Cofco mira compra do Porto São Luís da Cosan. Terminal no Maranhão pode virar porta direta para a Ásia e consolidar o Brasil como epicentro da segurança alimentar chinesa.
O interesse da Cofco International, braço global da estatal chinesa de alimentos, na compra do Porto São Luís reacende um debate que ultrapassa a esfera comercial: trata-se de logística, soberania e segurança alimentar em escala global. O terminal, controlado pela Cosan desde 2021, tem área de 200 hectares e foi planejado para movimentar grãos, fertilizantes e carga geral, integrando-se à Ferrovia Norte-Sul e à Estrada de Ferro Carajás.
Se concretizado, o negócio pode transformar o Maranhão em uma das principais portas de saída do Brasil direto para a Ásia, reduzindo custos logísticos e acelerando o escoamento de safras. Para a China, maior importadora de soja e milho brasileiros, esse seria um movimento estratégico para consolidar o corredor Norte como eixo preferencial de exportação.
A Cosan e os bastidores da negociação
A Cosan adquiriu o controle do Porto São Luís em 2021 por cerca de R$ 720 milhões, mas os avanços na obra foram lentos. Houve até tratativas com a Vale, com cifras que chegaram à casa de R$ 1 bilhão, mas sem concretização.
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Agora, o nome da Cofco surge como candidata natural para assumir o ativo, já que a companhia chinesa opera terminais portuários em Santos (SP) e tem interesse declarado em expandir sua presença no Brasil.
Para a Cosan, uma eventual venda libera capital para investimentos em energia e mineração, setores nos quais a companhia tem redobrado foco. Para a Cofco, seria um salto geopolítico e logístico: assegurar não apenas o acesso direto às safras brasileiras, mas também reduzir a dependência de terceiros em um mercado cada vez mais competitivo.
O Brasil como epicentro da segurança alimentar chinesa
A China responde por mais de 60% das exportações brasileiras de soja e tem ampliado compras de milho e proteínas.
Nos últimos anos, Pequim deixou claro que não quer depender apenas do transporte via Sudeste e Sul — gargalos de infraestrutura, custos elevados e riscos de congestionamento em portos como Santos e Paranaguá pressionam a busca por alternativas.
O corredor Norte, que inclui Itaqui, Barcarena e, potencialmente, o Porto São Luís, é a resposta. Ao investir diretamente em infraestrutura, a Cofco se antecipa a concorrentes globais como ADM, Bunge e Cargill, fortalecendo sua rede logística e assegurando para a China uma rota mais curta e barata até o mercado asiático.
Para analistas, controlar ativos portuários no Brasil é também um gesto de segurança alimentar. Com a instabilidade geopolítica global e a guerra comercial latente com os EUA, Pequim busca garantir que nada interrompa o fluxo de grãos essenciais à sua população.
O impacto no agronegócio e a disputa por logística
Para o Brasil, a chegada da Cofco ao Maranhão pode representar bilhões em investimentos em infraestrutura, geração de empregos e melhoria da competitividade do agronegócio nacional.
O país, que já colhe safras recordes de soja e milho, precisa urgentemente de novos corredores logísticos para evitar gargalos que corroem margens de produtores e exportadores.
No entanto, cresce também o debate sobre a presença chinesa em ativos estratégicos de infraestrutura. Portos, ferrovias e terminais logísticos não são apenas pontos de embarque: são nós críticos da economia. Controlá-los é, de certo modo, controlar a negociação de preços e prazos em cadeias globais.
Empresários brasileiros acompanham com cautela. De um lado, há a vantagem imediata da entrada de capital e da eficiência logística; de outro, o receio de dependência excessiva da China, que já concentra grande parte das exportações nacionais.
Especialistas avaliam o movimento
Segundo o economista e especialista em comércio exterior José Augusto de Castro, “a China não compra apenas commodities; compra também a logística que garante o fluxo contínuo de alimentos. Isso dá a Pequim uma vantagem estratégica em qualquer negociação futura”.
Já para o advogado e analista de infraestrutura Fernando Marcato, “a eventual aquisição do Porto São Luís pela Cofco é plausível e representa o próximo passo lógico da estratégia chinesa no Brasil. A questão é até que ponto o país está preparado para regular essa participação em setores estratégicos”.
Brasil, Cosan e Cofco: um jogo de interesses globais
- Cosan: foca em energia e mineração, aliviando caixa e saindo de um projeto que não avançou no ritmo esperado.
- Cofco: fortalece o corredor Norte e aproxima o Brasil da China, garantindo escoamento direto das safras para o mercado asiático.
- Brasil: recebe investimentos, mas precisa equilibrar ganhos de curto prazo com os riscos de entregar infraestrutura estratégica a uma potência estrangeira.
Quem domina a logística, domina o jogo
O possível avanço da Cofco sobre o Porto São Luís mostra, mais uma vez, que no agronegócio global não é quem produz mais que dita as regras, mas quem controla os corredores logísticos e os portos estratégicos.
Se confirmada, a transação consolidará o Brasil como epicentro da segurança alimentar chinesa, ao mesmo tempo em que reacenderá o debate sobre a presença estrangeira em setores vitais.
Para empresários e produtores, a lição é clara: quem domina a logística, domina a negociação.