Em meio a tensões comerciais, líderes do Brics se reuniram virtualmente nesta segunda-feira (8) sob comando do Brasil para discutir riscos do unilateralismo, defender o multilateralismo e reforçar a cooperação econômica e política entre os países do bloco.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva conduziu nesta segunda-feira (8) uma reunião virtual de líderes do Brics, grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, além de países convidados, assim como havia adiantado pela manhã o portal CPG.
O encontro ocorreu em meio ao aumento de tensões comerciais, após medidas tarifárias impostas pelos Estados Unidos, e teve como pauta central a defesa do multilateralismo e de uma ordem internacional mais equilibrada.
Segundo o Palácio do Planalto, o debate durou cerca de uma hora e meia e abordou riscos de medidas unilaterais, impactos do protecionismo e caminhos para fortalecer a cooperação econômica dentro do bloco.
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A presidência do Brics está atualmente sob comando brasileiro, o que deu a Lula papel de articulador do encontro.
Defesa do multilateralismo e crítica ao protecionismo
Na abertura, Lula afirmou que o Brics já demonstrou capacidade de apresentar soluções concretas para dilemas globais, citando decisões recentes sobre mudança climática, saúde global, governança da inteligência artificial e integração comercial.
“Passados apenas dois meses da Cúpula do Rio de Janeiro, vivemos um momento de crescente instabilidade. Está cada vez mais claro que a crise de governança não é uma questão conjuntural. Os pilares da ordem internacional criada em 1945 estão sendo solapados de forma acelerada e irresponsável”, disse o presidente.
O brasileiro criticou diretamente a paralisia da Organização Mundial do Comércio (OMC) e a imposição de tarifas unilaterais que, segundo ele, enterraram princípios básicos como as cláusulas de Nação Mais Favorecida e de Tratamento Nacional.
“A chantagem tarifária está sendo normalizada como instrumento para conquista de mercados e para interferir em questões domésticas”, afirmou.
Integração econômica como resposta
Lula defendeu que a integração financeira e comercial entre os países do Brics é uma alternativa para reduzir efeitos do protecionismo global.
Ele destacou o peso do bloco, responsável por 40% do PIB mundial, 26% do comércio internacional e quase metade da população do planeta.
“Temos entre nós grandes exportadores e consumidores de energia. Reunimos as condições necessárias para promover uma industrialização verde, que gere emprego e renda, sobretudo nos setores de alta tecnologia”, ressaltou.
O presidente também valorizou o papel do Banco do Brics, apontando a instituição como fundamental para diversificar as economias do grupo e apoiar uma transição justa.
Ucrânia, Oriente Médio e segurança internacional
Além da pauta econômica, a reunião tratou de conflitos internacionais.
Lula afirmou que a guerra na Ucrânia exige uma solução realista, que leve em conta as preocupações de segurança de todas as partes.
Ele citou iniciativas da África e o Grupo de Amigos para a Paz, formado por Brasil e China, como alternativas diplomáticas.
O presidente também condenou as ações de Israel na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, classificando-as como ameaça de anexação e como parte de um “genocídio em curso” contra os palestinos.
Ele lembrou que o Brasil aderiu à ação movida pela África do Sul contra Israel na Corte Internacional de Justiça.
“No vazio de tantas crises não solucionadas, o terrorismo continua a assombrar a humanidade. Sabemos que o terrorismo não está associado a nenhuma religião ou nacionalidade e não pode ser confundido com desafios de segurança pública”, completou.
Agenda internacional e reformas institucionais
O encontro também serviu como preparação para a 80ª Assembleia Geral da ONU, que começa em 23 de setembro em Nova York, além da COP30, marcada para novembro em Belém, e da cúpula do G20, prevista para o fim do mesmo mês em Brasília.
Lula defendeu a ampliação do Conselho de Segurança da ONU, com inclusão de países da América Latina, África e Ásia.
Também propôs maior governança no ambiente digital e a criação de um Conselho de Mudança do Clima da ONU, além de destacar o projeto brasileiro de lançar o Fundo Florestas Tropicais para Sempre durante a COP30.
“Sem soberania digital, seremos vulneráveis à manipulação estrangeira. O impacto do unilateralismo também é grave na esfera ambiental. O Brasil convida seus parceiros do Brics a considerar a criação de um Conselho de Mudança do Clima da ONU”, disse.
Participação ampliada
Estiveram presentes, além de China, Rússia, Índia e África do Sul, representantes de novos membros do grupo e países convidados, como Egito, Irã, Indonésia, Etiópia e Emirados Árabes Unidos.
No encerramento, Lula afirmou que o Brics se consolidou como uma força de defesa do multilateralismo e como voz ativa do Sul Global.
“Temos a legitimidade necessária para liderar a refundação do sistema multilateral de comércio em bases modernas, flexíveis e voltadas às nossas necessidades de desenvolvimento”, concluiu.
A reunião reforçou a posição do Brasil de confrontar medidas unilaterais e de buscar maior cooperação internacional.
A questão que permanece é: até que ponto o Brics conseguirá transformar esse discurso em ações concretas diante do cenário global cada vez mais fragmentado?