Cinco gigantes corporativas brasileiras: Petrobras, Vale, Suzano, Eletrobras e Marfrig já somam R$ 690 bilhões em dívidas, valor superior ao PIB de vários países e reflexo da concentração financeira no país.
Mesmo com lucros expressivos e operações bilionárias, parte das maiores companhias do Brasil vive um paradoxo econômico: ostentam resultados grandiosos, mas sustentam dívidas que superam o PIB de dezenas de países. Segundo levantamentos de mercado da B3, relatórios financeiros e dados consolidados pela Economatica e pela consultoria TradeMap, Petrobras, Vale, Suzano, Eletrobras e Marfrig figuram entre as campeãs de endividamento corporativo no país, acumulando juntas mais de R$ 690 bilhões em dívidas brutas.
O número impressiona e revela a estrutura concentrada da economia brasileira, onde poucos grupos dominam o crédito, os investimentos e o risco financeiro.
Petrobras: o colosso que deve, mas também entrega lucros recordes
Na liderança do ranking está a Petrobras, que encerrou 2024 com dívida bruta superior a R$ 282 bilhões, segundo o balanço da própria companhia.
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Mesmo após reduzir significativamente o endividamento em relação ao pico de 2015 (quando ultrapassava R$ 500 bilhões), a estatal ainda responde por cerca de 40% da dívida total das 100 maiores empresas listadas na B3.
O peso financeiro, entretanto, vem acompanhado de uma rentabilidade igualmente robusta: a Petrobras segue como a empresa mais lucrativa da América Latina, com mais de R$ 124 bilhões de lucro líquido em 2024, impulsionada pela exportação de petróleo e derivados.
O endividamento elevado se deve, em parte, à estrutura de capital intensiva em investimentos e à política de dividendos agressiva adotada nos últimos anos, que drenou parte do caixa para acionistas e reduziu margem para amortização antecipada.
Vale: expansão global e dívida que ainda assombra
Logo atrás vem a Vale, gigante da mineração com dívida bruta próxima de R$ 130 bilhões. A empresa mantém uma posição financeira sólida e boa geração de caixa, mas ainda carrega passivos expressivos, em especial após os desembolsos bilionários ligados às indenizações e obras de reparação pelos desastres de Mariana e Brumadinho.
A companhia tem buscado reposicionar sua estrutura financeira, alongando prazos e investindo em descarbonização e mineração sustentável, mas segue exposta à volatilidade dos preços do minério de ferro que ainda representam mais de 70% da receita.
A dívida, embora controlada, mostra como o modelo de grande capital intensivo torna empresas brasileiras dependentes de crédito externo e vulneráveis a oscilações cambiais.
Suzano: a campeã do papel e celulose que opera com alavancagem alta
A Suzano S.A., maior produtora de celulose do mundo, figura em terceiro lugar, com R$ 98 bilhões em dívida bruta segundo o relatório do 2º trimestre de 2025. Diferente das demais, a Suzano utiliza a dívida como ferramenta estratégica financiando expansão e fusões, como a aquisição da Kimberly-Clark no Brasil e novos projetos industriais no Maranhão e Espírito Santo.
Boa parte dos passivos está indexada em dólar, já que a empresa é fortemente exportadora e opera com receita cambial superior a 80%. Esse modelo protege parcialmente os riscos financeiros, mas eleva o valor contábil da dívida quando o real se desvaloriza.
Mesmo assim, a Suzano mantém lucros consistentes e alta liquidez, reforçando a tese de que dívida elevada nem sempre é sinal de fragilidade — mas sim de aposta agressiva em crescimento.
Eletrobras: privatizada e ainda buscando equilíbrio
A Eletrobras, privatizada em 2022, carrega dívida bruta estimada em R$ 88 bilhões, um dos maiores montantes entre as companhias de energia da América Latina. Parte desse volume vem de empréstimos herdados antes da capitalização e de aportes para modernização de usinas e linhas de transmissão.
Após a privatização, a empresa busca reduzir custos e melhorar eficiência operacional, mas enfrenta desafios estruturais, como judicializações sobre contratos e pressões tarifárias.
A expectativa do mercado é que, com a recuperação do setor elétrico e o avanço dos projetos de energia renovável, a Eletrobras consiga reduzir sua alavancagem nos próximos anos ainda assim, o tamanho da dívida reforça o peso que o setor energético tem sobre o sistema financeiro nacional.
Marfrig: a gigante da carne que opera no fio da navalha
Fechando o top 5, aparece a Marfrig Global Foods, uma das maiores exportadoras de proteína animal do planeta, com R$ 60 bilhões em dívidas brutas.
A empresa expandiu agressivamente suas operações entre 2020 e 2023, adquirindo fatias da BRF e investindo em plantas industriais nos Estados Unidos e América do Sul.
Com o setor enfrentando margens menores e forte competição internacional, a Marfrig viu a relação dívida líquida/Ebitda subir além do desejado, o que preocupa analistas. Mesmo assim, a companhia ainda apresenta lucro operacional consistente e um portfólio diversificado, o que lhe permite sustentar o endividamento sem risco imediato de colapso financeiro.
Um retrato da economia brasileira
O levantamento revela uma contradição que define o capitalismo brasileiro contemporâneo: as empresas mais lucrativas também são as mais endividadas. Isso ocorre porque grande parte das corporações opera em setores de capital intensivo do petróleo, mineração, celulose, energia e proteína, que exigem investimentos de longo prazo e dependem de financiamentos pesados, muitas vezes atrelados ao dólar.
Segundo economistas da FGV e do Insper, essa dinâmica explica por que o país tem um dos maiores volumes de dívida corporativa da América Latina, mas, ao mesmo tempo, baixa taxa de investimento produtivo interno.
Enquanto a rentabilidade flui para o exterior via dividendos, o crédito é concentrado em poucos conglomerados, reduzindo o espaço para médias empresas crescerem.
Dívidas maiores que PIBs nacionais
O volume de R$ 690 bilhões ultrapassa o PIB de países como Uruguai, Paraguai e Bolívia somados. Apenas a Petrobras, sozinha, tem uma dívida superior a todo o produto interno bruto do Uruguai.
O número evidencia como o sistema financeiro brasileiro está concentrado em poucos grupos que, apesar de sustentarem a economia, também carregam riscos sistêmicos em caso de choque global ou elevação abrupta de juros.
Especialistas alertam que a política de juros altos dos últimos anos encarece o serviço dessas dívidas e restringe novos investimentos.
Com a Selic ainda elevada e a desaceleração do crédito global, muitas dessas empresas adotam estratégias de alongamento de prazos e emissão de títulos no exterior, o que aumenta a exposição cambial e pode criar vulnerabilidades futuras.