Uma empresa chinesa assumiu dois campos no Lago de Maracaibo e promete investir mais de US$ 1 bilhão para elevar a produção a 60 mil barris por dia até o fim de 2026, usando um modelo contratual criado para operar sob sanções dos EUA.
A China Concord Resources Corp (CCRC) iniciou o desenvolvimento dos campos Lago Cinco e Lagunillas Lago, no Lago de Maracaibo, na Venezuela, com um plano de investimento superior a US$ 1 bilhão e meta de 60 mil barris diários de petróleo até o fim de 2026. Segundo reportagem da Reuters publicada em 22 de agosto de 2025, essa é uma das raras incursões de uma empresa privada chinesa no setor venezuelano, historicamente dominado por parcerias estatais.
O contrato de partilha de produção, assinado em maio de 2024, dá à CCRC a operação dos ativos por 20 anos, em um arranjo desenhado para atrair capital mesmo sob restrições internacionais. A iniciativa surge num momento em que a PDVSA tenta reativar áreas maduras e recuperar a capacidade de extração após anos de queda de investimento.
O projeto começou com o envio de equipe e equipamento para reativar poços que hoje rendem cerca de 12 mil barris por dia, com um plano de até 500 poços ao longo da rampa de produção. A proposta inclui uso do óleo leve para refino local e exportação do óleo pesado para a China, hoje principal destino do petróleo venezuelano.
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Como funciona o contrato de partilha e por que ele se tornou a saída legal para a Venezuela em meio às sanções
A base jurídica do acordo está na chamada Lei Antibloqueio, aprovada em 2020. Essa norma criou um regime excepcional que permite ao governo firmar contratos de partilha de produção com condições mais flexíveis, inclusive confidenciais, para viabilizar investimentos estrangeiros em setores estratégicos como o petróleo. Na prática, a lei autoriza que parceiros privados atuem como operadores e recebam parte do óleo produzido como remuneração.
Analistas apontam que os CPPs marcam uma mudança relevante em relação ao antigo modelo de empresas mistas. O objetivo é acelerar a entrada de capital e tecnologia para recuperar a produção da OPEP venezuelana, ao mesmo tempo em que se contorna o ambiente de sanções. Há, porém, críticas quanto à transparência, já que dispositivos do marco antibloqueio permitem cláusulas e termos de difícil escrutínio público.
Para a CCRC, o formato abre espaço para operar áreas maduras com risco político elevado, mas com possível retorno caso a produção alcance a meta prevista. Para a Venezuela, o arranjo oferece recursos para reparo de infraestrutura, desgargalamento logístico e serviços de campo, itens essenciais para elevar o volume ofertado.
60 mil barris por dia até 2026, onde estão os poços e o que será exportado
A meta de 60 mil bpd depende de uma sequência de workovers, novas perfurações e recuperação de sistemas de coleta e escoamento em Lago Cinco e Lagunillas Lago, duas áreas tradicionais do Oeste venezuelano. A CCRC pretende combinar óleo leve e pesado, o que exige soluções de mistura e transporte adequadas para manter a qualidade dos carregamentos e atender exigências de refino.
De acordo com fontes do projeto, o plano prevê até 500 poços na rampa. A produção leve ficaria mais vinculada ao abastecimento local e ao refino da PDVSA, apoiando combustíveis no mercado interno. Já o óleo pesado teria destino certo na Ásia, principalmente China, reforçando o fluxo que cresceu nos últimos anos.
Mesmo com a expectativa positiva, a execução envolve desafios. O Lago de Maracaibo requer manutenção intensiva de dutos, estações e unidades de processamento. Existem também questões ambientais e de segurança operacional que exigem investimentos contínuos. A sincronização entre serviços, peças, energia e logística marítima será determinante para cumprir o prazo de 2026.
Licenças mais duras nos EUA e avanço chinês sobre o petróleo venezuelano
O avanço da CCRC ocorre enquanto empresas tradicionais enfrentam restrições de licenças nos Estados Unidos. Em maio de 2025, a Chevron encerrou contratos operacionais na Venezuela após o fim de uma autorização crítica, mantendo equipe mínima e ativos, mas sem poder produzir ou exportar sob as regras vigentes. No fim de julho de 2025, outras parceiras estrangeiras ainda aguardavam autorizações do Tesouro norte-americano para seguir operando.
Esse ambiente empurra mais volumes venezuelanos para a China, ao mesmo tempo em que complica o retorno de grupos europeus e norte-americanos. Na leitura de especialistas, a CCRC explora um espaço deixado por grandes companhias que evitam riscos de sanções secundárias ou quebra de contratos, e o faz com um modelo legal doméstico moldado para esse contexto.
Para Pequim, o acordo ajuda a diversificar o suprimento e manter poder de barganha no mercado global de petróleo. Para Caracas, representa captação de investimento e tecnologia, além de receita adicional para uma PDVSA que tenta reconstruir capacidade. O equilíbrio, entretanto, depende da estabilidade regulatória, da execução técnica e de como evoluirão as relações Washington–Caracas.
O que esperar para o preço, a oferta e a PDVSA nos próximos meses
Se o cronograma for mantido, a Venezuela somará mais 60 mil bpd à sua oferta até o fim de 2026, volume que, embora modesto em termos globais, é relevante para a PDVSA e para a região do Lago de Maracaibo. A priorização de óleo pesado para a China reforça correntes de comércio já estabelecidas, enquanto o óleo leve pode aliviar gargalos no refino interno.
No curto prazo, o impacto em preços internacionais tende a ser limitado, mas a sinalização de novos CPPs pode atrair outros atores com apetite a risco, especialmente em campos maduros. A transparência contratual e a segurança jurídica permanecem como fatores críticos. Disputas paralelas envolvendo ativos e dívidas do ecossistema PDVSA seguem no radar de investidores e podem influenciar a velocidade de novos aportes.