Enquanto capitais europeias enterraram a fiação elétrica há décadas e ganharam cidades mais seguras e organizadas, o Brasil continua com postes abarrotados, redes improvisadas e apagões frequentes.
A fiação elétrica que domina o cenário urbano brasileiro não é apenas uma questão de estética. Ela revela um atraso estrutural na forma como o país organiza sua infraestrutura de energia, telecomunicações e internet. Em cidades europeias como Paris, Madrid e Londres, o processo de enterrar os cabos começou há décadas e transformou o espaço público, tornando o serviço mais confiável e as ruas mais limpas.
No Brasil aconteceu o contrário. Os postes que nasceram para a energia passaram a receber telefonia, TV a cabo, internet e até ligações clandestinas, criando o emaranhado de fios que vemos hoje nas grandes cidades. E mesmo sabendo que uma fiação elétrica subterrânea é mais segura e menos vulnerável a temporais, o país não conseguiu avançar por causa de custos altos, burocracia e falta de planejamento de longo prazo.
Comparação inevitável entre Europa e Brasil

Em cidades como Paris e Madrid o céu está limpo porque a fiação elétrica foi para o subsolo. Lá esse movimento começou no começo do século 20 e foi sendo ampliado ao longo das décadas.
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Enterrar os cabos virou política de Estado, não projeto de um prefeito. Nova York também fez isso depois de uma nevasca em 1888 e hoje tem cerca de 86 por cento da rede enterrada.

No Brasil a cena é inversa. Menos de 1 por cento da malha elétrica está abaixo do solo e os postes viraram suporte de tudo. Cada nova empresa de internet instala seu cabo e nem sempre retira o antigo. Em muitos lugares ainda há ligações irregulares.
É por isso que uma rua periférica de São Paulo parece muito mais poluída visualmente do que uma rua periférica de Madrid mesmo que ambas atendam populações semelhantes.
Por que o Brasil não enterra a fiação elétrica

O primeiro obstáculo é o preço. Um quilômetro de rede aérea custa algo em torno de 100 mil reais enquanto o mesmo trecho enterrado pode chegar a 840 mil reais e em alguns casos passar de 1 milhão e 700 mil.

O cabo subterrâneo precisa de dutos, isolamento, caixas de passagem e equipamentos encapsulados para aguentar umidade, calor e pressão do solo. No poste o ar faz parte do trabalho. Embaixo da terra tudo precisa ser construído.
O segundo obstáculo é o incentivo. As distribuidoras de energia não ganham mais dinheiro por enterrar fio e os governos não ganham voto com obra que fica invisível. Prefeitos preferem praça, viaduto e ponte. Concessionárias preferem expansão de rede. Resultado. A fiação elétrica subterrânea fica sempre para depois.
Burocracia e disputa de competência
São Paulo tentou resolver isso em 2005 com uma lei que obrigava as empresas a enterrar 250 quilômetros de cabos por ano sem repassar o custo ao consumidor. Se tivesse dado certo a capital hoje teria mais de 2 mil quilômetros enterrados.
Só que o sindicato das empresas foi à Justiça e ganhou ao dizer que o município não pode interferir em concessões reguladas pela União. Em 2015 a Justiça federal confirmou esse entendimento.

Depois disso outras cidades que tentaram fazer leis parecidas também foram barradas. Formou-se um impasse.
Com responsabilidades divididas ninguém consegue impor um plano contínuo de enterramento.
Complexidade das obras no subsolo brasileiro
Mesmo quando a obra começa o avanço é lento. A concessionária enterrou apenas 4,2 quilômetros na Vila Olímpia com investimento de 21 milhões de reais o que dá cerca de 5 milhões por quilômetro. As escavações tinham de ser feitas à noite para não travar o trânsito e o subsolo de São Paulo é desorganizado, cheio de dutos sem mapa e interferências não previstas.
O programa SP Sem Fios enterrou pouco mais de 6 quilômetros por ano. Nesse ritmo levaria milhares de anos para enterrar toda a rede aérea da cidade.
Isso mostra que não basta ter dinheiro. É preciso ter planejamento, mapa do subsolo, indústria nacional preparada e continuidade entre governos. Hoje o Brasil não tem essas quatro coisas ao mesmo tempo.
Manter fiação elétrica no alto tem custo humano e econômico
Fios expostos são mais vulneráveis ao clima. A tempestade que atingiu São Paulo em outubro de 2024 com ventos de 107 quilômetros por hora deixou mais de 2 milhões de pessoas sem energia e causou prejuízos bilionários porque árvores caíram sobre cabos. Em rede subterrânea a árvore pode cair, mas a energia não cai junto.
Os acidentes também mostram o perigo. Entre 2009 e 2024 houve dezenas de milhares de ocorrências envolvendo fiação elétrica e de telecomunicações e mais de 4 mil mortes. Ou seja, o caos visual é também um caos de segurança.
O que as cidades ganham ao enterrar os cabos

Quando a fiação elétrica vai para o subsolo a cidade fica mais limpa, a rede fica mais estável e as árvores podem crescer sem poda agressiva. Na União Europeia o consumidor fica em média pouco mais de 12 minutos por ano sem energia enquanto no Brasil a média passa de 10 horas.
Isso é o resultado de décadas de investimento contínuo em manutenção e infraestrutura enterrada.
Além disso o ambiente urbano melhora. Ruas sem fios valorizam imóveis, atraem turismo e tornam o espaço público mais agradável. O brasileiro se acostumou a olhar para cima e ver fios, mas isso não é inevitável. É uma escolha de investimento.
O Brasil continua com fiação elétrica exposta porque o custo de enterrar é muito alto, porque a burocracia impede que municípios mandem fazer, porque o subsolo é desorganizado, porque as empresas não têm incentivo econômico e porque a política prefere obras visíveis.
Enquanto isso seguimos vulneráveis a apagões, a postes abarrotados e a acidentes que poderiam ser evitados se o país adotasse o padrão de Paris, Madrid e Londres.
Na sua opinião o que deveria ser prioridade agora nas cidades brasileiras enterrar de vez a fiação elétrica mesmo sendo caro ou aceitar os fios aparentes e investir esse dinheiro em outras áreas


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