China enaltece o sabor do café brasileiro justo quando os EUA impõem tarifas — coincidência ou oportunidade bem calculada?
As relações comerciais entre Brasil e Estados Unidos entraram em um novo período de tensão. Nesta quarta-feira, entraram em vigor as tarifas de 50% impostas pelo ex-presidente Donald Trump sobre produtos brasileiros, com foco especial no café — uma das principais exportações do país ao mercado norte-americano. A medida provocou reações imediatas no cenário diplomático e abriu espaço para que a China intensificasse sua aproximação com o Brasil, com direito a elogios públicos ao café nacional.
China reage com ironia e investe em mais empresas brasileiras
A embaixada chinesa no Brasil foi rápida em aproveitar o momento. Publicou nas redes sociais um vídeo exaltando o café brasileiro, mencionando o “queridíssimo café do Brasil” como símbolo da relação entre os dois países. A publicação também destacou a presença crescente de empresas chinesas em território nacional, como a Meituan — gigante do setor de entregas — e reforçou que a relação bilateral é de “mão dupla”, com o café nacional ganhando cada vez mais espaço no cotidiano dos chineses.
Mas a mensagem foi além da retórica diplomática. Dias antes, a própria embaixada havia informado que a China aprovou a habilitação de 183 novas empresas brasileiras para exportação de café ao seu mercado. A autorização tem validade de cinco anos e representa um passo importante para consolidar o Brasil como um fornecedor estratégico em um setor que ganha força no país asiático.
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Em outro comunicado, a representação chinesa ressaltou que o consumo de café na China tem crescido de forma contínua e ainda apresenta enorme margem de expansão em relação à média global. “O café brasileiro vem ganhando espaço no dia a dia dos chineses”, afirmou o texto.
Café: o elo entre Brasil e EUA que agora está sob ameaça
A decisão de Trump atinge diretamente um dos pilares da balança comercial entre Brasil e Estados Unidos. Em 2024, o Brasil foi responsável por 30,7% das 1,5 milhão de toneladas métricas de café importadas pelos norte-americanos, consolidando-se como seu principal fornecedor.
Para se ter uma ideia da relevância desse mercado, cerca de 66% dos adultos nos Estados Unidos consomem café diariamente, superando inclusive o consumo de água engarrafada. Com a nova tarifa de 50%, o preço do café brasileiro tende a subir, o que pode reduzir sua competitividade e abrir espaço para concorrentes de outros países.
Pressão política e acusações entre governos
O decreto assinado por Donald Trump que estabelece o novo esquema tarifário não se limita a questões econômicas. No documento, o ex-presidente acusa o governo brasileiro de “graves violações de direitos humanos” e afirma que essas supostas ações estariam enfraquecendo o Estado de Direito no país.
A publicação do decreto aconteceu poucos dias após Trump enviar uma carta formal exigindo o fim do processo judicial contra Jair Bolsonaro. Na carta, o ex-presidente dos Estados Unidos chegou a acusar o governo Lula de realizar uma “caça às bruxas” contra seu aliado político, atualmente réu por suposto envolvimento em uma tentativa de golpe de Estado. A pressão gerou forte repercussão tanto na esfera diplomática quanto no meio político nacional.
Em resposta, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o Brasil deve ser tratado de forma igualitária em qualquer negociação com os Estados Unidos e destacou que há um “limite para a discussão” com a atual postura de Trump. O governo brasileiro prometeu anunciar medidas em reação às tarifas, mas ainda não divulgou quais serão as ações concretas.
China se apresenta como alternativa estratégica
Enquanto Washington impõe barreiras, Pequim se posiciona como parceira disposta a ampliar sua influência na América do Sul. Durante coletiva de imprensa nesta quarta-feira, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Guo Jiakun, afirmou que a cooperação entre China e Brasil tem trazido benefícios concretos para ambos os povos. Ele reforçou ainda que o país está comprometido em aprofundar os vínculos com o Brasil “em diversos âmbitos” e acrescentar “novas dimensões estratégicas” à parceria.
Com a habilitação de quase duas centenas de novas empresas brasileiras para exportar café e a valorização simbólica do produto nacional, a China dá sinais claros de que pretende preencher o vácuo que pode ser deixado pelos Estados Unidos, caso o atrito comercial se prolongue.