De 15 mil funcionários e exportação para 80 países ao fechamento de fábricas: a história da Azaléia, que perdeu a liderança global da indústria calçadista para a concorrência asiática.
Durante décadas, o nome Azaléia foi sinônimo de calçado brasileiro de qualidade, presença global e forte apelo popular. Fundada em 1958 na cidade de Parobé, no Rio Grande do Sul, a empresa cresceu a partir de um galpão modesto até se tornar uma das maiores fabricantes de calçados femininos do planeta, chegando a empregar mais de 15 mil pessoas e exportar para 80 países.
A história da Azaléia é marcada por inovação em design, agressividade comercial e uma rede de produção integrada que se tornou referência para o setor calçadista nacional. Mas também é um exemplo contundente de como a globalização, decisões estratégicas equivocadas e mudanças no perfil de consumo podem derrubar um império industrial consolidado.
O nascimento de uma gigante da indústria calçadista brasileira
A Azaléia começou como uma pequena fábrica de sapatos femininos, fundada por Pedro Grendene Bartelle e outros empreendedores locais, em um momento em que o Vale dos Sinos se consolidava como polo calçadista do Brasil. Combinando mão de obra qualificada e matéria-prima local, a empresa rapidamente expandiu a produção.
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Nos anos 1970 e 1980, a marca se destacou pelo design moderno e preços competitivos, conquistando o público feminino brasileiro. O grande salto veio com a internacionalização: a Azaléia começou a participar de feiras internacionais, fechou contratos com redes varejistas no exterior e abriu escritórios em mercados estratégicos.
A era de ouro: exportações e liderança no mercado
Na década de 1990, a Azaléia era considerada um case de sucesso industrial. Produzia milhões de pares por ano, tinha linhas diversificadas — desde calçados de uso cotidiano até modelos esportivos, com a marca Olympikus — e investia pesado em marketing.
A empresa passou a patrocinar atletas, times de futebol e celebridades, fortalecendo sua presença tanto no mercado interno quanto externo. O ponto alto foi a consolidação como maior exportadora de calçados femininos da América Latina, com presença forte nos EUA, Europa e América do Sul.
Com mais de 30 mil funcionários diretos e indiretos, a Azaléia sustentava a economia de cidades inteiras no interior gaúcho e nordestino, onde mantinha unidades fabris.
O avanço da concorrência asiática e a virada do mercado
A partir dos anos 2000, a indústria calçadista global passou por uma transformação radical. A China e outros países asiáticos passaram a dominar a produção mundial, com custos significativamente menores devido à mão de obra barata, subsídios governamentais e escala de produção incomparável.
Enquanto um par de sapatos brasileiro saía da fábrica custando, em média, US$ 7, o mesmo produto produzido na Ásia podia chegar por menos de US$ 3, mesmo com o frete internacional. Isso afetou diretamente as exportações brasileiras, incluindo as da Azaléia, que viu seus contratos internacionais minguarem.
Além disso, a valorização do real entre 2005 e 2011 encareceu ainda mais os produtos brasileiros no exterior, tornando-os menos competitivos.
Decisões estratégicas e tentativas de adaptação
Para tentar manter competitividade, a Azaléia adotou duas frentes:
- Terceirização e abertura de fábricas no Nordeste, buscando reduzir custos trabalhistas.
- Diversificação de marcas e linhas de produto, investindo na Olympikus e em calçados esportivos, segmento em expansão no Brasil.
No entanto, a terceirização não foi suficiente para competir com a escala e os preços asiáticos, e a Olympikus, apesar de sucesso momentâneo, não conseguiu rivalizar com gigantes globais como Nike, Adidas e Puma no longo prazo.
Em 2007, a Azaléia foi adquirida pelo grupo Vulcabras, numa tentativa de reestruturação e integração operacional. A fusão trouxe ganhos de escala, mas também cortes e fechamento de fábricas.
O fechamento de fábricas e o impacto social
Entre 2010 e 2013, a Azaléia fechou unidades históricas no Rio Grande do Sul e reduziu drasticamente sua força de trabalho. Em 2011, a fábrica de Parobé, que empregava cerca de 800 pessoas, encerrou atividades, gerando forte comoção local.
As cidades dependentes da empresa sofreram com desemprego e queda de arrecadação. Pequenos fornecedores de componentes também foram afetados, e muitos fecharam as portas.
O que antes era um império nacional com presença em mais de 80 países passou a ser uma marca em processo de reposicionamento, muito distante do protagonismo de décadas anteriores.
Mudança de estratégia: foco no mercado interno
Após as perdas no mercado externo, a Azaléia passou a concentrar esforços no público brasileiro, com campanhas mais direcionadas e foco em coleções sazonais. A Olympikus continuou como carro-chefe no segmento esportivo, especialmente com patrocínio a clubes de futebol.
Apesar disso, a marca nunca recuperou a escala global que possuía nos anos 1990 e 2000. Hoje, a Azaléia sobrevive como parte do portfólio da Vulcabras, competindo em um mercado cada vez mais segmentado e digital.
A queda como lição para a indústria nacional
O caso da Azaléia é frequentemente citado como exemplo de como a indústria nacional precisa estar preparada para enfrentar a concorrência global. Mesmo empresas com forte presença de marca e qualidade reconhecida podem perder espaço se não se adaptarem rapidamente às mudanças estruturais do mercado.
A globalização impôs novos padrões de eficiência, velocidade e custo, e o Brasil, com sua carga tributária alta e infraestrutura deficiente, acabou perdendo competitividade em setores manufatureiros tradicionais.
Embora tenha perdido o posto de gigante mundial, a Azaléia ainda mantém presença relevante no Brasil e tenta se reinventar, apostando em coleções alinhadas à moda atual e ao consumo consciente. No entanto, o cenário global ainda é desafiador, e a marca carrega o peso de um passado glorioso que contrasta com a realidade atual.
Usei muito. Se um país não apoia sua indústria ela sucumbe aos chineses. Está acontecendo agora com o aço que a China está despejando no Brasil via governo federal. Casos da Gerdau e Usiminas.