No coração do Rio Grande do Norte, o “Império do Sal Brasileiro” cobre 400 km², produz mais de 4 milhões de toneladas por ano e exporta para vários continentes, consolidando o Nordeste como referência mundial da indústria do sal.
Entre o azul do mar e o sol escaldante do Nordeste brasileiro, existe um território que brilha. Literalmente. São 400 quilômetros quadrados de salinas, tanques cristalinos que refletem o céu onde o sal é produzido em escala industrial e natural, graças à combinação perfeita entre sol, vento e mar.
Esse território, localizado no litoral do Rio Grande do Norte, é conhecido como o maior produtor de sal marinho do Hemisfério Sul, responsável por 95% de todo o sal consumido no Brasil. O chamado “Império do Sal Brasileiro” não dorme. Suas operações funcionam 24 horas por dia, movidas por uma mistura de tecnologia, tradição e a força de milhares de trabalhadores que garantem o abastecimento nacional e as exportações para América Latina, África e Europa.
De Areia Branca a Mossoró: o território que brilha no mapa
O epicentro desse império está entre os municípios de Areia Branca, Mossoró e Grossos, no Rio Grande do Norte. Essas cidades formam o maior polo salineiro das Américas, um complexo industrial que domina o litoral potiguar e transforma o que antes era apenas manguezal em uma verdadeira mina branca a céu aberto.
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De acordo com o Sindicato da Indústria de Extração de Sal do RN (SIESAL) e o IBGE, o estado responde por mais de 4 milhões de toneladas de sal por ano, entre o sal grosso, refinado e iodado — quantidade suficiente para abastecer todo o Brasil e ainda exportar para mais de 20 países.
A ciência do sol e do vento: como o sal nasce no Nordeste
O processo de produção é uma obra-prima da natureza guiada pela engenharia humana. A água do mar é bombeada para tanques rasos, chamados de cristalizadores, onde o sol e o vento fazem o trabalho principal: evaporar a água até que o sal se cristalize naturalmente.
O clima da região é tão propício que, segundo medições do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), o Rio Grande do Norte tem 300 dias de sol por ano, condição que torna o processo mais eficiente e previsível do que em qualquer outro lugar do continente.
Depois da evaporação, o sal é colhido por tratores e empilhadeiras, passa por processos de lavagem e secagem, e segue para as refinarias. Cada cristal de sal potiguar carrega a marca de um equilíbrio quase perfeito entre meio ambiente, tradição artesanal e tecnologia industrial.
O tamanho de uma cidade e a força de um país
O “Império do Sal” tem dimensões de metrópole. São 400 km² de área produtiva, o equivalente a três vezes o tamanho de Belo Horizonte, cobertos por tanques e montanhas de sal que chegam a 10 metros de altura.
O impacto econômico é proporcional: o setor movimenta mais de R$ 2 bilhões por ano, gera 15 mil empregos diretos e indiretos, e sustenta centenas de pequenas e médias empresas que dependem da cadeia salineira.
De acordo com o Ministério de Minas e Energia (MME), o Brasil produz cerca de 5 milhões de toneladas de sal anualmente, e mais de 90% saem do litoral potiguar.
Empresas como Norsal, Sal Cisne e Salina Diamante Branco estão entre as principais exportadoras, consolidando a região como um hub global da indústria mineral não metálica.
Tradição centenária e tecnologia moderna
A exploração do sal no Rio Grande do Norte começou no século XVIII, com métodos rudimentares baseados na evaporação natural. Mas foi no século XX que o setor se transformou em uma potência econômica, com o avanço das técnicas de bombeamento, mecanização da colheita e refino automatizado.
Hoje, as salinas potiguares operam com sistemas de monitoramento por satélite, sensores climáticos e drones, que auxiliam na medição de salinidade, volume de produção e controle ambiental.
A sustentabilidade é outro pilar: parte da energia usada vem de fontes solares e eólicas, duas indústrias que também cresceram no estado impulsionadas pelo mesmo clima que favorece o sal.
Exportações que ultrapassam oceanos
O sal potiguar não se limita ao Brasil. Boa parte da produção é enviada para Chile, Argentina, Uruguai, Nigéria, Portugal e Canadá, onde é usado em processos industriais, derretimento de gelo em rodovias e alimentação animal.
O Porto-Ilha de Areia Branca, uma das infraestruturas mais singulares do país, foi construído exclusivamente para o escoamento do sal e se tornou um marco da engenharia nacional. Ele é o único porto-ilha da América Latina, com capacidade para embarcar mais de 5 mil toneladas por hora, funcionando como elo entre o sertão e o oceano.
Impacto social e cultural: o sal como identidade
Em cidades como Mossoró e Areia Branca, o sal não é apenas uma mercadoria é parte da cultura.
As salinas influenciam desde a gastronomia até o artesanato local, e o setor é um dos principais responsáveis pela infraestrutura urbana, saúde e educação da região.
Muitos trabalhadores são de famílias que há gerações vivem do sal, e o brilho das montanhas brancas se tornou símbolo de trabalho, resistência e prosperidade nordestina.
Eventos como a Feira Nacional do Sal (Fenassal) celebram essa tradição e atraem visitantes e investidores de várias partes do mundo.
O desafio da modernização e do futuro sustentável
Apesar da grandiosidade, o “Império do Sal” enfrenta desafios modernos. A competição com produtores estrangeiros e as exigências ambientais crescentes obrigam o setor a investir em tecnologia e eficiência energética.
Projetos de dessalinização industrial e uso de energia renovável já estão sendo implementados para tornar o ciclo produtivo mais limpo e competitivo.
Empresas locais também firmaram parcerias com universidades e institutos federais para aprimorar a qualidade do produto e desenvolver novas aplicações industriais, como o uso do sal em baterias e purificação de água.
O “Império do Sal Brasileiro” é mais do que um polo industrial — é um exemplo de como o Nordeste se reinventou ao transformar o que antes era apenas mar e sol em uma das maiores forças econômicas do país.
Ele mostra que, sob o calor intenso e o vento constante, o Brasil é capaz de extrair não apenas riqueza, mas também inovação, identidade e futuro.
Com 400 km² de tanques reluzentes, 4 milhões de toneladas de sal por ano e uma engrenagem humana que nunca para, o litoral potiguar permanece como um dos maiores orgulhos da engenharia natural e industrial do Brasil um verdadeiro império branco sob o sol do Nordeste.