O industrial Menotti Falchi foi a primeira pessoa a tirar CNH no Brasil, em 1904, e as socialites Virginia Lowndes e Maria Andréa Patureau de Oliveira, em 1906, foram os pioneiros a obter licença para dirigir, em uma época em que o documento era municipal e o automóvel, um símbolo de poder.
A história da primeira pessoa a tirar CNH no Brasil nos leva a uma viagem no tempo, para o início do século XX. Foi uma era de grandes transformações, em que o automóvel chegava às ruas de paralelepípedos como um símbolo de modernidade e status, dividindo espaço com bondes e carroças.
Nessa época, não tinha como comprar habilitação, como a conhecemos hoje. O que havia era uma “licença de chauffeur”, um documento municipal que atestava a perícia de poucos privilegiados. A história desses pioneiros é o retrato da elite que abraçou a modernidade e da rivalidade entre Rio de Janeiro e São Paulo para ver quem liderava o progresso no país.
O cenário da Belle Époque brasileira: o carro chega às ruas (1891-1903)
A história do automóvel no Brasil começa oficialmente em 1891, quando o inventor Alberto Santos Dumont importou da França o primeiro veículo com motor a explosão, um Peugeot Type 3. Naquela época, o carro era um artigo de luxo extremo, acessível apenas a uma minúscula elite.
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Nos primeiros anos do século XX, com o Brasil vivendo sua Belle Époque, o automóvel se tornou um potente símbolo de status para a nova elite industrial e cafeeira. Não por acaso, o primeiro emplacamento registrado na cidade de São Paulo, em 1903, foi o do veículo do Conde Francisco Matarazzo, um dos maiores industriais do país. Nesse período, não havia uma legislação de trânsito nacional, e cada município criava suas próprias regras para controlar a circulação dos novos e barulhentos veículos.
O primeiro habilitado de São Paulo: o industrial Menotti Falchi em 1904
Com o aumento do número de carros, a Prefeitura de São Paulo instituiu, por meio de uma lei municipal de 1904, o “exame para motoristas”. Fontes históricas confirmam que, nesse mesmo ano, a primeira “carta de habilitação” da cidade foi emitida para Menotti Falchi.
Falchi era uma figura proeminente na sociedade paulistana. Membro de uma importante família de imigrantes italianos, ele era proprietário da famosa Fábrica de Chocolates Falchi, fundada em 1885. Além de industrial, era uma figura ativa na comunidade, tendo sido presidente do Palestra Italia (que se tornaria o Palmeiras) e um dos fundadores do Hospital Umberto I, o Hospital Matarazzo. Ser o primeiro cidadão oficialmente licenciado para dirigir era uma demonstração do poder e da modernidade da nova elite industrial que moldava São Paulo.
A disputa pela primeira mulher ao volante: Rio vs. São Paulo em 1906
A história da primeira mulher habilitada no Brasil é um reflexo da acirrada rivalidade cultural entre Rio de Janeiro e São Paulo. No início de 1906, jornais da capital federal, o Rio de Janeiro, noticiaram com grande destaque que a socialite Virginia Lowndes havia se tornado a primeira “chauffeuse” (o termo feminino para motorista na época) do país, após ser aprovada no exame da fiscalização de veículos local.
A primazia carioca, no entanto, foi imediatamente contestada. Poucos dias depois, o jornal paulistano “Diário Popular” publicou uma matéria reivindicando o pioneirismo para São Paulo. O jornal afirmou que Maria Andréa Patureau de Oliveira havia obtido sua licença em março de 1906. Não há um consenso histórico que encerre a disputa, mas o episódio ilustra como as duas cidades competiam pelo status de vanguarda e modernidade no início da República.
A longa estrada até a CNH: a evolução do documento (1941-1997)
O documento que esses pioneiros receberam estava longe de ser a CNH que temos hoje. A unificação da legislação de trânsito só começou a acontecer de forma mais séria na Era Vargas, com o primeiro Código Nacional de Trânsito, instituído em 1941.
O nome “Carteira Nacional de Habilitação (CNH)” só foi criado oficialmente em 1966, com um novo código. Um fato curioso é que, a partir de 1981, o documento (então chamado de PGU) passou a ser emitido sem a foto do motorista, exigindo a apresentação do RG para ter validade. A CNH como a conhecemos hoje, com foto e válida como documento de identidade em todo o território nacional, só surgiu com o Código de Trânsito Brasileiro de 1997, que entrou em vigor em 1998.
O veredito dos fatos: quem foram os verdadeiros pioneiros?
A análise histórica confirma que Menotti Falchi foi o primeiro homem a receber uma licença para dirigir em São Paulo, em 1904. Já o título de primeira pessoa a tirar CNH no Brasil, na categoria feminina, é disputado. É mais preciso dizer que Virginia Lowndes (no Rio) e Maria Andréa Patureau de Oliveira (em São Paulo) foram as pioneiras que, em 1906, abriram caminho para as mulheres ao volante, cada uma em sua respectiva capital.