirma ter se reunido com o Observatório do Instituto Brasileiro de Infraestrutura (IBI) para aprimorar indicadores logísticos e criar índices de monitoramento específicos para o café. A entidade também cita a parceria com a Logística Brasil e movimentos de advocacy em Brasília para acelerar leilões de terminais e ampliar capacidade de pátio e berços.
Nesse debate, ganhou força o Tecon Santos 10, projeto de megaterminal no Porto de Santos considerado crítico para a consolidação de um hub port. O tema tem sido discutido no TCU e no CADE, e há expectativa de realização do leilão ainda em 2025. A imprensa portuária local reportou ajustes de prazo e tratativas recentes do governo para viabilizar o certame na segunda quinzena de dezembro.
A agenda de discussão pública inclui iniciativas como o portal Porto Livre Brasil, lançado por centros de estudo para qualificar o debate sobre infraestrutura e políticas portuárias, com foco justamente em gargalos de contêineres.
No seu ponto de vista, o que pesa mais nessa crise do café: falta de investimento e gestão nos portos, concentração excessiva em Santos ou previsibilidade ruim das janelas dos armadores? Comente abaixo, queremos ver a sua opinião.