Decisões inspiradas no Consenso de Washington moldaram o país nas últimas décadas com ganhos e perdas que ainda dividem especialistas
Nos anos 1990, a economia do Brasil passou por um choque de reformas inspirado no chamado Consenso de Washington, um conjunto de dez diretrizes criadas em 1989 para lidar com a crise latino-americana. A promessa era estabilizar moedas, atrair investimentos e integrar países emergentes ao comércio global.
O pacote incluía medidas como disciplina fiscal, privatizações, abertura comercial e câmbio competitivo. Embora tenha ajudado a conter a hiperinflação e impulsionar a entrada de capital estrangeiro, também gerou efeitos colaterais duradouros, como desindustrialização e aumento da desigualdade.
O que foi o Consenso de Washington
O termo foi cunhado pelo economista britânico John Williamson para descrever um “mínimo denominador comum” de políticas defendidas por instituições como o FMI, Banco Mundial e Departamento do Tesouro dos EUA. Criado no auge da hiperinflação no Brasil e na Argentina, o consenso buscava estabilizar economias endividadas e integrá-las ao sistema global.
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Na prática, as recomendações eram mais do que meros conselhos. Países que as adotavam tinham mais acesso a crédito internacional e condições favoráveis de renegociação de dívidas. No caso brasileiro, essas ideias começaram a ganhar força ainda no governo Collor e se consolidaram na gestão Fernando Henrique Cardoso.
As 10 regras que guiaram a economia brasileira
As diretrizes propostas pelo Consenso de Washington ficaram conhecidas como “10 mandamentos” econômicos:
- Disciplina fiscal – controle do déficit público e relação dívida/PIB.
- Redirecionamento de gastos – cortes em subsídios e priorização de saúde, educação e infraestrutura.
- Reforma tributária – simplificação de impostos e ampliação da base de arrecadação.
- Taxas de juros de mercado – evitando controles artificiais e atraindo capital externo.
- Câmbio competitivo – incentivo a exportações e prevenção de sobrevalorização da moeda.
- Abertura comercial gradual – redução previsível de tarifas de importação.
- Liberalização do investimento estrangeiro – facilitação da entrada de capital produtivo.
- Privatizações – transferência de estatais para a iniciativa privada.
- Desregulamentação – redução de barreiras para abertura e operação de empresas.
- Garantia de direitos de propriedade – segurança jurídica para contratos e patentes.
Essas medidas, embora oficialmente não obrigatórias, vinham acompanhadas da expectativa implícita de que o não cumprimento poderia dificultar a liberação de recursos internacionais.
Impactos positivos na economia do Brasil
A adoção dessas regras ajudou o país a reduzir drasticamente a inflação com o Plano Real, estabilizar a moeda e atrair investimentos estrangeiros, especialmente nos setores de telecomunicações e energia.
Também houve um aumento da participação brasileira no mercado financeiro internacional. Hoje, mais de 50% das negociações na B3 envolvem capital estrangeiro, e títulos públicos continuam sendo comprados por investidores de fora, fortalecendo a liquidez do Tesouro Nacional.
Os efeitos colaterais e as críticas
Apesar dos ganhos, os resultados não foram uniformes. A economia do Brasil passou por um processo de desindustrialização: a participação da indústria no PIB caiu de 27% em 1986 para 11% em 2018. A desigualdade social se agravou, com a renda se concentrando ainda mais no topo.
Além disso, críticos apontam que as privatizações favoreceram monopólios privados e, em alguns casos, envolveram valores considerados abaixo do mercado como a venda da Vale por R$ 3,3 bilhões em 1997. Autores como Ha-Joon Chang, no livro Chutando a Escada, afirmam que países ricos usaram estratégias estatais para crescer, mas recomendaram políticas liberais a nações em desenvolvimento, criando uma barreira implícita à sua ascensão.
O que veio depois
A partir dos anos 2000, parte da América Latina começou a rever ou romper com o modelo. Governos de esquerda como Lula no Brasil, Hugo Chávez na Venezuela e Evo Morales na Bolívia buscaram políticas mais heterodoxas, priorizando programas sociais e maior intervenção estatal.
O FMI, por sua vez, abandonou a cartilha rígida e passou a recomendar soluções adaptadas à realidade local. Países como a Malásia, que rejeitaram as regras na crise asiática de 1997, obtiveram recuperação mais rápida que vizinhos que seguiram as orientações à risca.
O legado para a economia brasileira
Hoje, muitos instrumentos do Consenso de Washington ainda moldam a política econômica brasileira, como o tripé macroeconômico (meta de inflação, câmbio flutuante e superávit primário). Ao mesmo tempo, o debate sobre o papel do Estado e do mercado segue aberto com defensores e críticos apontando caminhos opostos para o futuro.
Você concorda com essas mudanças na economia do Brasil? Acredita que elas ajudaram ou prejudicaram o país a longo prazo? Deixe sua opinião nos comentários queremos ouvir quem viveu ou estuda essa transformação de perto.