China e União Europeia disputam liderança no hidrogênio verde do Brasil. Europa financia portos, chineses fornecem eletrolisadores e ambos miram trilhões até 2050.
Em pleno 2025, o Brasil volta a ser protagonista em uma disputa geopolítica que promete redefinir a matriz energética mundial. Desta vez, o embate não gira em torno do petróleo do pré-sal ou da soja do Centro-Oeste, mas sim de um novo ativo considerado o “combustível do futuro”: o hidrogênio verde.
Com potencial para substituir combustíveis fósseis em setores de difícil descarbonização, como siderurgia, transporte pesado e indústria química, o hidrogênio verde pode movimentar trilhões de dólares até 2050, segundo projeções da Agência Internacional de Energia (IEA). E é justamente nesse contexto que China e União Europeia se enfrentam pela liderança no Brasil, enxergado como uma potência natural para produzir energia limpa em escala graças ao sol abundante e ao vento constante no Nordeste.
Europa aposta em financiamento e diplomacia verde
A União Europeia vem se posicionando como a principal financiadora da infraestrutura necessária para transformar o Brasil em exportador de hidrogênio verde e derivados. O Porto do Pecém, no Ceará, já conta com apoio do Banco Mundial e da Alemanha, por meio de programas como o H2Brasil, gerido em parceria com a GIZ (Agência Alemã de Cooperação Internacional).
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Na prática, isso significa recursos e expertise para adaptar píeres, criar áreas exclusivas para o armazenamento de amônia — principal derivado do hidrogênio para transporte marítimo — e firmar contratos de longo prazo com importadores europeus. Além disso, a Holanda, por meio do Porto de Roterdã, já mantém acordos diretos com Pecém, estabelecendo corredores de exportação que podem ligar o Nordeste brasileiro ao maior hub logístico da Europa.
A estratégia europeia é clara: garantir, desde já, o fornecimento de energia limpa para atender às metas de neutralidade de carbono até 2050, ao mesmo tempo em que assegura independência energética diante da crise do gás russo.
China entra em cena com tecnologia e equipamentos
Se os europeus apostam no financiamento e em contratos de longo prazo, a China avança com tecnologia e escala industrial. Empresas chinesas como Envision e Mingyang já assinaram memorandos para fornecer eletrolisadores de grande porte — equipamentos responsáveis por transformar água em hidrogênio a partir de energia renovável.
Além disso, gigantes estatais chinesas, como a SPIC (State Power Investment Corporation), já possuem projetos no Nordeste brasileiro que integram parques solares, eólicos e plantas de hidrogênio. Um dos exemplos é o megacomplexo de 500 MW no Porto do Pecém, voltado à produção de amônia verde, cuja meta é abastecer tanto o mercado interno quanto clientes no exterior.
A estratégia chinesa é dominar a cadeia de suprimentos, oferecendo equipamentos mais baratos que os europeus e, assim, consolidando sua presença como fornecedora indispensável para a expansão do hidrogênio verde no Brasil.
Pecém e Suape: a nova fronteira da transição energética
O palco principal dessa disputa é o Nordeste, em especial os portos de Pecém (Ceará) e Suape (Pernambuco). Ambos estão em processo de transformação para se tornarem hubs de exportação de hidrogênio verde e derivados.
- Pecém (CE): conta com parcerias com o Banco Mundial, Alemanha e China. Já atraiu dezenas de memorandos de entendimento com multinacionais.
- Suape (PE): abriga projetos de produção de e-metanol, com investimento de mais de R$ 2 bilhões, além de memorandos assinados com empresas europeias e asiáticas.
Esses complexos são vistos como portas de saída do hidrogênio verde brasileiro para o mundo, com capacidade de transformar a região em epicentro da nova corrida energética global.
A ‘guerra’ silenciosa de contratos e diplomacia
Enquanto Europa e China avançam, o Brasil precisa equilibrar interesses. A União Europeia oferece acesso a seu mercado premium, disposto a pagar mais por energia limpa certificada. A China, por outro lado, traz equipamentos de menor custo e investimentos diretos, acelerando a construção das primeiras plantas industriais.
Trata-se de uma guerra silenciosa de contratos e diplomacia, em que cada memorando assinado por um estado brasileiro pode significar bilhões em exportações futuras. Essa disputa também reflete a tentativa de cada bloco de se aproximar do Brasil não apenas como fornecedor de energia, mas como aliado estratégico em um mundo cada vez mais dividido entre potências.
O risco de ser apenas exportador bruto
Apesar da euforia com os anúncios, especialistas alertam para um risco real: o Brasil pode repetir o erro histórico do minério de ferro e do petróleo, tornando-se apenas exportador de matéria-prima barata sem agregar valor à cadeia produtiva.
Produzir amônia e enviá-la ao exterior é lucrativo, mas gera muito menos valor do que investir em siderurgia verde, fertilizantes sustentáveis ou combustíveis sintéticos dentro do território nacional. Nesse sentido, tanto União Europeia quanto China buscam assegurar seu próprio valor agregado fora do Brasil, deixando o país como fornecedor básico de energia limpa.
O Brasil diante da oportunidade histórica
O momento é decisivo. Com US$ 30 bilhões em projetos anunciados até 2030, o Brasil pode escolher entre ser apenas o “celeiro energético” do mundo ou se consolidar como líder global em inovação verde. Isso exige políticas públicas robustas, incentivos à indústria nacional e acordos que priorizem transferência de tecnologia e desenvolvimento local.
Se souber negociar, o Brasil terá não apenas exportações bilionárias, mas também uma nova matriz produtiva baseada em siderurgia de baixo carbono, transporte limpo e fertilizantes sustentáveis. Caso contrário, pode ficar preso ao papel de fornecedor periférico em uma cadeia dominada por China e União Europeia.
A disputa pelo hidrogênio verde mostra que o Brasil voltou a ser peça-chave no tabuleiro geopolítico global. China e União Europeia enxergam no Nordeste brasileiro a chance de garantir energia limpa e segura para suas economias até 2050.
O que está em jogo não é apenas um novo combustível, mas o futuro da indústria, do comércio e da posição estratégica do Brasil no século XXI. Entre promessas bilionárias e riscos de exploração, o país precisa decidir: será protagonista da transição energética ou apenas mais um fornecedor de insumos em um mercado dominado por outros.