Experimento no Arizona criou floresta, savana e oceano dentro de cápsula ecológica — e mostrou como é difícil viver sem a Terra
No meio do deserto do Arizona, uma construção que parece saída de um filme de ficção científica abriga algo inesperado. Ali dentro, há uma floresta tropical com cachoeira, uma savana, um deserto de névoa e até um oceano com recife de coral. Tudo isso em uma cápsula ecológica de 1,2 hectare. O nome do projeto é Biosfera 2, uma homenagem à Terra, considerada a Biosfera 1.
Nos anos 1990, oito pessoas se isolaram por dois anos dentro da Biosfera 2. A ideia era simular a vida em um sistema fechado e autossuficiente.
Esse tipo de ambiente seria necessário para futuras colônias humanas em Marte ou na Lua. Dentro da estrutura, os moradores cultivavam seus alimentos, reciclavam a água e produziam oxigênio por meio das plantas.
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Mas o experimento logo enfrentou problemas sérios. Com o passar do tempo, os níveis de oxigênio caíram drasticamente. De 21% — o normal no ar que respiramos — o índice despencou para 14%.
Esse valor equivale ao ar em grandes altitudes, acima de 3 mil metros. Isso deixou os participantes fracos. Atividades básicas, como plantar e cuidar dos sistemas, ficaram mais difíceis.
A causa foi o solo usado dentro da cápsula. Ele era muito rico em matéria orgânica. Isso favoreceu o crescimento de fungos e bactérias, que consomem oxigênio e liberam dióxido de carbono.
As plantas ainda jovens não conseguiram equilibrar esse processo. Sem plantas em pleno desenvolvimento, o oxigênio não era reposto na mesma velocidade que era consumido.
Outro problema foi a falta de polinizadores. Abelhas e outros insetos essenciais para a reprodução das plantas desapareceram.
Acredita-se que isso aconteceu por causa de formigas predadoras ou pela ausência de luz ultravioleta, que os insetos usam para enxergar flores.
Para resolver, os moradores precisaram polinizar manualmente algumas espécies vegetais.
Apesar dos contratempos, o projeto gerou aprendizados. Para muitos estudiosos, como a historiadora Lisa Rand, o experimento estava à frente do seu tempo.
Mark Nelson, um dos participantes, disse que viver em um sistema fechado fez todos perceberem como cada parte do ecossistema está ligada à nossa sobrevivência.
A ideia original veio de John Allen e contou com financiamento do bilionário Ed Bass. O custo foi de US$ 150 milhões — o equivalente a mais de R$ 2 bilhões atualmente.
A equipe era formada por generalistas, e não por cientistas tradicionais. Isso gerou críticas. Em um momento, um dos participantes precisou sair após sofrer um corte.
Em outro, foi necessário injetar oxigênio de fora. A mídia tratou o experimento como uma fraude, mesmo sendo uma experiência inédita.
Hoje, a Biosfera 2 pertence à Universidade do Arizona. O local se transformou em um dos maiores centros de pesquisa climática do mundo.
Os cientistas utilizam a estrutura no deserto como uma “máquina do tempo” para entender os impactos do aquecimento global em diferentes ecossistemas.
Estudos atuais mostram que florestas tropicais, por exemplo, resistem melhor ao calor do que se imaginava.
Porém, são muito sensíveis à seca. Em um teste, os pesquisadores simularam uma seca de 70 dias. Algumas árvores conseguiram sobreviver, absorvendo água de camadas profundas do solo.
Também foi descoberto que, em situações de estresse hídrico, certas árvores liberam substâncias que ajudam a formar nuvens de chuva.
No setor marinho da Biosfera 2, os cientistas conseguiram comprovar que o aumento da acidez dos oceanos — causado pela absorção de dióxido de carbono — prejudica o crescimento dos corais.
Atualmente, são feitas pesquisas para tentar fortalecer os corais usando probióticos ou exposição prévia ao calor, como uma forma de adaptação.
Outro ponto interessante é a ausência de vento dentro da estrutura. Com isso, os cientistas perceberam que as árvores crescem mais frágeis.
O vento, ao balançar as plantas, estimula a formação de madeiras mais densas. Já no caso dos corais, os pesquisadores também estudam a necessidade de certos tipos de luz para seu crescimento em cativeiro.
Apesar dos erros técnicos e das críticas, os envolvidos no projeto no deserto nunca consideraram a experiência um fracasso.
Para eles, foi um experimento como qualquer outro: cheio de dificuldades, mas também repleto de descobertas.
Segundo Lisa Rand, o maior erro foi tentar avaliar a Biosfera 2 com os mesmos critérios de projetos científicos tradicionais.
Os custos de um projeto como esse também são altos. O ecologista David Tilman, da Universidade de Minnesota, calcula que manter uma colônia espacial nos moldes da Biosfera 2 custaria cerca de US$ 82,5 mil por pessoa a cada mês.
E isso sem garantir a sobrevivência. Ele afirma que é muito caro tentar recriar o que a Terra já fornece de forma gratuita.
No fim das contas, a principal lição da Biosfera 2 é clara: a vida na Terra é insubstituível. Mark Nelson resume isso dizendo que todos nós somos “biosféricos”. Ou seja, dependemos da saúde dos ecossistemas para continuar existindo.
Hoje, enquanto alguns bilionários sonham em viver fora do planeta, a Biosfera 2 no deserto do Arizona reforça uma ideia simples: é mais sensato — e urgente — cuidar da Terra que já temos.
Com informações de BBC.